Rede Unida, Encontro Regional Norte 2015

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A SITUAÇAO DE SAÚDE DA POPULAÇÃO RURAL BRASILEIRA ANALISADA ATRAVÉS DE INDICADORES DE SAÚDE: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.
Matheus Schmechel de Almeida, Anibal Lopes Guedes, Lucimar Fossatti de Carvalho

Última alteração: 2016-05-30

Resumo


INTRODUÇÃO

A população rural brasileira reduziu o seu tamanho em mais de 50% de 1980 à 2010 (IBGE, 2010). No entanto, os habitantes das zonas rurais ainda somam mais de 30 milhões de brasileiros (15% da população total) e isso demonstra a necessidade do desenvolvimento de políticas e ações de Estado direcionadas, que promovam e recuperem a saúde dessa população, atendendo às suas demandas específicas.

Segundo Ando et al (2011), do grupo de trabalho de Medicina Rural vincula­do à Diretoria de Medicina Rural da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC), em relação à saúde, o conceito de rural deve ser amplo o suficiente para envolver as diferentes realidades dos profis­sionais e da população brasileira. Deve estar suficientemente livre de limites rígidos de dados populacionais, geográficos, num sentido restrito (físico) e político. Deve ainda estar re­lacionado a características do sistema de saúde, da prática dos profissionais de saúde e das características biológicas das comunidades específicas. Para a SBMFC a saúde rural deve incluir as populações de áreas tradi­cionalmente vistas como rurais, mas também comu­nidades ribeirinhas; áreas indígenas; populações quilom­bolas, de pescadores, mineradores, de alguns trabalhadores temporários; migrantes; áreas remotas e locais de difícil acesso, mesmo dentro de grandes cidades, como favelas, áre­as rurais incrustadas, municípios muito pequenos etc.

Costa et al (2013) em estudo que avaliou a percepção sobre a saúde ideal e real em jovens de comunidade rural de Carapió no Ceará concluiram que para os adolescentes das comunidades rurais a saúde está relacionada à condição social da sua família, à disponibilidade de lazer, comida e atendimento médico e odontológico e que a falta de perspectiva de futuro próspero na comunidade se torna uma preocupação constante.

Dimpério et al (2009) entenderam que a saúde rural não pode ser pensada e/ou executada como uma mera reprodução do modelo urbano. Diferentemente, precisa ser pensada enquanto estratégia de desenvolvimento rural, como um meio de assegurar a cidadania do homem do campo. A necessidade se evidencia quando nos deparamos com a variedade de problemas para gestores e equipes que buscam orientar e implementar as ações e com as percepções e as demandas dos usuários do sistema público de saúde no meio rural.

Quanto a obesidade, Ferreira et al (2013) estudaram a composição corporal de mais de 1700 mulheres alagoanas, comparando mulheres quilombolas e não quilombolas. Os autores destacaram a menor taxa de escolaridade do primeiro grupo correlacionada às maiores razões de prevalência para Hipertensão Arterial Sistêmica (RP: 1,81; IC:95%), para circunferência da cintura ≥80cm (RP: 1,23; IC:95%), para razão entre cintura e estatura RCE >0,5 (RP=1,11; IC95%) e para razão entre cintura e quadril ≥0,85 (RP=1,64; IC95%). A partir disso, concluiram que as mulheres quilombolas apresentam menor nível socioeconômico e estão sujeitas à um maior risco de obesidade abdominal e hipertensão arterial, fatores diretamente ligados à morbimortalidade por doenças cardiovasculares.

Soares & Barreto (2014) estudaram a prevalência de sobrepeso e obesidade corporal e de razão cin­tura-estatura aumentada nas comunidades quilombolas de Vitória da Conquista na Bahia e constataram que ambos foram maiores entre as mulheres em todas as faixas de idade quando comparadas com os homens. As maiores taxas de sobrepeso foram registradas entre as mulhe­res na faixa de 40-49 anos e entre os homens na faixa de 30-39 anos. Na análise uni­variável dos fatores associados ao sobrepeso, a chance de este ocorrer foi maior que o dobro para as mulheres em comparação aos homens. Os autores discutem os hábitos de trabalho árduo dos homens e a acomodação doméstica das mulheres como fatores determinantes para os resultados encontrados.

 

Travassos & Viacava (2007) em estudo que avaliou o acesso aos serviços de saúde de idosos em áreas rurais no Brasil encontraram uma proporção significativamente menor de consultas médicas, consultas odontológicas e cobertura de mamografia comparados à idosos residentes em perímetros urbanos. A dificuldade de acesso a especialistas e serviços de nível intermediário de saúde pelo SUS e as dificuldades financeiras para acesso aos serviços particulares resultaram em agravamentos desnecessários do estado de saúde dessa população e maior demanda hospitalar.

Gomes et al (2013) detectaram subutilização dos serviços de saúde para a população de idosos quilombolas de Vitória da Conquista-BA. Correlacionaram os resultados encontrados com o baixo nível socioeconômico e a não especialização do serviço prestado à população rural, salientou a necessidade de atendimento dirigido e adaptado à uma população mais carente, menos informada e menos assistida.

Bezerra et al (2013) em estudo transversal em comunidade quilombola de Vitória da Conquista-BA avaliaram a incidência de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e encontraram valores de 45,4% com índices associados às variáveis em estudo: idade, grau de escolaridade e classe social. O subgrupo dos ex-fumantes apresentou maior incidência de HAS (56,7%) do que o grupo que nunca fumou (39,2%) e em relação à circunferência da cintura, quando aumentada, houve um acréscimo de 70% da incidência da HAS.

Matozinhos et al (2011) estudaram a incidência de HAS em duas comunidades rurais do Vale do Jequitinhonha-MG e, através de analise multivariada, constataram como fatores associados diretos à hipertensão: altos níveis de insulina de jejum e de colesterol, razão cintura quadril elevada, aumento da idade e o sexo masculino. Pimenta et al (2008), em pesquisa realizada em uma das comunidades do estudo anterior relataram a incidência de HAS em 47,0% [IC (95%) = 41,1 – 53,0], associados também com o aumento da idade.

Silva et al (2010) em estudo que avaliou o uso dos serviços públicos por quilombolas no que diz respeito a DST/AIDS, constataram que uma série de mitos sobre a doença ainda é predominante no imaginário dessas populações. Os autores relataram crenças como a da transmissão por picada de insetos ou por banhar-se em rios ou lagos juntamente com pessoas portadoras do vírus e reafirmou a situação de vulnerabilidade da população negra na questão do acesso e da utilização dos serviços de saúde.

Reis et al (2008) pesquisaram o vírus da Hepatite C em 1007 pessoas de comunidades quilombolas do interior do Mato Grosso, encontraram baixa prevalência da infecção (0,2 %), o que se correlaciona com a baixa exposição aos fatores de risco.

 

Oliveira (2014) em análise da saúde materno-infantil em comunidades quilombolas no norte de Minas Gerais, avaliaram critérios de saúde em 645 mulheres e crianças em todas as comunidades quilombolas dessa região e encontraram os seguintes dados: 52,1% relatou a primeira gestação na adolescência, 35% relataram quatro ou mais gestações, distribuição irregular na realização de exames preventivos para o câncer de colo e 15,1% das mulheres nunca haviam feito o exame. Em relação ao ciclo gravídico-puerperal, 23,5% das mulheres referiram menos de seis consultas de pré-natal, 37,2% relata­ram início do pré-natal após o primeiro trimestre de gestação e 44,4% não fizeram consulta puerperal. Em relação às crianças, 15% nasceram com baixo peso, 9,4% tinham problemas crônicos de saúde

Guerrero et al (2007) avaliaram a mortalidade de menores de um ano de idade, em 6 comunidades quilombolas da cidade de Santarém-PA, e encontraram 30,4 óbitos/por mil nascidos vivos para os quilombos em terra firme e de 50, óbitos/por mil nascidos para os quilombos das áreas de várzea. Quando comparadas com as taxas do país (27,0 óbitos/por mil nascidos vivos), da região Norte (26,2 óbitos/por mil nascidos vivos), e da população negra rural do estado do Pará (32,9 óbitos/ por mil nascidos vivos), evidenciam a precariedade da saúde dessa população, a falta de políticas de saúde e práticas que diminuam a mortalidade infantil.

 

CONCLUSÃO

 

A análise realizada nos estudos sobre a população rural brasileira, sobretudo quilombola, evidenciou a fragilidade da situação de saúde desse povo e alerta para os dados encontrados, na sua grande maioria piores quando comparados à população brasileira em geral. Ficou evidente que a baixa escolaridade e o menor nível socioeconômico são fatores agravantes para todos os indicadores estudados e constituem um desafio na atenção à saúde.

A população rural possui hábitos singulares, crenças e saberes próprios que devem ser sempre considerados no planejamento das ações. A obesidade se mostrou fortemente associada à distribuição clássica dos afazeres, sendo os homens encarregados pelo trabalho braçal e as mulheres encarregadas em cuidar da casa ficando assim mais susceptíveis à essa doença.

O planejamento das políticas voltadas à essa população deve levar em conta a necessidade de estruturação do meio rural brasileiro, visto que a migração para as cidades constitui um desfecho quase inevitável para os idosos e tentador para os jovens. A fixação dos jovens no campo se torna cada vez mais importante, uma vez que a população rural está envelhecendo e uma crise de mão de obra pode tornar-se realidade. Da mesma forma, somente com a oferta de serviços de saúde especializados os idosos poderão viver com mais conforto e segurança.

É imperioso que o acesso aos serviços seja melhorado, uma vez que os estudos mostraram a maior dificuldade enfrentada pela população rural para obtenção da atenção em saúde, refletida nos indicadores. A aproximação dos profissionais à população se faz necessária para a melhora de todos os indicadores estudados.

 


Palavras-chave


mortalidade; obesidade; quilombolas; desinformação; escolaridade

Referências


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