Última alteração: 2014-11-08
Resumo
O presente trabalho propõe uma reflexão acerca do papel da Psicologia na formação em Saúde para o SUS. Resultando da experiência de uma equipe de Psicologia convidada para abordar o tema “Entrevista Familiar e Comunicação de Más Notícias” no “Curso de Capacitação de Profissionais de Saúde em Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante”, realizado pela Central de Captação de Órgãos da Secretaria de Saúde do DF em maio de 2014, cujo público-alvo foram profissionais de Saúde desta. “Más notícias” são informes de conteúdo desagradável que, no âmbito da Saúde, frequentemente se referem a intercorrências inesperadas no trajeto terapêutico, ou mesmo crises imprevisíveis. Mobilizam a frustração pessoal do indivíduo ao mesmo tempo em que demandam respostas rápidas que tangenciam condições delicadas de vida e produzem diferenças significativas para clientes e profissionais. Para o profissional exige-se conhecimento técnico suficiente para esclarecimento de todos os tópicos necessários ao usuário para a tomada de decisão, assim como experiência e versatilidade para análise e manejo do contexto em busca do desfecho o mais adequado possível. Mas há também o aspecto subjetivo do indivíduo que desempenha o cuidado, que precisa oferecer apoio ao cliente e merece espaço e atenção acerca de sua experiência pessoal com tal adversidade.A atividade teve o Psicodrama como base teórico-prática: nesta abordagem psicológica o homem é um ser de ação e detentor de potencial criativo próprio, que se constitui e é constituído em relações grupais/sociais; desse modo o foco e objetivo das intervenções, pautadas em técnicas teatrais, é [re]experienciar e [re]criar tais relações, facilitando a busca de alternativas para a resolução do que é revelado e expandindo os recursos subjetivos disponíveis. Sugeriu-se ao grupo (enfermeiros, médicos e graduandos) a construção de uma cena sociodramática, com a informação de que aquele seria o momento de diálogo entre um membro da equipe de captação e um familiar do possível doador. Realizou-se a criação conjunta das personagens e conseguinte dramatização da situação descrita. Assim, os participantes puderam vivenciar tanto o papel que lhes é familiar, o de profissional, quanto o do usuário do serviço em momento de crise. Emergiram, então, falas sobre as dificuldades cotidianas que tornam ainda mais crítico o momento do diálogo em questão, sobre os entraves do sistema institucional acerca da relação entre profissional e familiar -e sua influência no sucesso da captação- e também expressões de reconhecimento dos sentimentos dos familiares, que ainda vivem o luto, e os deles próprios enquanto pessoas.
A observação do grupo é de que a formação oferecida no Ensino Superior regular não prepara técnica ou imanentemente o cuidador para estes momentos de crise subjetiva.
Entende-se necessário proporcionar ao profissional a Educação Permanente para instrumentalização técnica e desenvolvimento subjetivo, de forma humanizada e alinhada às perspectivas atuais de Saúde integral e equânime. A Psicologia traz a proposta de observar e refletir investindo no desenvolvimento humano necessário às demandas da saúde biopsicossocial; traz estratégias pedagógicas coerentes com a aposta político-pedagógica que valoriza os sujeitos, os saberes, as relações, e a integralidade do cuidado.Palavras-chave
Referências
Brasil. (2005). Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Política de Educação e Desenvolvimento para o SUS. Caminhos para a educação permanente em saúde. Brasília: Ministério da Saúde.
Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. – 2. ed. 5. reimp. – Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 44 p. : il. color. – (Série B. Textos Básicos de Saúde).
Campos, G. W. S. (2010). Cogestão e neoartesanato: elementos conceituais para repensar o trabalho em saúde combinando responsabilidade e autonomia. Ciência & Saúde Coletiva, 15 (5), p. 2337-2344.
Ceccim, R. B. & Feuerwerker, L. C. M. (2004a). O Quadrilátero da Formação para a Área da Saúde: Ensino, Gestão, Atenção e Controle Social. Physis: Revista de Saúde Coletiva, 14 (1), p. 41- 65.
Ceccim, R. B. & Feuerwerker, L. C. M. (2004b). Mudança na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade. Cadernos de Saúde Pública, 20 (5), p. 1400-1410.
Cyrino, E. G & Toralles-Pereira, M. L. (2004). Trabalhando com estratégias de ensino-aprendizado por descoberta na área da saúde: a problematização e a aprendizagem baseada em problemas. Cadernos de Saúde Pública, 20(3), p. 780-788.
Ceccim, R. B. ( 2008). A emergência da educação e ensino da saúde: interseções e intersetorialidades. Revista Ciência & Saúde, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 9-23.
Freire, P. (2011). Pedagogia da autonomia: Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Mitre, S. M., Siqueira-Batista, R., Girardi-de-Mendonça, J. M., Morais-Pinto, N. M., Meirelles, C. A., Pinto-Porto, C., Moreira, T., Hoffman, L. M. A. (2008). Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação profissional em saúde: debates atuais-temas livres. Ciência & Saúde Coletiva, 13 (2), p. 2133-2144.
Moreno, J.L (1988). Psicodrama. Cultrix: São Paulo.