Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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A POLÍTICA NACIONAL DE HUMANIZAÇÃO E A NECESSIDADE DE “HUMANIZAR” NA SAÚDE
Yashmin Michelle Ribeiro de Araujo, Jhennifer de Sousa Góis, Natália Moreira Machado

Última alteração: 2015-11-23

Resumo


APRESENTAÇÃO: Uma das discussões mais profícuas em voga na contemporaneidade diz respeito à efetividade dos direitos garantidos legalmente ou constitucionalmente. Um destes direitos, amplamente divulgado pelos recursos midiáticos e fortemente exigido nas manifestações populares que se contrapõem ao mau uso dos recursos públicos, corresponde à saúde pública. Se bem sabemos que esta é fruto da organização e mobilização social no Brasil, também sabemos que mesmo que a passos vagarosos – o que constitui um permanente desafio, ela vem se modificando, mediante novas estratégias de organização, que visam pensá-la de modo amplo, torná-la realmente digna e de qualidade, assim como valorizadora dos sujeitos envolvidos no processo saúde-doença. A Política Nacional de Humanização (PNH) surge neste contexto como uma nova forma de pensar a saúde em todos os seus âmbitos. Sua gênese se relaciona ao Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar, lançado pelo Ministério da Saúde, em 2001. O referido Programa propunha ações de alteração nas formas de assistência oferecidas aos usuários nos hospitais públicos. Já em 2003, a nova gestão do MS estende a necessidade da humanização para toda a rede de serviços de saúde do SUS: atenção básica, atenção especializada e atenção hospitalar e a PNH (HumanizaSUS) é lançada, estabelecendo como política, a preocupação em efetivar o direito constitucional de saúde para todos. A PNH se pauta na compreensão de humanização como política baseada em “princípios e modos de operar no conjunto das relações entre profissionais e usuários, entre os diferentes profissionais, entre as diversas unidades e serviços de saúde e entre as instâncias que constituem o SUS” (BRASIL, 2004, p. 7). A proposta é desafiadora e não apenas por isso, mas também porque propõe interferir no modus operandi de se fazer saúde para “viabilizar uma saúde digna para todos, com profissionais comprometidos com a ética da saúde e com a defesa da vida” (ibidem, p. 5). METODOLOGIA: Este trabalho apresenta como escopo problematizar a atualidade da PNH, tendo em vista sua proposta de interferência na rede SUS para construir uma forma “mais humana” do fazer na assistência à saúde, bem como elucidar sua proposta de amplitude das ações e atitudes qualificadas na relação entre todos os envolvidos no processo da produção da saúde e de sujeitos. Para tanto, este trabalho corresponde a uma pesquisa bibliográfica e documental sobre a proposta da PNH e as compreensões sobre humanização, fundamentando-se em Casate e Corrêa (2005), Garcia et. al. (2009), Navarro e Pena (2013), entre outros autores e no documento da PNH. Do mesmo modo, também apresentamos algumas considerações sobre a observação participante realizada no Grupo de Trabalho em Humanização (GTH) do Instituto de Prevenção do Câncer, localizado em Fortaleza/CE, ao longo do ano de 2014. Quando pensamos em humanização devemos levar em consideração o que o termo mencionado quer dizer. Garcia et. al. (2009, p. 84) apropriando-se de Deslandes (2004) afirma que esta autora entende que não há um conceito claro e estanque para o que seja a humanização da assistência à saúde, mas sim caracterizações desta como uma diretriz de trabalho. Isto gera, em contrapartida, questionamentos quanto uma definição de humanização, sugerindo a condição de “humanizar o humano”. A ideia de humanizar o humano traz em si a noção de que existem comportamentos ou condutas materializadas quando se é humano, diferenciadas de outros comportamentos ou condutas que não são da natureza humana. Complementarmente, Arruda (2003) apud Garcia et. al. (2009, p. 72-73) demonstra que na construção do homo aparecem elementos que constituem a natureza humana, como o egoísmo, a competição e a agressividade. A autora entende que o homo é naturalmente bom, no entanto, que a condição de desumano foi construída historicamente e, portanto, pode ser desconstruída. Do mesmo modo, o cuidado seria uma conduta própria da natureza humana (GARCIA et. al., 2009, p. 82), que poderia, portanto, ser resgatada e efetivada em diferentes espaços. Humanizar para a PNH se refere à oferta de atendimento qualificado e que alia a tecnologia ao acolhimento, com espaços de cuidado e condições de trabalho favoráveis. Há, portanto, a necessidade de se humanizar a relação com o doente, do ponto de vista do profissional, o que exige a criação de afetividade e de sensibilidade para materializar o ato de cuidar, numa espécie de relação de encontro de sujeitos humanos que compartilham saberes, poderes e experiências pessoais de vida (CASATE; CORRÊA, 2005, p. 110). Entendendo o ato de humanizar também dessa forma, a PNH propõe ser implementada em toda a rede SUS de forma transversal. RESULTADOS: Dentro de uma política transversal, por conseguinte, a humanização deve ser compreendida “como um conjunto de princípios e diretrizes que se traduzem em ações nos diversos serviços, nas práticas de saúde e nas instâncias do sistema, caracterizando uma construção coletiva”. (BRASIL, 2004, p. 7). E já que se fundamenta como uma construção coletiva precisa ser a resposta concreta do envolvimento de todos os sujeitos (pacientes, familiares, profissionais, etc.), garantindo-se a troca de saberes, o diálogo entre os profissionais das equipes (com o incentivo à grupalidade), a interação. É somente dessa forma que o usuário dos serviços do SUS se constitui como um sujeito de direitos executor da sua autonomia e partícipe das decisões sobre sua saúde. No IPC, uma unidade da Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, que cumpre a missão de contribuir para a melhora da qualidade de vida da mulher e do homem, no que se refere à diminuição da morbimortalidade por doenças relacionadas ao câncer, prestando atendimento ambulatorial e realizando cirurgias de pequeno e médio porte, além de oferecer serviços de prevenção, diagnóstico e tratamento de lesões pré-neoplásicas e neoplásicas ginecológicas, mamárias, de pele e pênis, o GTH apresenta funções diversas. O referido Grupo é composto por profissionais e gestores da instituição supramencionada e se reúne mensalmente para discutir questões referentes, entre outras coisas, a melhora da qualidade dos serviços prestados aos usuários do IPC e os modos de como operacionalizar uma prática mais humana e acolhedora. CONSIDERAÇÕES FINAIS: As dificuldades para consolidar os objetivos mencionados são muitos, tais como a dificuldade de compreensão dos funcionários do que seja a humanização, o não engajamento nas propostas encabeçadas pelo grupo, assim como a descrença na modificação de ações e comportamentos já cristalizados nas condutas dos sujeitos envolvidos no processo saúde-doença. Entretanto, as possibilidades de sensibilização mobilizam o grupo para a elaboração de novas estratégias e articulações. Observamos que as discussões teóricas permitem situar a PNH como uma política basilar dentro da rede de serviços do SUS, uma vez que vem a lume com a proposta de consolidar a “humanização” na saúde, tendo em vista a urgência de prestação de serviços que satisfaçam os usuários, mas também os profissionais e outros envolvidos no processo, como familiares e gestores. A observação participante no GTH do IPC nos fez ver, da mesma forma, que para que a PNH se consolide – gradualmente - dentro da rede SUS, há que se compreender a importância dos sujeitos, uma vez que são seres “humanos” os quais devem tratar e cuidar “humanamente” de outros seres humanos, assim como há que se resgatar o “encantamento pelo SUS”, acreditando-se no potencial dos sujeitos e nas possibilidades de elaboração de estratégias de articulação para a materialização das diretrizes da PNH.  

Palavras-chave


Política Nacional de Humanização; humanização na saúde; transversalidade.

Referências


BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: Política Nacional de Humanização: a humanização como eixo norteador das práticas de atenção e gestão em todas as instâncias do SUS. Brasília: Ministério da Saúde, 2003. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2014.

BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: Política Nacional de Humanização: a humanização como eixo norteador das práticas de atenção e gestão em todas as instâncias do SUS. Brasília: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizasus_2004.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2014.

CASATE, Juliana Cristina; CORRÊA, Adriana Katia. Humanização do atendimento em saúde: conhecimento veiculado na literatura brasileira de enfermagem. Rev. Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, v.13, n.1, p. 105-111, jan./feb. 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-11692005000100017>. Acesso em: 12 ago. 2014.

GARCIA, Adir Valdemar et. al. Humanizar o humano: bases para a compreensão da proposição de humanização na assistência à saúde. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., Florianópolis, v. 2, n.1, p. 70-90, jan/jul. 2009. Disponível em: <http://esp.saude.sc.gov.br/sistemas/revista/index.php/inicio/article/viewFile/40/83>. Acesso em: 8 ago. 2014.

NAVARRO, Luisa Milano; PENA, Ricardo Sparapan. A Política Nacional de Humanização como estratégia de produção coletiva das práticas em saúde. Revista de Psicologia da UNESP, São Paulo, v.12, n. 1, p. 64-73. 2013. Disponível em: <http://www2.assis.unesp.br/revpsico/index.php/revista/article/viewFile/254/312>. Acesso em: 14 jul. 2015.