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A atuação do residente e o desafio da interdisciplinariedade - relato de experiência dos residentes do Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Federal de Santa Catarina em um Centro de Saúde de Florianópolis - SC
Última alteração: 2015-10-23
Resumo
APRESENTAÇÃO: As Residências Multiprofissionais em Saúde da Família constituem-se em uma modalidade de pós-graduação lato sensu destinadas às profissões que se relacionam com a saúde, sob a forma de curso de especialização caracterizado por ensino em serviço. São orientadas pelos princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo uma parceria entre Ministério da Saúde e da Educação, objetivando a inserção qualificada de profissionais no SUS, a partir das necessidades e realidades locais e regionais. A Residência Multiprofissional em Saúde da Família (REMULTISF) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) prevê que os residentes tenham contemplados em seu processo de trabalho espaços específicos de cada categoria profissional, visitas domiciliares, participação em grupos, reuniões de equipe, períodos teóricos, reuniões mensais com tutores, preceptores e coordenação da residência. Também são garantidos semanalmente ambientes de aprendizado e troca entre os residentes, que estimulam a criatividade e autonomia no seu processo de trabalho, e que possibilitam discussões teóricas e acerca do que é enfrentado no cotidiano do Centro de Saúde (CS). Pretendemos neste resumo problematizar os desafios e potencialidades da atuação interdisciplinar encontrados no cotidiano das residentes do Programa REMULTISF da UFSC em parceria com a Prefeitura Municipal de Florianópolis-SC (PMF) em um CS. METODOLOGIA: A Atenção Primária em Saúde (APS) do Município de Florianópolis conta com 49 CS com equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF) organizados em cinco Distritos Sanitários (DS): Centro, Continente, Leste, Norte e Sul. Este relato de experiência compreende a realidade de um CS localizado no DS Sul, campo de atuação de diversos programas que visam a integração ensino-serviço, dentre eles a REMULTISF. Atualmente o referido CS configura-se em duas equipes básicas de saúde, uma de saúde bucal modalidade I e conta com o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) tipo II. A equipe de residentes é composta por profissionais de Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Odontologia e Serviço Social. Na maior parte do tempo, a equipe de residentes fica alocada no mesmo CS, porém, as profissões que compõe o NASF também tem atuação em outros CS's. Além das atividades específicas de cada categoria e do processo de trabalho cotidiano desenvolvido no CS, na semana típica das residentes, são destinados dois períodos para atividades multiprofissionais: projeto integrado e atividade compartilhada. O projeto integrado é um momento em que os residentes se reúnem para planejar, organizar e executar ações que sejam demandas do serviço e do território (oficinas, ações do Programa Saúde na Escola - PSE, grupos, entre outros). Essa atividade é realizada em um turno semanalmente. Já a atividade compartilhada é um encontro para discussão e aprofundamento teórico de temas relacionados ao processo de trabalho específico do CS. Para essa atividade são acordados responsáveis que mediarão as discussões. A atividade ocorre em um turno por semana entre os residentes, sendo uma vez por mês com a presença dos preceptores. Estes espaços de articulação são complementares e embasam a construção interdisciplinar através da busca dialética entre ação e reflexão. A partir desses momentos são planejadas, elaboradas, executadas - nesses ou em outros espaços - e avaliadas ações junto ao restante da equipe e em articulação intersetorial. Como exemplo, a articulação intersetorial que perpassa o PSE em duas instituições de ensino localizadas na área de abrangência do CS, onde foram realizadas oficinas lúdicas trabalhando o conceito ampliado de saúde, uso abusivo de tecnologias e apresentação do cordel da saúde em atividade festiva na escola. Além disso, são realizadas avaliações dos componentes do Programa. Também identificamos que a partir desses espaços multiprofissionais são planejadas as ações voltadas à melhoria da ambiência, que reflete positivamente no CS como um todo, tanto no cotidiano de trabalho bem como no acolhimento da população usuária. Foram realizadas ações nas salas de espera com oficinas de artesanato, reflexologia podal e apresentação da equipe de trabalho atuante no dia. Ainda nesses espaços, elaboramos material informativo sobre o CS, apresentando a composição das equipes, os grupos disponíveis e horários, como também a divulgação de espaços de controle social como o Conselho Local de Saúde. Com a finalidade de ser distribuído nos momentos em que estivermos em eventos na comunidade e no CS. O Conselho Local de Saúde (CLS) em nosso território encontra dificuldades na sua consolidação, devido a baixa adesão da comunidade nesse espaço de articulação. A necessidade do fortalecimento do CSL é uma pauta constante tanto nas reuniões de equipe quanto nos momentos de articulação entre os residentes, havendo também participação desses profissionais nas reuniões do CSL. Outro ponto sempre relevante nesses espaços é a discussão do processo de trabalho do residente, pois há questões envolvidas no serviço que por vezes destoam da própria proposta do Programa. Entendemos ser primordial problematizar alguns assuntos e questionar a realidade que se encontra, para que possamos nos posicionar eticamente diante de situações adversas respaldadas sempre pelo Programa. RESULTADOS: A interdisciplinaridade se apresenta como um desafio a ser compreendido no cotidiano de trabalho das equipes, pois sabe-se que o processo de aprendizado durante a graduação da maioria dos profissionais de saúde foi, e ainda é, voltado ao modelo biomédico, que atua de forma fragmentada e que prioriza o conhecimento técnico. Por essa falha na formação que percebemos e damos muito valor aos espaços e momentos multiprofissionais que temos dentro da residência, como já explicados no decorrer do relato, a oportunidade de vivenciar esse processo diferenciado de aprendizado e experiência, vimos que em algumas residências não existem esses momentos. Percebeu-se que a sensibilização da equipe frente a esses espaços de construção multiprofissional e interdisciplinar é essencial para que esse ambiente seja valorizado, pois muitos profissionais estão centrados nas consultas médicas, voltada as enfermidades pontuais e não ao atendimento do usuário de forma integral. Desejamos que os profissionais reconheçam a importância desses períodos, que lutem por espaços semelhantes em suas agendas e que estejam cientes que utilizamos para o planejamento de ações, bem como reflexões acerca do processo de trabalho diante da conjuntura do SUS. Algumas limitações também influenciam na construção de espaços interdisciplinares como por exemplo a falta de recursos humanos, que acaba impossibilitando a participação de alguns profissionais nesses momentos, e também, como citado anteriormente, a falta de percepção dos profissionais da importância desses encontros. CONSIDERAÇÕES FINAIS: A residência constitui-se como uma modalidade diferenciada, visto que promove a integração do conhecimento teórico e prático. Além disso, desafia o residente a desenvolver sua capacidade crítica frente aos desafios do SUS, frente ao modelo biomédico - muito discutido, todavia ainda não superado - é a fragmentação do conhecimento acadêmico. Por essa razão, valorizamos a formação de profissionais para o SUS na modalidade de residência, visto que consegue unir a reflexão teórica com o conhecimento advindo da prática, buscando produzir um novo modelo de cuidado em saúde através de profissionais comprometidos com a atuação interdisciplinar.
Palavras-chave
Residência Multiprofissional; Interdisciplinariedade; Processo de trabalho