Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Abandono do tratamento por usuários do CAPS II em um município do Norte de Minas Gerais
Aline Gonçalves Ferreirra, Jennyfe Sabrine Batista de Freitas, Roberto Carlos Pires Júnior, Ângela Ernestina Cardoso de Brito

Última alteração: 2015-11-23

Resumo


APRESENTAÇÃO: O presente trabalho se constitui numa pesquisa realizada no Centro de Atenção Psicossocial CAPS II, por profissionais inseridos na Residência Multiprofissional em Saúde Mental em um município do norte de Minas Gerais. Desenvolveu-se a partir da constatação da seguinte questão problema: O número considerável de pessoas que abandonam o tratamento no CAPS II. Assim o objetivo desta investigação é identificar os motivos que levam à evasão destes usuários. O CAPS é um serviço voltado à pessoas que apresentam sofrimentos mentais severos e/ou persistentes. Objetiva ser referência nesse tipo de tratamento, direcionar e atuar ativamente nas políticas e programas de saúde mental da região, regulamentar e auxiliar os outros níveis de atenção à saúde e organizar-se intersetorialmente com foco na promoção da vida comunitária, reinserção social e autonomia dos portadores de sofrimento mental (BRASIL, 2004).  DESENVOLVIMENTO:  A pesquisa se deu inicialmente a partir do estudo da bibliografia pertinente ao tema, posteriormente da análise de documentos da instituição. Baseou-se principalmente na observação participante, uma vez que a instituição é campo de atuação dos residentes que desenvolveram a pesquisa. Dessa forma a pesquisa tem cunho quantitativo e qualitativo. Considerou-se apenas usuários inscritos no CAPS II entre março de 2014 e março de 2015, partindo-se da seleção e análise dos prontuários dos usuários que abandonaram o serviço, da análise das atas de reuniões de funcionários e famílias, bem como outros registros da instituição. Foram colhidos dos prontuários os seguintes dados: idade, sexo, território coberto pela Atenção Básica, diagnóstico clínico, projeto de permanência-dia, frequência de atendimentos dos técnicos de nível superior, contatos realizados com a família e com a rede, encaminhamentos realizados e o provável motivo de abandono do serviço. RESULTADOS: Verificou-se que de 150 pacientes admitidos entre março de 2014 a março de 2015, 20 abandonaram o tratamento. A maioria são homens (55%). A faixa-etária está entre 19 e 50 anos. A orientação diagnóstica está pautada na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde – CID-10. Assim as maiores classificações encontradas são: “Esquizofrenia” (20%) e “Transtorno afetivo bipolar” (15%). Outros diagnósticos identificados com menor representação (5% cada) são: transtornos mentais ou de personalidade devido doença, lesão ou disfunção cerebral; episódios depressivos; transtornos ansiosos; e retardo mental. Porém, a maioria dos prontuários analisados não apresenta clareza diagnóstica (35%). O projeto de permanência da maioria dos pacientes é intensivo (40%); 30% possuem projeto não-intensivo, 25% semi-intensivo e, em 5%, não há registros. Constatou-se certa regularidade de atendimentos dos técnicos de nível superior. No entanto, em alguns prontuários havia poucos registros de atendimento. Notou-se a deficiência de registro de contatos com a família e a Rede, onde 55% dos prontuários não possuem registro de encaminhamento. Apenas 30% confirmam encaminhamento à Atenção Básica e 15% para os serviços ambulatoriais. Identificou-se que a causa provável de abandono do tratamento pelos pacientes foi, em sua maioria, a não adesão ao tratamento (35%) e usuários que deixaram o serviço por encontrarem-se estáveis (15%). Porém, chama a atenção que em 50% dos prontuários não há registro documentado do abandono do paciente, motivos ou medidas tomadas pela equipe frente a sua evasão. E sendo assim, pode-se constatar que existem outras causas de abandono do tratamento que precisam ser investigadas.Análise dos principais fatores de abandono do tratamento no CAPS II. Verificou-se, nessa análise, a utilização somente do modelo de encaminhamento e de referência e contra-referência em todos os níveis de Atenção à Saúde. Não foram encontrados registros acerca de práticas do matriciamento. Dessa forma ressalta-se que a dificuldade de integração entre o CAPS, a Atenção Básica e Hospitalar, bem como com a rede de Assistência Social, prejudica o tratamento contínuo e integral do indivíduo. Pontua-se assim a ausência de ações que incluam práticas intersetoriais, como educação, trabalho, esporte, cultura e lazer. Indica-se então que as práticas tendem a estar bem mais direcionadas à área médica. Neste sentido há a dificuldade de criação de alternativas, que vislumbrem a reinserção social do portador de sofrimento mental. Ressalta-se, também, a pouca variedade de oficinas terapêuticas, pela ausência de recursos materiais e formação da equipe técnica, o que provoca queixas dos usuários na permanência. Nesse ínterim, entende-se que os CAPS devem buscar promover a emancipação desses sujeitos através da oferta de recursos terapêuticos e possibilidades de reinserção social. O que deve ser desenvolvido em parceria com a família a comunidade e os serviços territoriais. Assim, pode-se indicar que ainda há a perpetuação de uma cultura medicalizante, em que a atenção médica, o uso dos medicamentos e a internação hospitalar são centrais em muitos projetos terapêuticos. Observou-se, na análise dos prontuários, pouca precisão dos critérios do projeto de permanência-dia, em desacordo com a proposição da Portaria GM 336/02 (BRASIL, 2004): a) atendimento intensivo para pessoas com grave sofrimento psíquico ou convívio social e familiar; b) atendimento semi-intensivo para pessoas cujo sofrimento está mais ameno, com vias de socialização e autonomização; e c) atendimento não-intensivo às pessoas que não necessitam de suporte contínuo, podendo conviver em seu território. Através da análise de outros registros da instituição e atendimentos realizados com as famílias, as principais dificuldades que eles apresentam estão ligadas a insuficiência de recursos financeiros o que dificulta a locomoção até o serviço, bem como o desenvolvimento de outros cuidados com o seu familiar com sofrimento mental. Percebe-se também que muitas famílias não têm informações suficientes no que se trata do manejo com a pessoa com sofrimento mental. Por outro lado foi verificada a pouca participação das famílias, nas reuniões, outros eventos direcionados a estas no serviço. Nota-se também que muitas famílias procuram o serviço somente quando o seu familiar com sofrimento mental apresenta piora do quadro, o que impede o acompanhamento sistemático desse sujeito. Desataca-se então a dificuldade de articulação entre familiares e funcionários do serviço. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Assim a partir do que foi desenvolvido nesse estudo, foi possível verificar que os motivos que levam o usuário do serviço a desistir do tratamento são variados, estando associados desde a não aceitação do sofrimento mental, à condição socioeconômica, à relação familiar e comunitária, à deficiência na busca ativa por parte serviço e à falta de estrutura do serviço para atendimento de toda a demanda. Por fim, nota-se que a população não conhece a função do serviço, dessa forma é importante, que se criem estratégias de conscientização da população a esse respeito, que especialmente durante a admissão do paciente que a unidade seja apresentada, bem como seu funcionamento e que os profissionais estejam disponíveis para sanar as dúvidas existentes e incentivar a família e usuários a participarem do serviço. Com o intuito de melhorá-lo, tornando-o mais acolhedor, buscando alternativas para minimizar os problemas que aqui foram apresentados, reduzindo, assim, a possibilidade de evasão do serviço.

Palavras-chave


Saúde Mental; Psiquiatria Comunitária; Transtornos Mentais

Referências


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