Tamanho da fonte:
O viver militante na construção da formação em saúde: relato de experiência da participação no II Estágio Nacional de Extensão em Comunidades
Última alteração: 2015-10-30
Resumo
APRESENTAÇÃO: Nos dias atuais, o ato educativo, ou ato de educar, é entendido como processo que se dá na relação dialógica entre os homens e não se restringe ao ambiente da sala de aula, seja na escola ou na universidade, recebendo essa forma a denominação de educação formal ou tradicional, significando hoje apenas uma das vertentes conceituais. Nesse contexto, diversas práticas vivenciais surgem como potentes instrumentos de formação, inclusive formação em saúde, destacamos dentre elas a prática militante, que ao proporcionar ao educando experiências múltiplas e desenvolvimento crítico e ideológico, surge como espaço propício de desenvolvimento profissional e humano. Esta é a esperança que se pode ter na educação, renunciar a ilusão de que todos os seus avanços e melhorias dependem apenas de seu desenvolvimento tecnológico, acreditar que o ato humano de educar existe tanto no trabalho pedagógico que ensina na escola quanto no ato político que luta na rua por um outro tipo de mundo. Foi objetivo do trabalho relatar a experiência militante da participação no II Encontro Nacional de Extensão em Comunidades (ENEC) e suas significações. Trata-se de um relato de experiência, vivenciada pelo autor quando do momento da participação no II Estágio Nacional de Extensão em Comunidades. O II ENEC, promovido pela Universidade Federal da Paraíba no uso de suas atribuições como instituição promotora do Programa Vivências de Extensão em Educação Popular e Saúde no SUS (VEPOP-SUS), ocorreu em João Pessoa, estado da Paraíba, no período de 22 de Julho a 6 de Agosto de 2015. Sua edificação foi elaborada por múltiplas mãos, com representatividade de docentes, discentes e movimentos sociais. Sua metodologia propiciou a cada estudante presente um primeiro momento compartilhado de formação e contato com o arcabouço teórico que embasa a caminhada do estágio, seguida de completa imersão em determinada comunidade (definida por sorteio) e, por último, o reencontro para troca de experiências entre os participantes e avaliação do estágio. No caso da experiência aqui relatada, o estágio ocorreu na comunidade de pescadores da penha, extremo sul de João Pessoa. Desenvolvimento: logo nos primeiros dias, momento em que os diversos estudantes compartilhavam o mesmo lugar enquanto eram apresentados ao arcabouço teórico que embasaria a vivência, pode-se notar o caráter místico do espaço, localizado próximo ao quilombo do guruji (região de João Pessoa) e constituindo o que os organizadores denominaram de universidade popular, local onde múltiplos aprendizados eram ensinados, aprendidos e, sobretudo, produzidos. Neste primeiro momento, a pluralidade cultural ali contida produziu diversas estórias, contos advindos de vários locais do Brasil e do Mundo (contamos com a participação de companheiros da África) e que enriqueceram a vivência com tesouro singular, algo impossível de ser planejado. O encontro com alguns caminhantes da educação popular também agregou um dinamismo especial nesses primeiros passos de nossa caminhada e após esse momento inicial partimos com tudo aquilo que aprendemos nesses dias e, sobretudo, o que trouxemos de nosso lugar, experiências de toda uma vida. Cada dupla partiu para sua comunidade com inúmeras dúvidas e uma certeza, viveríamos algo intenso. Com a chegada a comunidade da penha, uma realidade totalmente desconhecida se pôs diante de nossos olhos (estávamos em dupla). Tínhamos o desafio de buscar se inserir e entender como aquele povo vivia. Logo de início notamos a relevância dos aspectos históricos da comunidade, para entendê-la tínhamos de conhecer suas origens e assim o fizemos, através de conversas com moradores antigos e líderes comunitários. Conhecida a história daquele lugar e povo e a partir de uma maior familiaridade e convivência notamos a complexidade e multiplicidade de fatores que atuavam para a manutenção ou superação de determinadas problemáticas, além de aspectos culturais fortes e valorização da história local por parte da comunidade. A comunidade da penha foi forjada na luta, nasceu a partir da união de seus moradores em defesa do direito à moradia, traço que fortaleceu seus laços e que constitui acumulo valoroso diante dos ataques que vem sofrendo e da necessidade de manter-se coesa frente às investidas dos grandes especuladores imobiliários, já que trata-se de lugar privilegiado. Relevante também pontuar a alteração do perfil daquele lugar, sendo hoje a pesca substituída pelo trabalho com o turismo, fator que explicita a beleza natural do lugar e um potencial esgotamento de alguns recursos naturais. Ao longo da dúzia de dias que estivemos naquele lugar, absorvemos de algum modo, talvez parcialmente, as significações que seus moradores davam a alguns fatores de seu cotidiano, o que nos envolve em uma realidade diversa, para além da experimentada ao longo de nossas vidas. Tal fator constitui potencialidade incalculável, o que vivemos naqueles dias adquire característica mutável, sem dúvida algo positivo, mas que irá sendo decifrado ao longo de nossas vidas e caminhada. O retorno ao Guruji mostrou que todos os estudantes passaram por processo tão relevante quanto o vivido na penha, muitas palavras ditas, certamente não conseguiriam delinear a riqueza do momento. Ao relatarmos brevemente nossas experiências conseguimos contemplar o quão relevante havia sido o ENEC para cada um dos presentes. Algo místico, indivíduos diferentes, inseridos em comunidades diferentes e que compartilhavam de sentimento talvez único, compartilhávamos a amorosidade de quem luta pela vida. Resultados: o fato de sermos estudantes nos credenciou a participar do estágio, apesar disso, acredito que não estive ali como estudante de enfermagem, estive como pessoa humana que buscou entender a dinâmica de uma comunidade, que embora rica de valores, perecia de dificuldades advindas de um ciclo de exploração tão grande e tão próximo que não se deixar ser visto com facilidade. A vivência propiciou em meu caso uma reafirmação de alguns objetivos, como o de encarar minha prática profissional como prática militante, bem mais que um trabalho. Considerações finais: os significados da vivência no II ENEC constituem quadro mutável, suas significações tomarão diferentes contornos ao longo da vida e caminhada de cada um, atualmente é sinônimo de algo intenso, impactante, transformador e construtor de outros modos de atuar como ser e, consequentemente, como profissional de saúde. Dessa forma, apresentamos a vivência militante de participação no II Estágio Nacional de Extensão em Comunidades como relevante no caminhar na trilha da formação dos sujeitos ali presentes, demonstrando o campo potente constituído pelas experiências que extrapolam o ensino aprisionado em salas de aula. Experiências como estas trazem para os que dela participam riquezas outras, para além das contidas no mundo seguro e cômodo entre quatro paredes, portanto constitui riqueza diversa e potencialidade passiva de ser estudada e, sobretudo, vivenciada.
Palavras-chave
Militância; Formação em saúde; ENEC