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SÍFILIS E A DOAÇÃO DE SANGUE: SOLIDARIEDADE POSSÍVEL?
Última alteração: 2015-12-09
Resumo
Apresentação: A possiblidade de transmissão de doenças por meio da transfusão de sangue, como a sífilis, hepatites, doenças de chagas e HIV, é uma das maiores preocupações relacionadas à segurança transfusional (FERREIRA, 2007). Com o objetivo de manter um procedimento de qualidade, os Hemocentros, norteados pela Portaria nº 2.712 de 12 de novembro de 2013, realizam testes obrigatórios na triagem laboratorial das doenças transmitidas pelo sangue, através de amostras coletadas do doador de sangue. Assim, possibilita a liberação ou não do sangue coletado para uso em pacientes. Entretanto, eles não permitem estabelecer diagnósticos de certeza, de modo que as pessoas identificadas como tendo resultados reagentes, positivos ou duvidosos na triagem, devem necessariamente ser avaliadas, sendo convocadas para coleta de 2ª amostra e aconselhadas por profissionais de saúde com capacidade técnica para o acompanhamento dos casos (MERCER, 2010). Anteriormente a esta triagem laboratorial, o doador de sangue passa por uma triagem clínica, realizada por profissional de saúde de nível superior, treinado para este fim. Segundo o Ministério da Saúde (2013), consiste em uma avaliação clínica e epidemiológica do candidato, constituída por um exame físico e análise de suas respostas ao questionário que visa avaliar sua história médica atual e prévia, seus hábitos e a existência de fatores de risco para doenças transmissíveis pelo sangue. Neste contexto, a sífilis, possui como principal via de transmissão o contato sexual, seguido pela transmissão vertical, podendo também ser transmitida por transfusão sanguínea. É doença causada por uma bactéria, o Treponema Palidum e a apresentação dos sinais e sintomas da doença é muito variável. Quando não tratada, evolui para formas mais graves, podendo comprometer órgãos vitais. Embora exista tratamento, e seja eficaz nas fases iniciais da doença, métodos de prevenção devem ser implementados, pois adquirir sífilis expõe as pessoas a um risco aumentado para outras DST, inclusive a Aids. O número de casos de sífilis vem aumentando no Brasil, assim, todos os profissionais da área da saúde devem estar atentos às suas manifestações (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010). O presente estudo, objetiva, relatar a prática em relação a entrega de exames de triagem sorológica para a Sífilis no Hemocentro Regional de Dourados, Mato Grosso do Sul, incluindo o acolhimento, aconselhamento e encaminhamento deste doador, que conforme orientação do Hemocentro Coordenador, torna-se inapto definitivo para doação de sangue, mesmo após o tratamento da doença. Desenvolvimento do trabalho: O Hemocentro Regional de Dourados possui um setor denominado “Nova Amostra”, responsável pela convocação de doadores que apresentam alterações nos resultados de exames realizados, fazendo uma segunda coleta de amostra de sangue, para confirmação deste resultado. A convocação desse doador é realizada por correspondência e/ou telefone. Verifica-se que a convocação do doador, muitas vezes o deixa apreensivo pela espera do resultado confirmatório. Após a realização de exames na nova amostra coletada, o doador é convocado novamente, dessa vez para a entrega do resultado, realizada por um profissional enfermeiro. Para triagem da sífilis, o método de exame utilizado é a quimioluminescência, classificado como um método qualitativo. Sua reatividade indica que o usuário teve contato com Treponema pallidum, causador da sífilis, em alguma época de sua vida e desenvolveu anticorpos específicos. No entanto existe uma grande dificuldade de entendimento, por parte do doador ao receber este resultado de exame. Torna-se importante ressaltar que ao informar este resultado o profissional de saúde esclarece ao doador de sangue que o exame realizado no Hemocentro não possui finalidade diagnóstica, e sim de triagem sorológica, para fins de transfusão. Além disso, por meio deste resultado não é possível identificar se é uma infecção atual ou passada. Dessa forma, o doador é encaminhado a uma Unidade de saúde, para acompanhamento médico e realização de outros exames diagnósticos, se necessário. Cabe ao enfermeiro, durante este atendimento, informar ao doador que devido a esse resultado, o mesmo não poderá mais ser doador de sangue, ou seja, será inapto definitivamente. Impacto: Podemos vivenciar durante todo esse processo, desde a convocação do doador de sangue até a entrega do resultado, com a informação de que o mesmo não poderá mais doar sangue, o transtorno emocional gerado nesses indivíduos. Inicialmente, pela dúvida gerada por meio da nova coleta solicitada. Após, com o resultado, considerando-se ser uma doença transmitida sexualmente, ocorre muitas vezes, um posicionamento por parte do dador de sangue, de não aceitação desse resultado, embora seja explicado que não é um diagnóstico definitivo e que necessitará de uma avaliação específica. Pode-se observar comportamentos que vão de raiva a dúvidas em relação ao resultado. Muitos são os questionamentos realizados ao profissional de saúde, entre eles: “como posso ter adquirido?”, “apresenta sintomas”?, “devo comunicar meu parceiro (a)”?, “o que faço agora?”: Na maioria das vezes, o doador sai desse atendimento insatisfeito, pois acredita que esta avaliação, acompanhamento e tratamento, deveria ser realizada no próprio Hemocentro, apresentando dificuldades para compreender o funcionamento dessa rede de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Acreditamos que quando esse doador é informado sobre esse resultado, o impacto emocional é agravado por não existir uma sistematização de entrega de resultados, nem o acompanhamento de profissionais especializados de forma contínua, no Hemocentro. Ressaltamos, a sobrecarga de trabalho em relação aos profissionais, que se dividem entre vários setores, dificultando o planejamento e sistematização das ações. Concordamos com Mercer (2010), quando descreve que esse doador sente que de alguma forma foi traído, pois após praticar um ato de solidariedade e cidadania, recebe a informação que apresentou um exame com sorologia positiva. Além disso, a partir de setembro do ano de 2013, o Hemocentro Coordenador, definiu que todo doador que apresentasse o resultado de sífilis quimioluminescência reagente, não poderia doar sangue e essa é uma das questões que mais afeta o doador, até mais do que o próprio resultado. Sabe-se que a doação de sangue, envolve muitos fatores como a solidariedade, o altruísmo e algumas crenças em relação à necessidades fisiológicas de doação e para muitos indivíduos, o fato de nunca mais poder doar sangue, torna-se uma situação penosa. Porém, as medidas realizadas pela instituição, visam manter a qualidade do sangue transfundido. Considerações finais: Podemos considerar que o SUS vem avançando nos últimos anos, e a eficácia da triagem sorológica nos Hemocentros, é um exemplo disso, pois garante uma transfusão sanguínea segura e reafirma a premissa de que saúde é um direito de todos. Porém, é necessário um fortalecimento dessa política de forma integral, neste caso que envolva o atendimento ao doador de sangue. Por fim, destacamos a necessidade por parte dos gestores, do fortalecimento da Política de Acolhimento e Humanização, bem como o incentivo e o suporte aos profissionais de saúde, por meio de garantia de estrutura adequada, número de profissionais suficientes para atendimento psicossocial e educação continuada e permanente. Dessa forma, será possível cumprir de forma efetiva as legislações referentes à Política Nacional de Sangue e Hemoderivados, no que diz respeito ao atendimento ao doador e garantia de qualidade do sangue e hemoderivados.
Palavras-chave
hemocentro, doador de sangue, infecções por treponema
Referências
FERREIRA, O. Estudo de Doadores de Sangue cm sorologia reagente para Hepatites B e C, HIV e Sífilis no Hemocentro de Ribeirão Preto. Dissertação de Mestrado apresentada `Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP- Área de Concentração: Saúde na Comunidade. Ribeirão Preto, 2007. 123 p.
MERCER, S.E.G. O Olhar do Doador de 2ª Amostra com Sorologia Positiva em DST e AIDS sobre a Qualidade dos Serviços de Atendimento no Hemepar. Gestão de Hemocentros: relatos de práticas desenvolvidas- I Curso de especialização em gestão de Hemocentros, resumo das monografias finais. Brasília, 2010. 674p.
MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2010. Sífilis: estratégias para diagnóstico no Brasil. Coordenação de Doenças sexualmente transmissíveis e AIDS. 2010. 100 p.
______________. Portaria 2712 de 12 de novembro de 2013. Redefine o regulamento técnico dos procedimentos hemoterápicos. Diário Oficial da União nº 221, de 13 de novembro de 2013, Seção 1, página 106