Anais do 12º Congresso Internacional da Rede Unida
Suplemento Revista Saúde em Redes ISSN 2446-4813 v.2 n.1, Suplemento, 2016
AÇÕES DA REDE CEGONHA NO BRASIL: UMA REVISÃO
André Bubna Hirayama, Alline Karolyne Cândida da Silva, Bruno de Jesus Silva Oliveira, Jaqueline Francisca de Jesus Oliveira, Heloísa Silva Guerra, André de Castro Rocha
Última alteração: 2016-02-11
Resumo
APRESENTAÇÃO: A Rede Cegonha (RC), lançada em 2011 pelo Governo Federal, é uma estratégia instituída no Sistema Único de Saúde, com objetivo de reduzir a morbimortalidade materna no Brasil. Através desse programa, a mulher tem assegurado, por meio de rede de cuidados, direito de planejar a reprodução, de receber atenção humanizada em gravidez, parto e puerpério, além da criança ter o direito de nascer com segurança, ter crescimento e desenvolvimento saudáveis (BRASIL, 2011). O objetivo é analisar ações de saúde materna e infantil implementadas no Brasil após publicação da Portaria 1.459 de 2011, que institui a RC. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Estudo descritivo de revisão da literatura especializada, por meio de busca online das publicações sobre o tema e utilização de dados secundários do Ministério da Saúde (MS), sobre os indicadores e metas (OM - Objetivos do Milênio e Rede Cegonha), através dos instrumentos de monitoramento e avaliação do MS (SIM - Sistema de Informação Sobre Mortalidade e SINASC - Sistema de Informação Sobre Nascidos Vivos). A busca foi realizada entre abril e julho de 2015, nas bases Medline, Lilacs, Scielo, Google Acadêmico e Periódicos Capes e em documentos oficiais produzidos pelo MS, utilizando os seguintes descritores: Rede Cegonha, Sistema Único de Saúde, Programas governamentais, Saúde materno-infantil e Avaliação em saúde. Para serem incluídas no estudo, as publicações deveriam atender aos critérios de terem sido publicadas em português, no período compreendido entre 2011 e 2015, possuir texto completo disponível on-line e tratar de temática de interesse para atingir o objetivo do estudo. Foram encontrados 8 artigos e 10 documentos do MS relacionados ao tema. Obtiveram-se os textos completos dos artigos que atendiam aos critérios de inclusão, os quais foram lidos e analisados. Os resultados são apresentados de forma descritiva. RESULTADOS E/OU IMPACTOS: Na revisão, foram encontradas ações implementadas pela Rede Cegonha, que tem como bases organizacionais regionalização e integralidade. Uma das ações implantadas em todas as Unidades Básicas de Saúde é o Teste Rápido de Gravidez, criado para detecção precoce da gestação, com acolhimento da equipe de Atenção Básica e orientações baseadas nas necessidades de cada usuária (BRASIL, 2013). Em 2014, foi produzida a nova Caderneta da Gestante, otimizando o pré-natal e trabalho voltado para a grávida, pois procedimentos e condutas clínicas do pré-natal precisam ser realizados categoricamente, avaliados em todo atendimento e, junto com achados diagnósticos, devem ser sempre registrados para prover fluxo de informações (BRASIL, 2014). Essa caderneta é direcionada a profissionais e usuárias do SUS e contém diretrizes com base em evidências científicas; está incluso cartão de acompanhamento do pré-natal para registro de consultas, resultados de exames e das vacinas (BRASIL, 2014). A RC ampliou o Plano de Qualificação das Maternidades (PQM) em extensão territorial, porque se busca trabalhar num objetivo de produzir redes de atenção materno-infantil; assim, a RC agrega acolhimento em rede, intervenção pelos direitos reprodutivos e sexuais e inserção de Centros de Parto Normal e Casas da Gestante e Bebê (VASCONCELOS; MARTINS; MACHADO, 2014). Segundo Giovanni (2013), a RC propôs elaboração e validação de diretrizes clínicas, estruturadas em linhas guia e protocolos clínicos, estimulando mudanças comportamentais dos profissionais por educação permanente e avaliação da condição de saúde segundo estratos de risco. Para Ceccim e Cavalcanti (2011), ela auxilia no enfrentamento a problemas de leitos, precária assistência hospitalar, altos índices de mortalidade materno-infantil e cesáreas; sendo que a maternidade deixa de ser estatística para se tornar direito; e a proposta universalizante reconhece a pluralidade entre as mulheres. Busca-se oferecer cuidados à saúde de mulheres, independente de raça, etnia, classe social, orientação religiosa, orientação sexual, estilo de vida e crenças (CARNEIRO, 2013). Outra ação relevante é a ruptura de uma moral preconceituosa que envolve a gravidez, para que a grávida não tenha que sujeitar seu corpo a fazeres e saberes biomédicos, respeitando sempre a autonomia (VASCONCELOS; MARTINS; MACHADO, 2014; RATTNER, 2014). Tentam-se desnaturalizar concepções, hierarquizações de gênero e raça/cor que acompanham a atenção materna e preparar profissionais para atenderem humanamente mulheres em situações de abortamento, gestantes adolescentes e para a não violência institucional contra mulheres grávidas (VASCONCELOS; MARTINS; MACHADO, 2014). A RC pauta-se num modelo que busca resgatar que gravidez não é uma doença, mas função fisiológica que constitui experiência única para mulher e sua família (GIOVANNI, 2013). A RC inclui avanços na gestão do cuidado, assimilando a Política Nacional de Humanização (BRASIL, 2004). A proposta oferece rede de atenção à saúde perinatal de forma regionalizada e hierarquizada, com oferta de vaga no sistema de saúde a partir do início do pré-natal (BRASIL, 2011). Almeja-se reduzir a alta prevalência da medicalização do nascimento e do uso de tecnologias sem evidências científicas, incluindo a gestante como personagem principal do processo de gestação e parto (CAVALCANTI et al., 2013; BRASIL et al., 2013). A inserção desse programa na Atenção Básica fortaleceu o vínculo com usuárias e melhorou o pré-natal, com foco na realização da educação em saúde da gestante (BRASIL et al., 2013). A redução da mortalidade infantil no Brasil alcançou, em 2012, 3 anos antes da data estipulada, os índices de redução definidos nos ODM - Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (IPEA, 2013). Segundo o Ministério da Saúde, nos últimos três anos, a queda da taxa de mortalidade na infância foi de 9% (BRASIL, 2013). Observou-se também necessidade da participação ativa da Vigilância Sanitária na implantação da RC, pois suas funções de prevenção de riscos, promoção da saúde e avaliação da qualidade são importantes (FERNANDES; VILELA, 2014). Um estudo no Espírito Santo, através da observação do cartão da gestante e do prontuário do recém-nascido, demonstrou que a assistência pré-natal era inadequada, principalmente para gestantes de menor renda vindas da zona rural (MARTINELLI et al., 2014). No SIM (Sistema de Informações sobre Mortalidade), analisando a mortalidade materna entre 2011, ano de implantação da RC, e 2014, último ano com dados completos, percebe-se que algumas taxas permaneceram constantes, provavelmente pela prematuridade do programa. Nas mortes causadas por hipertensão e por hemorragia, nota-se diminuição dos números, com exceção de 2013. Mortes por infecção puerperal e aborto tiveram diminuições consideráveis. Mortes por doenças do aparelho circulatório tiveram aumento, principalmente na região Nordeste. No Brasil, mortes relacionadas à AIDS tiveram queda considerável (de 44, em 2011, para 30, em 2014). Ao consultar o SINASC (Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos), verificou-se uma taxa de 58 mortes maternas por 100.000 nascidos vivos em 2013; e de acordo com o quinto objetivo, componente dos ODM, propõe-se reduzir a mortalidade materna para 35 mortes a cada 100 mil nascidos vivos em 2015. CONSIDERAÇÕES FINAIS: As práticas instituídas com RC são importantes para reduzir mortalidade materna e infantil por estruturarem as rede de cuidados integrais. No quadro atual de atenção obstétrica, com elevadas taxas de cesariana e práticas inadequadas na assistência ao parto normal, é imprescindível que a gestante seja informada sobre seus direitos, o que possibilita o fortalecimento da sua autonomia e protagonismo. A RC mostrou avanço na proteção integral ao processo de gestação, parto, nascimento, puerpério e início da vida, em termos da gestão do cuidado e do sistema, mas, por envolver políticas de educação em saúde, seus efeitos serão mais tocantes apenas em longo prazo.
Referências
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