Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Um olhar crítico sobre a contratualização entre organizações sociais e unidades de pronto atendimento
Bárbara Lopes de Andrade Bulhões, Ana Laura Brandão, Paulo Eduardo Xavier de Mendonça

Última alteração: 2015-10-30

Resumo


Apresentação: As Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e as Organizações Sociais da Saúde (OSS), hoje são mais que simples siglas, definem um tempo, uma política e a marca de governos, a associação entre estes são também testemunhos da reforma gerencial do Estado, empreendida no Brasil e na América Latina no decorrer dos anos oitenta e noventa. O estudo sobre o tema busca a transparência e participação social nestas definições, trazendo análises que tornem mais nítido como ocorre a regulação de equipamentos do Estado por meio de contratos de gestão. No Brasil, este processo de Reforma do Estado percorreu diversos governos acompanhando as interfaces da conjuntura internacional. Após a Constituição de 1988 aprimora-se o desenvolvimento neoliberal e apresenta-se o Plano de Reforma do aparato do Estado como crítica à falta de efetividade e ineficiência da administração pública. Este processo sistematizado por Bresser Pereira prossegue com políticas de ajuste estrutural, aceleração da programação de privatização e definição de uma agenda de reformas, como a Reforma Gerencial, e através do Plano Diretor da Reforma de Estado em 1995, que segundo este autor, poder-se-ia sair da Administração Pública Patrimonialista e Burocrática na direção da Administração Pública Gerencial. (BRESSER-PEREIRA, 2010; ABRUCIO, 2007). As alternativas ditas gerenciais têm em comum a regulação pelo Estado. Em vista disto, o fortalecimento da regulação dos serviços públicos operados por estas parcerias seria ponto fundamental para estabelecimento de um governo mais efetivo, e para isto seriam necessários marcos e aparatos regulatórios que funcionassem a contento. Nesta busca por maior eficiência, foram desenvolvidos instrumentos para medir o desempenho em termos de qualidade, eficiência e equidade, além de montar sistemas de gerenciamento de desempenho na perspectiva de impulsionar mudanças de comportamentos que possibilitem melhores resultados (VIACAVA et al., 2004). Entre estes instrumentos estão os indicadores apresentados nos contratos de gestão, que definem como será avaliado o desempenho, garantindo a definição de metas específicas e controle sobre o que é realizado. No caso do contrato analisado, o que deve ser cumprido e mensurado pelos indicadores, consta nas leis e definições das políticas, como a Política da Rede de Urgência e Emergência do Brasil. As UPAs são o principal componente fixo da rede de urgência pré-hospitalar do país, no Município do Rio de Janeiro (MRJ) são geridas por OSS envolvendo elevados recursos públicos transferidos de acordo com metas físicas pactuadas por indicadores. Esta situação descrita indica que estudos devem analisar tais contratos para subsidiar o planejamento em prol da assistência integral e qualidade nos serviços, além de eficiência e economicidade. Para isto o presente estudo busca compreender o processo de contratualização entre as OSS e o município do RJ com foco na sua relação do modelo de gestão e a reforma do Estado e sistematizar resultados da oficina de consenso que analisou os indicadores da UPA presentes no contrato. Desenvolvimento: O estudo foi desenvolvido por meio de análise documental e análise do grupo de consenso que avaliou os indicadores do contrato por meio do método Delphi. Na análise dos indicadores utilizaram-se os critérios de propriedades essenciais, as quais qualquer indicador deve apresentar e sempre devem ser consideradas como critérios de escolha independente da fase ou do ciclo de gestão em que se encontra a política sob análise. Estas propriedades dos indicadores são expostos no documento do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão de 2012, são eles: Utilidade, Validade, Confiabilidade e Disponibilidade. Esta oficina definiu a classificação dos indicadores por atenderem ou não os critérios aplicados à teoria da seguinte forma, Sim: Atende aos critérios das propriedades essenciais e Não: Não atende aos critérios das propriedades essenciais. Os itens que não considerados como indicador foram classificados como Cumprimento de Contrato (CC) ou Não é Indicador (NI). Resultados: Dos 15 itens apresentados apenas um foi considerado indicador adequado com base nas Propriedades Essenciais, o Percentual de Boletim de Atendimento de Emergência (BAE). O indicador Tempo médio de Espera entre classificação de risco do enfermeiro e o atendimento médico e Percentual de Trombólise realizadas no tratamento de Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) com Supradesnivelamento do segmento ST (segmento apresentado no Eletrocardiograma), apresentam-se insatisfatórios apenas para confiabilidade, 4 indicadores apresentam metade dos critérios de maneira satisfatória e dois atendem apenas a propriedade disponibilidade. O que comprometeu a adequação dos indicadores as propriedades foi a falta de descrição dos métodos, a maneira como são construídos e como as atividades relacionadas a eles serão realizadas. Apresentando ainda muitas inconsistências entre seus nomes, objetivos e metas, além de pouca adesão às dimensões de classificação. Dos 15 itens, 6 apresentaram tais inconsistências (2 Não é indicador e 4 Cumprimento de Contrato). Quanto à dimensão a que eles pertencem os possíveis indicadores não apresentam clara associação à classificação, além de não haver definição das categorias no contrato. A maioria dos quesitos propostos não se adéqua as propriedades essenciais de indicador, sendo números brutos ou cumprimentos contratuais/legais. Ou seja, da maneira como são descritos, a maioria deles não se ajusta às dimensões propostas e não aferem a qualidade do que se propõe. O que figura grave equívoco do contrato tendo em vista que a regulação feita pelo Estado se dá por meio deste instrumento, e estes “indicadores” constam como pontos para repasse financeiro entre MRJ e OSS. Considerações Finais: A análise dos indicadores demonstram que a regulação pelo Estado por este tipo de contrato é frágil, pois os indicadores por si só não podem definir uma análise absoluta da realidade, precisando estar descritos e contextualizados de maneira clara e referenciada, o que não ocorre no contrato analisado. Tendo em vista o olhar crítico do campo da avaliação e a elaboração das políticas públicas, os indicadores são passiveis de constantes disputas de poder a fim de afirmar ou negar o que realmente se busca contratualizar. Neste sentido, a democracia representativa atual, possibilita de certo modo uma critica pública, que fomente a discussão frente aos indicadores dos contratos apresentados pela gestão pública. Comparado com indicadores internacionais percebe-se que os apresentados no contrato apresentam pouco foco nos usuários e com a noção de rede. Com isso identifica-se a importância de mais trabalhos, a reformulação dos indicadores dos contratos, além de se ampliar a discussão das maneiras de regulação do Estado. Deste modo confirmamos as suposições iniciais, apreendidas em experiências técnicas, acadêmicas e de atuação nos movimentos sociais. A inconsistência do contrato pode apresentar mais relações com os interesses dos entes contratados do que os voltados para a regulação do Estado. O que nos leva a refletir para além do dever de se radicalizar na transparência das políticas e ações do Estado. A importância de fomentar nos espaços o olhar de quem usufruí das políticas como uma visão qualificada e norteadora, capaz de colaborar e construir novas perspectivas sobre as políticas públicas.

Palavras-chave


Reforma do Estado; Gestão em Saúde; Contratualização; Indicadores; OSS

Referências


ABRUCIO, F L. Trajetória recente da gestão pública brasileira: um balanço crítico e a renovação da agenda de reformas. Revista de Administração Pública. 2007, v.41, n. spe, p. 67-86, 2007.

BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Orçamento Federal. Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos. Indicadores:  orientações  básicas aplicadas à gestão pública. Brasília, DF, 2012.

BRESSER-PEREIRA,  Luiz  Carlos.  Democracia,  estado  social  e  reforma  gerencial.  Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 50, n. 1, p. 112-116. jan./mar. 2010.

VIACAVA, F.  et  al.  Uma  metodologia  de  avaliação  do  desempenho  do  sistema  de  saúde brasileiro.Ciência & Saúde Coletiva, v. 9, n. 3, p. 711-724, 2004.