Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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DO PRIVADO PARA O PÚBLICO: RACISMO INSTITUCIONAL UM OBSTÁCULO A EQUIDADE PARA A SAÚDE NO BRASIL
Angela Ernestina cardoso de Brito, EUNILSON DIAS SANTOS, Nadir CARDOSO DE BRITO, janice pimenta Borém

Última alteração: 2015-10-19

Resumo


Este trabalho objetivou discutir o racismo institucional na área da saúde, e as possibilidades de ações que erradiquem os efeitos perversos dessa prática. Estudos indicam de que raça é um fator condicionante de acesso a serviços de saúde, sendo os brancos, os que fazem maior uso deles e por mais tempo (CUNHA, 2004, p.108). Nesta perspectiva o racismo institucional entendido como a forma de racismo que se estabelece nas estruturas de organizações da sociedade e nas instituições, pode ser traduzido em ações e mecanismos de exclusão perpetrados pelos grupos racialmente dominantes. Trata-se de um trabalho de cunho bibliográfico com pesquisa em fontes primárias e secundárias. Consideramos que o combate e a prevenção ao racismo institucional na saúde demandam medidas não apenas de caráter normativo ou proibitivo, mas ações efetivas que busquem a equidade e permitam, ao mesmo tempo, a elaboração de políticas públicas eficazes para combater as adversidades impostas ao seguimento populacional negro em decorrência do preconceito racial e exclusão social vivenciados historicamente. O racismo institucional e seus desdobramentos: O racismo institucional pode ser definido como o fracasso coletivo de uma organização em prover um serviço adequado e profissional para os usuários em decorrência de sua cor, cultura ou origem étnica. Ele pode ser detectado nos processos, atitudes e comportamentos que resultam em discriminação por preconceito involuntário, ignorância, negligência e estereótipos racistas que causam desvantagens a pessoas de minoria étnica (KALCKMANN, 2007, p.146). A prática do racismo institucional na área da saúde afeta preponderantemente as populações afrodescendentes. Na maioria das vezes não se tem a noção real do racismo embutido nas organizações públicas e privadas, sobretudo, porque o Brasil edificou-se sobre o mito da democracia racial, o que dificultou a tomada de consciência política e social por parte da sociedade brasileira. Em nosso país, pode-se dizer que o racismo institucional manifesta- se em privilegiar a população branca, mas também em ações e atitudes para controle, manutenção e propagação dessas prerrogativas via apropriação do aparelho estatal. Em detrimento do racismo no plano individual, que se aproxima do preconceito, quando um indivíduo se coloca na posição de superior ao outro por conta de sua cor, o racismo institucional é disseminado quando as estruturas e instituições, públicas e/ou privadas de um país, atuam de modo diferenciado em relação a determinados grupos em função de suas características físicas ou culturais. Ainda quando o resultado de suas ações – como as políticas públicas, no caso do Poder Executivo – é assimilado de forma diferenciada por esses grupos. O racismo sai da esfera privado e passa para o público.   A população negra vem sendo discriminada nas unidades de saúde, como usuários e como profissionais. Os serviços de saúde, por meio de seus profissionais, aumentam a vulnerabilidade desses grupos populacionais, ampliando barreiras ao acesso, diminuindo a possibilidade de diálogo e provocando o afastamento de usuários (KALCKMANN, 2007, p.146).   Estudos evidenciam que há desigualdades importantes entre a saúde de brancos e negros, e entre homens e mulheres, explicitando interações sinérgicas entre desigualdades sociais, raciais e de gênero. Não há como desconsiderar o peso da dimensão étnico racial nos profundos problemas sociais que assolam o Brasil, bloqueando relações, possibilidades de participação, inibindo aspirações, mutilando práxis humanas, acentuando a alienação de uns e de outros, indivíduos e coletividades (KALCKMANN, 2007, p.147). A discriminação por cor[1] perpassa por meio de mecanismos de expressão que não transgridem abertamente essas normas, infere diferenças importantes no acesso e na assistência nas diferentes esferas da sociedade, como, na educação, ocasionando menor oportunidade de escolarização. Na polícia e outras forças de autoridade e controle social, pode se constatar prisões ilegais e detenções arbitrárias, “As discriminações e os racismos são componentes essenciais na conformação da sociedade brasileira e operam menos no plano individual e mais no plano institucional e estrutural (SILVÉRIO, 2002, p.223)”. Estas discrepâncias no âmbito dos direitos e do espaço público determinam as manifestações do racismo institucional. Resultados e/ou impactos: Na área da saúde, estudos recentes têm demonstrado que as desigualdades quanto à saúde e à assistência sanitária dos grupos étnicos e raciais são explícitas e que, das configurações de tais desigualdades, o racismo é a mais preocupante. O racismo reduz as possibilidades de diálogo das pessoas com os serviços, reflete na autoestima e, concomitantemente, interfere na saúde, especialmente na saúde mental dos usuários. Preponderante nos serviços de saúde reforça, quando não agrava, a exclusão social. A ‘invisibilidade’ das doenças, por “falta de pesquisas”, que são mais prevalentes no seguimento populacional negro, a exclusão da questão racial nos mecanismos de formação, a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, as qualidades da atenção à saúde, assim como o acesso aos insumos, exemplificam diferenças consideráveis nos perfis de adoecimento e morte entre negros e brancos. Na perspectiva de Guimarães (2007) vivemos em um país notadamente racista, se por esta prática entendermos a proliferação de práticas de discriminação e de atitudes preconceituosas que atingem prioritariamente os negros, os mestiços e pardos. Práticas que por sua vez, diminuem as oportunidades dos negros de competir em condições de igualdade com pessoas mais claras em basicamente todos os âmbitos da vida social. A questão da raça/etnia na saúde deve ser entendida como um tema transversal, que exige profissionais de diferentes esferas e setores da saúde sensibilizados para transformarem a indignação frente aos dados em ações concretas no Sistema Único de Saúde. Embora segundo Cunha (2004).  Entretanto, é possível notar a nítida falta de trabalhos nacionais que contemplem o recorte étnico/racial no estudo de diferenciais no acesso aos serviços de saúde e na sua respectiva utilização, sejam da rede básica e/ou dos serviços especializados (CUNHA, 2004, p.108). Considerações Finais: Considerando que a população autodeclarada afrodescendente representa mais de 44% da população brasileira, poucas informações sobre seu bem-estar e saúde podem ser reunidas. Ademais, salientamos a importância do quesito cor no Sistema de Informação de Saúde, essa informação, pode dar significativas indicações sobre as condições de vida e saúde da população negra e promover políticas públicas para este seguimento. A população negra tem peculiaridades médicas relacionadas à sua etnia e às disparidades raciais e socioeconômicas incidindo numa maior morbidade e mortalidade dependente do tipo de problema médico associado. Para prevenir e minimizar os efeitos do racismo institucional é importante apontar essas disparidades e os encaminhamentos cabíveis. Necessário também inserir programas de educação contínua da comunidade e iniciativas objetivando saciar necessidades específicas de grupos étnicos/raciais diferentes (ROCHA, 2000, p.2). O racismo caracteriza-se como um fenômeno ideológico e complexo, cujas manifestações, embora variadas e diversas, estão ligadas à necessidade e aos interesses, de um grupo social que atribui uma imagem pejorativa a outros grupos.    O desafio de enfrentar o racismo institucional cabe a toda sociedade, principalmente, dos dirigentes das organizações e instituições públicas responsáveis em promover e operar as políticas públicas de atendimento a estas populações. Nesta perspectiva, impõe sermos ofensivos no combate a estas práticas e atuar junto à sociedade civil organizada para ampliar e qualificar a reflexão e o debate sobre desigualdades raciais e combate a prática nociva de racismo institucional.

Palavras-chave


PRIVADO; PÚBLICO; RACISMO INSTITUCIONAL;EQUIDADE; SAÚDE

Referências


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