Rede Unida, Encontro Regional Norte 2015

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(Re) Significando o Monitoramento e Avaliação da Atenção Primária à Saúde na região da tríplice fronteira internacional: Brasil-Colômbia – Peru, Amazonas-Brasil
Maristela Olazar Serejo Duarte Alecrim, Ângela C. R Schiffler, Aída M.M Yunes, Robson R Vidal, Cláudio F Pontes, Sidnéia A G Fregni

Última alteração: 2016-05-30

Resumo


INTRODUÇÃO

Esse relato contém recortes do cotidiano, das afecções, dos encontros, desencontros, enfim do trabalho com as práticas de saúde que se foram (re)significando ao longo de 2 anos e meio. Um movimento de escuta e partilha que foi além daquilo que estamos enxergando, numa relação simbiótica e de disponibilidade do encontro com o outro.

Em 2012, um grupo de Técnicos do Departamento de Atenção Básica e Ações Estratégicas da Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas - DABE/SUSAM tiveram seus primeiros contatos com os princípios da Educação Permanente em Saúde – EPS através do Curso de Especialização em Processos Educativos em Educação Permanente na Gestão Regionalizada do SUS no Amazonas oferecido pela Fiocruz Amazônia e posteriormente no Curso de Especialização em Educação Permanente em Movimento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. No ano de 2014, deu-se inicio a reformulação da Proposta Metodológica de Monitoria e Avaliação – M&A (AMAZONAS, 2006) e a EPS foi a ferramenta que contribuiu para a motivação dos profissionais de saúde para transformação das práticas e processos de trabalho. Toda equipe do DABE foi convidada a participar bem como de outros departamentos e instituições. Foram realizadas diversas oficinas de integração e alinhamento sobre atenção básica

Coletivamente houve identificação dos nós críticos: problemas relacionados aos sistemas de informação e indicadores da APS. A partir daí, foram feitas análises e discussões dos processos de trabalho tomando como base as experiências dos componentes do grupo no seu cotidiano priorizando estratégias para a articulação do momento avaliativo entre os diferentes atores. Esse processo durou oito meses e ficou evidenciado a necessidade de articulação de setores distintos da SUSAM e das Secretarias Municipais, e de se institucionalizar o processo de M&A no Estado e nos municípios como práticas rotineiras de planejamento estratégico ascendente e apoio matricial integrado.

Os técnicos em M&A do DABE/SUSAM, reuniram-se para analisar os dados da APS dos 62 municípios e, constatadas irregularidades expressivas e capazes de ajustes pela gestão municipal, projetaram oficinas de trabalho com o formato baseadas nas realidades locorregionais para empoderamento de técnicos e gestores municipais na reflexão e alteração de dados informatizados.

O local sugerido para o Projeto-Piloto foi o município de Tabatinga-AM, na tríplice fronteira internacional, com grande contingente populacional indígena e uma população flutuante originária dos municípios e países circunvizinhos. Alguns dos agravos importantes são obesidade (10%), sobrepeso (30%), uso de substâncias lícitas ou ilícitas (12% e desses 3% fazem uso prejudicial ou abuso), alta mortalidade por violência (entre jovens de 19 -26 anos), aumento da contaminação por HIV com uma taxa de detecção de 12,7% por 100.000 hab. Também foram verificados alto índice de Proporção de Internações por Condições Sensíveis a Atenção Básica – Icsab (25,64% - ano base de 2014).

O projeto piloto teve duração de 1 (um) ano e pretendeu que com a qualificação dos profissionais de saúde da área geográfica definida, contribuir para o enfrentamento dos problemas relacionados ao indicador 2 do SISPACTO (Icsab), construindo propostas de ação, monitorando e avaliando as atividades desenvolvidas com vistas a alcançar impacto positivo na diminuição da desnutrição, doenças crônicas, gastroenterites, dentre outras.

As oficinas foram planejadas, pela equipe estadual de M&A, com temas específicos que seriam disparadores, sendo que durante a sua execução o dinamismo e evolução das equipes municipais transformariam a mesma em um currículo vivo que seria modelado durante o transcorrer dos encontros. Desta forma, os cronogramas de trabalho inicialmente propostos, foram sendo moldados de acordo com as realidades locais e necessidades de vida real da gestão e dos trabalhadores que vivenciaram a assistência à saúde. Durante esses encontros, reforça-se os espaços para trocas e aprendizados compartilhados. São recortes da caminhada cotidiana que necessitam ser iluminadas, pois mostram potência para as dobras, reposicionamentos, ressignificações. Ceccim & Feuerwerker (2004, p. 45) entendem que a EPS é “uma proposta de ação estratégica para transformar a organização dos serviços e dos processos formativos, as práticas de saúde e as práticas pedagógicas implicaria trabalho articulado entre o sistema de saúde (em suas várias esferas de gestão) e as instituições formadoras.” No mesmo artigo, a respeito da EPS refletem que a formação é uma tarefa socialmente necessária e pode superar posições conservadoras cristalizadas na sociedade e nos serviços de saúde.

Em ambas as oficinas estiveram presentes os conceitos da EPS através dos representantes do Conselho Municipal de Saúde, profissionais, equipes da gestão municipal, estadual, Universidade Federal do Amazonas - Departamento de Saúde Coletiva/internato rural e Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A proposta de intervenção teve como objetivos: A) Identificar quais as atividades, estratégias e recursos a serem utilizados nos municípios para a implementação do M&A, racionalizando e otimizando potencialidades, conservando as peculiaridades étnicas, culturais, religiosas e etc.; B) Construir coletivos de decisão com EPS no desenvolvimento do processo de M&A a partir das necessidades locais de saúde, priorizando conforme valores locais, em consonância com o anseio da população; C) Articular as Políticas de Atenção Integral com ações intersetoriais e transversais na organização das Redes de Atenção à Saúde nos municípios, e: D) Compartilhar resultados obtidos socializando informações entre os gestores, usuários e trabalhadores, através da mídia. Organizando territórios, ações e serviços de acordo com as diretrizes do Sistema Único de Saúde - SUS e as estratégias implantadas.

Foram realizadas quatro oficinas para implantação de instrumento de gestão da clínica: 1) Diagnóstico 2) Programação Local; 3) Protocolos Assistenciais com Classificação de Risco, e; 4) Sistema de Monitoramento e Avaliação. As Oficinas Municipais foram pactuadas de acordo com a disponibilidade da Equipe Técnica, em horários flexíveis para não comprometerem as atividades rotineiras das Unidades Básicas de Saúde.

O uso da metodologia ativa nas oficinas e dinâmicas foi no primeiro momento tímida, mas a partir do segundo dia de trabalho, os movimentos, as trocas e as conexões ocorridas entre participantes, fizeram com que os mesmos se sentissem integrantes e integrados ao processo. As habilidades e competências trabalhadas no coletivo e ressignificadas pelos textos orientadores, discussões, apresentações lúdicas, teatro, desenhos e etc., proporcionaram a diferença entre a proposta do modelo tradicional com a da Educação Permanente.

A disponibilidade das equipes municipais em se trabalhar esse novo modelo, foi um elemento importante e essencial para a adesão local, o que impactou uma expectativa positiva nos monitores/facilitadores estaduais, com o projeto-piloto modelado.

A criação das salas de situação pelas equipes municipais foi um ativador para as reuniões mensais, e para a análise dos dados informatizados, por território adscrito, assim como a construção de planejamentos estratégicos ascendentes para cada ESF com Saúde Bucal e Núcleo de Apoio a Saúde da Família-NASF.

O processo avaliativo teve início com os trabalhos de dispersão municipal, onde as equipes de Atenção Básica criaram estratégias operacionais, conforme as singularidades do município e da regional de saúde. O Planejamento Integrado Ascendente foi discutido, pactuado e alcançado com êxito pelo trabalho de Educação Permanente realizado no cotidiano das atividades das equipes, fazendo com que houvesse uma linha de cuidado pré-estabelecida observando as peculiaridades regionais, os aspectos epidemiológicos, sanitários e ambientais dos territórios/populações.

Das 265 ações propostas no Plano Estratégico e pactuadas pelas equipes, 235 foram executadas com êxito o que corresponde a um alcance de 89% das atividades planejadas na primeira oficina de trabalho.

Os protocolos assistenciais têm sido discutidos pelas equipes e implantados conforme a necessidade dos territórios, em algumas equipes implementadas com a acessibilidade, acolhimentos e os estudos de educação permanente com os coletivos de profissionais.

Como resultados positivos também podemos destacar: aperfeiçoamento para as ações do PMAQ e do NASF que até então não estavam territorializados e trabalhavam na lógica ambulatorial e o monitoramento e encaminhamento dos usuários para outros pontos de atenção.

As atividades multiprofissionais, intra e intersetoriais, são desafiadoras na construção de coletivos, discutido amplamente por profissionais e gestores para implantar/implementar projetos factíveis e necessários, considerando as potencialidades locais existentes. A satisfação dos profissionais das equipes e o reconhecimento da comunidade pelos serviços prestados, está sendo medido pela caixa de sugestões implantadas nas UBS e consideradas pela gestão municipal.

A democrática coleta de informações, reclamações e sugestões, disponibilizadas aos gestores, reforça o planejamento estratégico dos técnicos e fornece subsídios para uma análise aprofundada da opinião dos usuários dos serviços de saúde, quanto as suas necessidades e satisfação dos munícipes. O processo impessoal facilita que os usuários do SUS a utilizem esta ferramenta de trabalho para expressar seus sentimentos na melhoria da qualidade de suas vidas e do controle social.

Na segunda oficina, foi pactuado um boletim epidemiológico que deverá ser socializado à população com linguagem acessível e de fácil entendimento, para o devido conhecimento dos usuários do sistema e co-responsabilização da população pelos trabalhos individuais/coletivos, na busca de resultados mais eficientes, eficazes e efetivos. O documento tem como finalidade principal propiciar discussões dos usuários do SUS com os profissionais de saúde para a construção de ações coletivas que visem implementar medidas de redução do processo agravo/enfermidade e estimular estilo de vida saudável aos comunitários.

CONCLUSÃO

Na análise dos indicadores do SISPACTO e PMAQ observamos resultados positivos na melhoria da gestão e assistência, considerando o indicador pactuado e a satisfação dos usuários, ressaltando a importância do processo dinâmico e contínuo de Educação Permanente na perspectiva de melhoria da qualidade da atenção. Também foi observado que o município participante do projeto conseguiu melhor nos seguintes aspectos: a) Racionalização e Customização de recursos; b) Agenda Única; c) Criação de sala de situação da Atenção Primária em Saúde; d) Implantação do acolhimento com Classificação de Risco, e; e) Territorialização das ESF, Saúde Bucal e NASF.

Ficou evidente o movimento de compreensão da equipe local sobre os aspectos assistenciais, políticos, econômicos e afetivos do processo saúde-doença dos munícipes de Tabatinga. Este contingente de gestores e técnicos servirá de referência aos profissionais em ascensão e aos novos profissionais contratados. A visão crítica e a sistematizada na análise dos dados oficiais da APS, nas reuniões mensais e de gestão possibilitarão o acompanhamento real da alimentação mensal dos sistemas de base nacional. Discutindo processos de trabalho em equipe e avaliando casos clínicos mensalmente, os gestores e técnicos poderão criar uma rotina em pesquisa sobre problemas, avanços e desafios encontrados em seu território e cotidiano de trabalho, bem como soluções mais efetivas, assim como reprogramar os planos de atividades estratégicas.


Referências


  • AMAZONAS. Secretaria Estadual de Saúde. Proposta Metodológica de Monitoramento e Avaliação da AB. Manaus, 2006.

  • CECCIM, R.B.; FEUERWERKER, L. C. M. O Quadrilátero da Formação para a Área da Saúde: Ensino, Gestão, Atenção e Controle Social. PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 41- 65, 2004.