Rede Unida, Encontro Regional Centro-Oeste 2014

Tamanho da fonte: 
"Sanitarista"? Dobras e desdobras de uma graduação em Saúde Coletiva
Argus Setembrino

Última alteração: 2014-11-08

Resumo


Partindo do conceito deleuziano de dobra, pretendo fazer o esboço de uma cartografia da experiência de cursar Saúde Coletiva. A narrativa expressa pontos de subjetivação, isto é, dobras e desdobras que se dão a partir das disciplinas, militância, relações de docência e relações entre pares nos espaços banais da formação. Esta graduação, agenciada por diversos sanitaristas para formar gestores do SUS, nós a entendemos como um dispositivo, virtualmente contradispositivo, com suas linhas de dizibilidade, visibilidade, força e subjetivação. Para tanto, quatro eventos servirão de mote: (1) as primeiras disciplinas cursadas; (2) um conselho de classe; (3) uma sessão do CNS e; (4) a criação, por discentes, de um laboratório intitulado Laboratório Antidisciplinar. A primeira e a terceira dizem da qualidade de sanitarista, profissão para que se forma alguém que cursa Saúde Coletiva. Antes do ingresso na graduação, visitando a página do curso, deparei-me com o substantivo “sanitarista” que, de início, relacionou-se com “Vigilância” e mesmo à “Água Sanitária” e, subsequentemente, a um profissional asséptico, faxinado e higienista; aquele salvador vestido de um branco típico de propagandas de sabão em pó e de pele igualmente branca, expressão de uma vida sem contatos com sol ou poeira; um exemplo de saúde a ser seguido e que em nome dela dita comportamentos. Esta representação determina, por abjeção, o caminho que trilho no curso. Representação que foi sendo desfeita nomeadamente quando das primeiras aulas, em que os professores enunciavam as expectativas com as quais o curso foi criado: em suma, formar profissionais para a construção diária do SUS, para uma gestão qualificada, para a reorientação dos modelos de assistência. Este sentido de “Sanitarista” coaduna aquele apreendido de sessão do CNS em que o profissional de saúde coletiva foi pauta: o de que ao ingressar no curso, os estudantes já fizeram uma opção política pelo SUS. Em oposição ou à diferença do profissional asséptico, este sanitarista não tutela ninguém, malgrado e justamente por também lidar com dispositivos. Ganha, assim, contornos que tornam a figura mais digerível e a identificação com ela mais atual. Na ocasião do segundo evento, no conselho de classe, as linhas de força e subjetivação se explicitaram. O conselho que tem como uma de suas finalidades “acompanhar” estudantes desviantes e “prevenir” evasões. O cunho disciplinar, aquele mesmo de docilidade e utilidade dos corpos estudantis esteve evidente, com relação às faltas na aula e leituras de alguns alunos. Mas que também fez ver que o corpo em sala de aula era muito importante, para que a disciplina cumprisse seu papel de organizá-lo de maneira a torná-lo um sanitarista. O quarto e ultimo evento foi a criação do Laboratório Antidisciplinar por estudantes, com o objetivo manifesto de trazer temas pouco ou nada trabalhados em sala, como biopolítica e biopoder. Como lugar de resistência e abrigo de linhas de fuga, como espaço de territorialização de sonhos próprios, construção e desdobra do ser sanitarista. Espaço de liberdade.


Palavras-chave


formação; dispositivo disciplinar; saúde coletiva; biopolítica