Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

Tamanho da fonte: 
O AUTOCUIDADO NA PREVENÇÃO DE DST’s E HIV EM MULHERES HOMOAFETIVAS DA CIDADE DE CHAPECÓ-SC
Maira Tellechêa da Silva, Lucimare Ferraz, Deborah Cristina Amorim, Jessica Gregolin Pansera, Kaiana Castro

Última alteração: 2015-11-04

Resumo


APRESENTAÇÃO: A sexualidade é um tema periférico, alimentado por tabus e preconceitos, especialmente quando se trata de homoafetividade, uma infinita variação sobre relações sexuais e afetivas entre pessoas do mesmo sexo. Essa discussão é mais difícil quando a conversa é sobre a prevenção de DST’s/HIV, pois se fala muito sobre a prevenção entre heterossexuais, esquecendo que homoafetivos também se relacionam sexualmente. A homoafetividade é vista com preconceito e por isso o medo ou resistência para falar sobre sexualidade e afeto com estes sujeitos. Resistência que dificulta a abordagem e as orientações para promoção, prevenção e cuidado que não acontecem ou deixam muito a desejar. O olhar privilegiado das ciências da saúde para a mulher enquanto sujeito reprodutivo, mas não sexual, excluíram do foco de atenção mulheres cuja prática, relações e desejos sexuais são homoeroticamente orientados. Sendo assim a mulher homoafetiva é vista como invulnerável a transmissões de doenças. Com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da mulher brasileira foi elaborado pelo ministério da saúde em 1984, o Programa de Assistên­cia Integral à Saúde da Mulher (PAISM), que deve atingir as mulheres em todos os ciclos de vida, (negras, indígenas, de áreas urbanas e rurais, em locais de difícil acesso, em si­tuação de risco, presidiárias, de orientação homossexual, com deficiência, etc.). Ainda assim hoje quando se trata de saúde da mulher o olhar é para gravidez, parto, índices de câncer de mama e câncer do colo do útero. Na formação em saúde, o tema saúde da mulher é abordado sem levar em conta as suas especificidades, um exemplo é a não discussão acerca da homoafetividade. A saúde de mulheres lésbicas é assunto silenciado, pouco abordado tanto entre elas, quanto nas publicações acadêmicas. A partir dai surgiu à necessidade de conhecimento sobre a prática assistencial com esse grupo, considerando que o papel do profissional da saúde no cuidado é ouvir, orientar, ensinar, aprender, fortalecer.  OBJETIVO: Identificar como é o autocuidado na prevenção de DST’s e HIV em mulheres homoafetivas, em diferentes faixas etárias, na cidade de Chapecó - SC. DESENVOLVIMENTO: O estudo se caracteriza como pesquisa qualitativa, que analisa e interpreta aspectos mais profundos, descrevendo a complexidade humana, analisando hábitos, atitudes, tendências. Foi realizado com mulheres homoafetivas e idade acima de 18 anos. Participaram 10 mulheres, abordadas pela estratégia “bola de neve”, quando um sujeito leva a outro. Foi utilizado roteiro de entrevista semiestruturado para que as entrevistadas tivessem mais liberdade para falar sem fugir do tema. Ao iniciar as entrevistas encontramos dificuldades devido à desistência de algumas mulheres ao saberem que a entrevista seria gravada. A partir daí tivemos que buscar outra pessoa para começar as entrevistas, causando atraso na coleta de dados. As mulheres que aceitaram gravar a entrevista gostaram do assunto e nos indicaram uma amiga formando assim a “bola de neve”, totalizando dez participantes.  RESULTADOS: A primeira questão abordada foi sobre a orientação sexual. Todas afirmam ser homossexuais, sendo que duas já haviam sido casadas com homens e atualmente têm relação estável com outra mulher. Uma afirmação que nos chamou atenção foi que não é exatamente uma definição, mas uma ‘condição’, pois ela nasceu assim. K.N. 21 anos nos diz: “Eu nunca me defini realmente hetero ou lésbica, é a partir do que eu estou sentindo pela pessoa [...]hoje eu me defino lésbica porque eu amo a menina que está comigo”. Oito das entrevistadas tiveram o início de sua vida sexual com mulheres e por isso não sentiram a necessidade e não foram instruídas a realizar uma consulta ginecológica. Estudos indicam que a primeira visita ao ginecologista reforça a importância de fatores associados a convenções sociais de gênero ao apontarem, como as principais vias de acesso, o início da vida (hetero)sexual e a maternidade. Quando questionadas sobre a realização de consultas ginecológicas, cinco das entrevistadas dizem realizar consultas anualmente, uma delas foi casada e tem um filho e mesmo se relacionando com uma mulher atualmente, acha importante se cuidar. Duas delas relataram histórico de câncer na família ou já ficaram expostas a fator de risco, por isso realizam consulta. Outras duas entrevistadas relataram que acham importante cuidar da saúde. Dentre as cinco que não realizam consultas ginecológicas uma relatou que deixou de ir ao ginecologista quando se separou do ex-marido. ‘Tenho medo’ B.T.B. 18 anos, ‘Não sei por que’ K.L.T. 21 anos, ‘Pode ser relaxamento’ K.P. 23 anos e ‘Não acho necessário’ A.E.N. 31 anos. Foram essas as respostas dadas quando questionamos o motivo da não realização de consultas: ‘Pessoas do meu convívio na mesma situação que a minha já procuraram [orientação], e os médicos não deram orientações, e não pediram exames porque não tinha relação com homens’ relatou A.E.N. 31 anos. Segundo o dossiê de saúde das mulheres lésbicas, os profissionais da saúde solicitam menos o exame papanicolau e as mulheres homoafetivas nem sempre procuram cuidados quando necessário, ou só fazem quando surge um agravo. A partir dessas informações perguntamos o que entendem por autocuidado. Para as entrevistadas se resume em ‘cuidar de si’ e ‘prevenção’, uma das entrevistadas relata que ‘é tudo aquilo que eu posso cuidar na minha saúde [...] na parte física e espiritual também’ R.Z. 40 anos. Dentre as entrevistadas apenas uma não soube responder ou não disse o que entende. Em relação aos cuidados de promoção, prevenção ou autocuidado durante a relação sexual, oito das entrevistadas cuidam da higiene e escolha da parceira e duas relataram que não tem nenhum tipo de cuidado. Dentre as que cuidam da higiene e escolha da parceira somente uma relatou que faz uso de camisinha nas próteses, e também uso de papel filme no sexo oral. É importante destacar que a entrevistada não teve orientação sobre prevenção sexual, mas ao acompanhar uma consulta com a irmã (HIV +) ouviu as orientações passadas pela médica. ‘Eu fui a uma consulta com ela [com a irmã] na infectologista essa abordou o assunto, claro ela estava falando com minha irmã, que ela poderia inclusive ter sexo oral, utilizando papel filme, ai eu pensei: opa! Pêra ai, eu também posso usar!’ L.R. 35 anos. Devemos levar em consideração que nove das entrevistadas estão em um relacionamento estável ou tem parceira fixa e não veem necessidade da utilização de método de barreira para a prevenção de DST’s/HIV. Ao serem questionadas sobre ficar com alguém casualmente elas não souberam responder o que fariam para se proteger. Questionadas a respeito da prevenção de DST’s/HIV todas afirmaram ter recebido orientações na escola, em meios de comunicação, campanhas do Ministério da Saúde, entretanto, quando perguntamos se essas orientações levaram em consideração a homoafetividade, apenas P.L.W. 18 anos relatou que no ensino médio teve orientação de uma professora que é voluntária no GAPA (Grupo de Apoio a Prevenção de AIDS), as demais disseram que essas orientações sempre foram voltadas a relação heterossexual.  CONSIDERAÇÕES FINAIS: Percebemos que apesar de estarem sendo desfeitos alguns tabus em torno da sexualidade, falar sobre prevenção de DST’s e HIV exige aprofundamento, principalmente relacionado à homoafetividade feminina. Identificamos que mulheres homoafetivas se cuidam/previnem a partir de informações comuns que não levam em consideração suas práticas sexuais. È importante que os profissionais de saúde elaborem estratégias para que essas mulheres sejam cuidadas e se cuidem a partir de especificidades do grupo.  

Palavras-chave


Homoafetividade; cuidado; saúde da mulher.

Referências


ALMEIDA, G.. Argumentos em torno da possibilidade de infecção por DST e Aids entre mulheres que se autodefinem como lésbicas.PhysisRevista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 2, 2009.

 

BARBOSA, R.M. e FACCHINI, R. Acesso a cuidados relativos à saúde entre mulheres que fazem sexo com mulheres em São Paulo, Brasil. Cadernos Saúde Pública, Rio de Janeiro, 25, Sup 2, 2009, p.S291-S300.

 

BRASIL. Política nacional de saúde integral de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Ministério da saúde: Brasília – DF 2010.


 

REDE FEMINISTA DE SAÚDE. Saúde das mulheres lésbicas. Promoção da equidade e da integralidade.Belo Horizonte. 2006.

 

 

BRASIL. Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: princípios e diretrizes. Ministério da Saúde. Brasília-DF 2004.

 

FACCHINI, Regina; BARBOSA, Regina Maria. Saúde das mulheres lésbicas. Promoção daequidade e da integralidade. Belo Horizonte; Rede Feminista de Saúde; 2006.

 

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina de Andrade. Metodologia cientifica: ciência e conhecimento científico, métodos científicos, teoria, hipóteses e variáveis. 5. Ed São Paulo: Atlas, 2010.

MELO,Ana Paula Lopes de. "Mulher Mulher" e "Outras Mulheres": gênero e homossexualidade(s) no Programa de Saúde da Família.2010. 150f. Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Medicina Social.

 

MINAYO, Maria Cecilia de Souza. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11. ed. São Paulo: Hucitec, 2008.