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A IMPLICAÇÃO DO ESTÁGIO E VIVÊNCIA NA REALIDADE DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE DO MARANHÃO PARA A FORMAÇÃO DE FUTUROS PROFISSIONAIS HUMANIZADOS: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA
Última alteração: 2016-04-29
Resumo
APRESENTAÇÃO: O Sistema Único de Saúde (SUS) possui importantes espaços potenciais de apoio à formação como cenário de aprendizagem com o objetivo de produzir novas práticas pedagógicas e de cuidado em saúde. Segundo Benevides e Passos (2005), “sujeitos sociais, atores concretos e engajados em práticas locais, quando mobilizados, são capazes de, coletivamente, transformar realidades, transformando-se a si próprios neste processo”. Com esse intuito, é possível edificar conexões entre os profissionais de saúde e com usuários para produzir autonomia e corresponsabilidade, sendo necessário conhecer bem a realidade envolvida. Nesse contexto, o VER-SUS (Vivência e Estágios na Realidade do Sistema Único de Saúde) tem como o objetivo compreender o contexto no qual os usuários do SUS estão inseridos, quebrando preconceitos e mostrando as necessidades deles, que são, em alguns casos, desrespeitados. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: O VER-SUS IMPERATRIZ aconteceu nos primeiros dez dias do mês de agosto, sendo composto por 60 estudantes de todo o Brasil -80% dos participantes vivenciando esse projeto pela primeira vez e o restante, já experientes, facilitando as discussões e debates-, expondo as realidades do SUS de várias regiões do país. No entanto, o intuito era conhecer a realidade local e a aplicabilidade de ações. Esse projeto foi realizado com metodologia ativa de imersão total, ou seja, convivência coletiva de aproximadamente 200 horas com intensos debates e com vivências em diversos locais como o lixão local, tribo indígena, templo de umbanda, assentamento rural, além dos diversos níveis de atenção à saúde. Durante essas visitas, rodas de conversar com os usuários nesses contextos foram organizadas para que os viventes pudessem conhecê-los, compreendê-los e auxiliá-los nessas diferentes situações sociais. Além deles, conversas com profissionais e gestores municipais dos mais diversos setores de saúde onde acontece a prestação de serviços do SUS também foram realizadas. Ademais, havia debates temáticos sobre os locais vivenciados, histórico da saúde no Brasil com determinantes sociais, as dificuldades de acesso e preconceito/opressão enfrentado por alguns grupos de usuários como homossexuais, negros, índios, deficientes, psiquiátricos entre outros. RESULTADO: No início, o Sistema Único de Saúde foi apresentado a todos os viventes e facilitadores por meio de funcionários da gestão municipal que compartilharam todas as dificuldades e qualidades do sistema local. Após isso, os integrantes conheceram o histórico do SUS, tendo ênfase na participação social para criação e consolidação desse modelo de saúde. Não obstante, muitos temas foram abordados para que os viventes pudessem desenvolver a empatia que, em muitos, não existia ou era praticamente inexistente. Isso contribuiu para que, quando fossem iniciadas as vivências, o indivíduo buscasse uma nova perspectiva, não apenas a da acadêmica ou a de gestão. Ademais, nos primeiros dois dias, pôde-se garantir maior integração dos participantes por meio de dinâmicas e apresentações, treinando o ouvir e o escutar dos mesmos. Como resultado desse olhar de conhecer o diferente, os integrantes puderam assimilar a importância de compreender, entender e respeitar o usuário, cliente e funcionários com uma avaliação do ambiente no qual estão inseridos. Ainda assim, essas atitudes ajudam a repensar conceitos, preconceitos e paradigmas. Como primeiro campo de estágio, o lixão municipal foi o escolhido. Embora determinado em lei para o fim desses espaços, foi perceptível o descaso das autoridades, já que há mistura de resíduos sólidos de todos os gêneros, inclusive hospitalar. Muitos dos catadores não possuem escolaridade e sofrem preconceito por desempenharem tal atividade, distanciando-os até de procurarem assistência à saúde. Ainda com a mesma problemática, os umbandistas –segundo campo de estágio- fazem parte de um grupo que é segregado por suas crenças, distorcidas pela sociedade. O movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra foi apresentado para desmistificar os interesses desse grupo, além de deixar evidente a desigualdade existente no país. Assentamentos em locais distantes com condições precárias de acesso à saúde e educação. Ainda nesse período, hospitais públicos e particulares foram visitados comprovando a discrepância existente entre o público e o privado, mas que, serviços públicos, no privado, funcionam de forma ideal, sugerindo problema de gestão da máquina pública. Voltando-se para a atenção primária e de prevenção, várias unidades básicas de Imperatriz foram visitadas, sendo selecionadas pela área de abrangência, referência de atendimento e a que melhor desempenha suas atividades. Essa vivência evidenciou o quão a saúde não é igual e equânime dentro do município. Unidades que tinham uma boa gestão, planejamento e estrutura, embora não conseguisse abranger toda a área de cobertura em contraponto com outra que tinham apenas um médico, uma enfermeira e um agente comunitário de saúde para o desempenho das funções, sendo justificado tal escalonamento devido à falta de verba para o custeio. Outra realidade apresentada foi a dos pacientes com transtornos psicossociais - grupo que é discriminado até pelos profissionais de saúde, marginalizados pela sociedade e, até mesmo, por seus familiares-. Então, CAPS III, CAPS AD, casa de apoio a esses usuários foram visitadas, podendo-se perceber que algumas questões de gestão ocorrem, no entanto, há empenho de todos os profissionais para contornar os obstáculos. Como último local de vivência, foi escolhida a aldeia indígena em que os índios ainda mantêm boa parte de suas tradições, sendo educados em português e no idioma local; possuem uma unidade básica de saúde, ambulância e transporte para o município. Isso permitiu refletir o conceito de saúde e aprimorar o respeito pelas crenças locais, já que, embora tenham assistência, algumas formas de tratamento são recusadas. Considerações finais: Se entendermos humanização como a “a valorização dos diferentes sujeitos implicados no processo de produção de saúde” (HUMANIZASUS, 2009), o VER-SUS, projeto do Ministério da Saúde com a Rede Unida, traz uma proposta efetiva para contribuir com a formação de futuros profissionais do SUS comprometidos eticamente/politicamente com as necessidades da população por meio de vivências e estágios que possibilitam ao estudante experimentar um espaço de aprendizagem, permitindo a humanização do atendimento já que valoriza os sujeitos de produção de saúde e reflete as nossas práticas sobre o diferente. Outrossim, para mudar a realidade do sistema e construir vínculos com os usuários, é necessário que haja conhecimento dessa realidade, sendo difícil garantir a singularidade e especificidade na criação de estratégias para romper com o modelo biomédico focado na doença se não feito dessa forma.
Palavras-chave
HUMANIZAÇÃO; SUS; VER-SUS;
Referências
BRASIL. Ministério da Saúde. Ver – SUS Brasil: cadernos de textos / Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Departamento de Gestão da Educação na Saúde. – Brasília: Ministério da Saúde, 2004.
BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Política Nacional de Humanização. – Brasília : Ministério da Saúde, 2010. 256 p.: il. – (Série B. Textos Básicos de Saúde) (Cadernos HumanizaSUS ; v. 2)
COQUEIROA J. M.; SANTOS K. F.; LEAL S. R. Estágio de vivências no sus-ba: construindo espaços de aprendizagem entre estudantes e serviços de saúde. Revista Baiana de Saúde Pública. v.37, n.4, p.1042-1050 out./dez. 2013.