Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA EM CASOS DE TUBERCULOSE MULTIRRESISTENTE: UMA REFLEXÃO EM SAÚDE PÚBLICA
Juliana dos Santos Lima, Lais de souza Monteiro, Rodrigo Nascimento Dias de Oliveira, Wellington Bruno Araújo Duarte, Augusto Fernando Santos de Lima, Priscila Rossany de Lira Guimarães Portella, Plinia Manuella de Santana Maciel, Fabrycia Cavalcante dos Santos, Elan José de Lima

Última alteração: 2015-11-23

Resumo


APRESENTAÇÃO: Conseqüente do próprio processo de transição demográfica, as doenças infecciosas e parasitárias, a exemplo da tuberculose (TB), têm sido progressivamente substituídas por doenças crônico-degenerativas no que se refere às principais causa de morbidade e mortalidade. Embora nos países desenvolvidos seja possível observar este contexto, nos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, no entanto, tal quadro é identificado de forma associada a um perfil de elevada prevalência de enfermidades infecciosas, assim demonstrando problemáticas quanto à eficácia e resolutividade das políticas públicas voltadas para o controle destas doenças. Apesar de conhecimentos científicos consolidados quanto ao agente etiológico, diagnóstico e tratamento, o controle da tuberculose no Brasil ainda corresponde a uma problemática de grande magnitude, transcendência e vulnerabilidade, detentora de todos os critérios de priorização de um agravo em saúde pública, sem dúvidas, uma das enfermidades mais prevalentes no Brasil e em todo o mundo. O Brasil está entre os 22 países priorizados pela OMS que concentram 80% da carga mundial de TB. Em 2009, foram notificados 72 mil casos novos, correspondendo a um coeficiente de incidência de 38/100.000 habitantes. Esses indicadores colocam o Brasil na 19º posição em relação ao número de casos e na 104º posição em relação ao coeficiente de incidência. Em 2008, a TB foi a quarta causa de morte por doenças infecciosas e a primeira causa de morte dos pacientes com AIDS. No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) possui dentre seus princípios e diretrizes basilares a universalização do acesso, a descentralização das ações e a equidade no tratamento. Desta forma, sendo a tuberculose uma doença de notificação compulsória no país, a responsabilidade do setor público vai desde a profilaxia até a identificação, disponibilização de medicamentos e assistência, realizada prioritariamente pela rede de atenção básica de serviços de saúde. Embora estratégias de controle estejam bem definidas, documentadas e descentralizadas, aspectos que envolvem prevenção, tratamento, qualidade dos serviços de saúde e, principalmente, peculiaridades do usuário com TB dificultam sua efetividade. O abandono do tratamento constitui em um dos principais desafios para o sistema de saúde brasileiro, uma vez que tal situação colabora para o prolongamento do estado infeccioso, aumentando a possibilidade de transmissão e de desenvolvimento de bacilos multirresistentes. A Organização das Nações Unidas (ONU) advertiu seus países­ membros, em 2011, sobre a necessidade de se intensificar esforços na identificação e no tratamento de pessoas com tuberculose multirresistente a terapias convencionais – Multi­DrugResistant Tuberculosis (MDR­TB) – contingente que poderá chegar a 2 milhões em todo o mundo, nos próximos três anos. A reprodutibilidade destes casos associados a um comportamento de recusa de tratamento levou o Brasil a dispor de instrumentos legais que prevêem a internação compulsória ou involuntária. Esta medida é prevista para situações de pacientes recalcitrantes, legalmente capazes, que recusam tratamento apósesgotadas todas tentativas de tratamento ambulatorial, tal estratégia efetiva-se com o apoio da autoridade sanitária e Ministério Publico, a quem compete a adoção de medidas sociais e judiciais de proteção da sociedade. OBJETIVO: O presente trabalho tem por objetivo realizar uma abordagem reflexiva acerca do tema, tendo por referência um relato de experiência em reuniões de discussão vivenciadas no município do Recife–PE. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Utilizou-se de registros de falas e anotações em diário elaboradas a partir de construções e contribuições apresentadas durante as reuniões. Contando com a participação de coordenadores da política de tuberculose dos oito distritos sanitários do Recife, bem como dos gerentes da Vigilância Epidemiológica sob gerência das mesmas entidades distritais e representantes de programas implementados no município, os encontros tinham como proposta discutir o tema, sua materialização no serviço e um possível fluxo de ação quanto à efetivação de tal estratégia. RESULTADOS: Durante o supracitado momento, foi apresentado a Recomendação Conjunta Nº 002/2008, instrumento editado pelo Ministério de Publico de Pernambuco, que acena a possibilidade de internar compulsoriamente um indivíduo multirresistente não tratado que ofereça risco à saúde da sociedade. Tal ato fundamenta-se na idéia deque sendo a Tuberculose Pulmonar uma doença de notificação compulsória e como tal dotada de atenção especial do Poder Público, é obrigação da autoridade sanitária determinar a execução de medidas de controle e profilaxia das mencionadas doenças. Assim considerando que o controle, a eliminação e erradicação da doença são necessárias e de interesse público, medidas judiciais põem ser aplicadas aos casos multirresistentes, uma vez que estes representam risco a saúde e a vida de um número incontável de outros seres humanos. Quanto à efetivação da prática, questionamentos foram levantados quanto à disponibilidade, financiamento e regulação dos leitos para internação, bem como sobre a competência da retirada do paciente da sua residência e a percepção deste em relação aos serviços e direitos em saúde defendidos pelo SUS. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Além dos problemas epidemiológicos, o desafio de controle dos casos multirresistentes de tuberculose saúde embute dilemas de ordem bioética e social. Embora nesses casos, o próprio indivíduo, a família e terceiros tenham legitimidade para buscar o tratamento, a interferência do Estado, caracterizado por toda a sua coercitividade, contrapõe a aspectos garantidos pelo principio bioético da autonomia do sujeito. Outro ponto a ser discutido é o entendimento social acerca da própria doença, uma vez que esta modalidade de internação reforça uma condição de exclusão e preconceito, elementos que além de contrariarem todo o ideário do SUS, se executados de tal forma, podem resultar em uma situação de judicialização e criminalização de pacientes. O processo de internação involuntária não pode ter como principio “tamponar” a ineficiência do sistema em alcançar suas metas e controlar a doença, faz-se necessário entender o contexto macro e micro social do paciente com TB e as interferências destes na recusa ao tratamento É fundamental o questionamento sobre o próprio processo de elaboração e execução da Política de Atenção à Tuberculose no município, os aspectos ligados à abordagem das equipes que atuam no tratamento, as dificuldades de acolhimento, vínculo e adesão com a equipe de saúde, o vínculo familiar e, principalmente, o empoderamento do paciente, pois estes aspectos sim são determinantes para mudanças significativas e realmente resolutivas no que se refere ao controle da tuberculose em saúde pública.      

Palavras-chave


Tuberculose, multirresistente, tratamento compulsório, bioética

Referências


 

ALVES, Rayanne Santos et al. Abandono do tratamento da tuberculose e integralidade da atenção na estratégia saúde da família. Texto contexto - enferm. [http://www.scielo.br/pdf/tce/v21n3/v21n3a21.pdf]. 2012, vol.21, n.3, pp. 650-657.

BRASIL, Ministério da Saúde. Manual de recomendação para controle da tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.

BRASIL, Ministério da Saúde. Portaria 104/ 2011. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt0104_25_01_2011.html>Acesso: 10. Maio. 2015

PERNAMBUCO, Ministério Público do Estado. Internação compulsória de tuberculose e Hanseníase: Recomendação Conjunta Nº 002/2008.

WORLD, Health Organization. The global plan to stop TB 2011-2015: transforming the fight towards elimination of tuberculosis. Genebra: WHO; 2010. Disponível em: <http://www.stoptb.org/assets/documents/global/plan/TB_GlobalPlanToStopTB2011-2015.pdf > Acesso: 11.maio.2015