Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Abordagem do câncer de boca por agentes comunitários de saúde: uma construção significativa
Glória Iara dos Santos Barros, Mônica Villela Gouvêa, Paulo Vctor Oliveira Seno, Laura Regadas da Fonseca, Ana Paula de Souza Moura, Fernanda de Marins Gomes, Sandra Lucia Fonseca Alves, Kátia Regina Fagundes de Carvalho

Última alteração: 2015-10-28

Resumo


INTRODUÇÃO: O Programa Médico de Família de Niterói (PMF) foi implantado, no município de Niterói em 1992, com a proposta de reorientação do modelo assistencial de atenção à saúde, em conformidade com os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde. O processo de trabalho busca uma relação mais próxima com os indivíduos, famílias e comunidades, pela criação de laços de compromisso e corresponsabilidade entre os profissionais de saúde e a população da área adstrita ao território. Dentre as atribuições das equipes, destaca-se a assistência integral, com ênfase nas ações de promoção da saúde, e o desenvolvimento de processos participativos para a promoção da saúde, incluindo a aposta em graus crescentes de autonomia de indivíduos e famílias. A organização do trabalho proposto pelo PMF envolveu inicialmente equipes formadas por médicos e técnicos de enfermagem, em um espaço privilegiado de atenção à saúde, justificado pela possibilidade de maior aproximação com a população em um território previamente definido. Apenas a partir de 2012 as equipes do Programa Médico de Família começaram a serem ampliadas, com a inserção de enfermeiros, dentistas, auxiliares em saúde bucal e agentes comunitários de saúde. No cenário da Estratégia de Saúde da Família, a educação permanente e o trabalho em equipe são fundamentais no processo de trabalho com a saúde das famílias, sendo porosas a todos os profissionais que compõem a equipe, em contraposição e superação às abordagens convencionais médico centradas, tecnicistas e biologicistas. Este relato tem por objetivo apresentar uma dinâmica de ação integrada envolvendo trabalhadores da saúde em uma Unidade de Saúde da Família do município de Niterói/RJ. A experiência ocorreu em julho de 2015 e envolveu uma dentista e oito agentes comunitários de saúde. Relato foi elaborado com o objetivo de ressaltar a importância educação permanente no contexto do trabalho em saúde.DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA: Na comunidade, foram diagnosticados cinco casos de câncer bucal em fase avançada nos últimos três anos. Trata-se de uma comunidade em que a população está exposta a vários fatores de risco para o câncer bucal como o tabagismo, etilismo e exposição ocupacional ao sol, por se tratar de bairro que concentra trabalhadores de estaleiros e  pescadores profissionais. Diante dos casos diagnosticados e com o conhecimento da magnitude do câncer como um problema de saúde pública, a equipe de saúde entendeu que uma ação importante seria motivar os agentes comunitários de saúde para a abordagem do câncer bucal durante as visitas domiciliares e em ações de educação em saúde, como por exemplo, em sala de espera na unidade. Em conversas iniciais os agentes comunitários não aceitarem bem a ideia de abordar o câncer bucal, alegando que não se sentiam seguros com o tema, embora já tivessem realizado ações de educação em saúde sobre vários outros temas como câncer de mama e colo de útero, doenças sexualmente transmissíveis, tuberculose, doenças respiratórias, dentre outros. Solicitaram então que a dentista da unidade apresentasse uma aula. Diante da solicitação de uma aula, a equipe começou a debater como abordar a temática com os ACS, fugindo ao modelo tradicional de transmissão de conhecimentos, numa perspectiva da aprendizagem significativa. A aprendizagem significativa é o conceito central da teoria da aprendizagem de David Ausubel. Trata-se de um processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se, de maneira substantiva (não literal) e não arbitrária, a um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo. Em outras palavras, novos conhecimentos vão sendo adquiridos à medida que vão se relacionando com o conhecimento prévio que o aprendiz possui. Nessa lógica, optou-se por uma ação envolvendo as seguintes etapas: a) os ACS foram provocados a pensar sobre o tema, trazendo para uma roda de conversa memórias de casos que tivessem vivenciado; b) na roda de conversa, a dentista estimulou os ACS a pesquisarem sobre o tema, utilizando para tanto questões usualmente feitas pela comunidade; c) os ACS pesquisaram nos computadores da unidade com o apoio da dentista quando solicitado; d) os ACS retornaram à roda com dados de suas pesquisas; e) houve uma intensa troca de informações entre a dentista e os ACS sobre os dados pesquisados em fontes institucionais renomadas como o Instituto Nacional do Câncer e Organização Mundial de Saúde; f) o grupo decidiu confeccionar materiais didáticos para ações de educação em saúde sobre a temática; g) durante todo o mês de agosto de 2015, dois agentes comunitários de saúde abordaram diariamente o tema do câncer bucal com os usuários que estavam na unidade de saúde aguardando por alguma consulta, curativo ou retirada de medicamento; h) a pedidos dos ACS, a dentista acompanhou as primeiras atividades em sala de espera; i) em nova roda de conversa o grupo considerou que a insegurança inicial estava totalmente superada.RESULTADOS: Os agentes comunitários de saúde relataram que com a ação interativa proporcionada pela abordagem nas rodas de conversa, conseguiram se aproximar do tema de forma mais descontraída e acabaram se apropriando do assunto a partir dos debates e da construção coletiva do material educativo. Relataram também que foi a melhor experiência que tiveram de planejamento de sala de espera, atividade que desempenham sobre temas diversos há mais de um ano nesta unidade. A ação mostrou que o estímulo à reflexão coletiva sobre o tema serviu para que os profissionais se empenhassem e valorizassem seu trabalho. A partir da ação dos ACS nas salas de espera, a equipe de saúde bucal pode perceber uma maior demanda por investigações de alterações nas mucosas bucais e por agendamento de pacientes que não faziam consultas odontológicas com regularidade.CONSIDERAÇÕES FINAIS: Dentre todos os envolvidos nas ações de atenção à saúde, o agente comunitário de saúde é o profissional que atua muito próximo à comunidade, e dessa forma o seu trabalho pode se se traduzir em transformações que efetivem a prevenção e a promoção da saúde . Nas atividades de educação em saúde, a atuação do ACS, pela transmissão de informações básicas, pode contribuir para fortalecer a capacidade da população no enfrentamento dos problemas de saúde. O desconhecimento e a insegurança acerca do câncer bucal foram ultrapassados com a ação de Educação Permanente em Saúde, o que reforça a potência desse trabalho nas equipes de saúde. A experiência fortaleceu os laços entre os componentes da equipe e proporcionou maior  qualidade na abordagem da temática pelosACS, gerando reflexos positivos para os usuários. Desta forma a equipe superou a perspectiva da reprodução de conteúdos em nome da aprendizagem significativa. A equipe avaliou que a iniciativa relatada foi bem sucedida em especial por ter se baseado na participação ativa, na integração entre teoria e prática e na aprendizagem colaborativa no enfrentamento de situações reais.