Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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O TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES SOB O OLHAR DO GESTOR MUNICIPAL: MEDICALIZAÇÃO DO PROCESSO ENSINO APRENDIZAGEM?
Sandie Lauren Kahl Mueller Kovalski, Dominique Corso Bittencourt, Elisete Mariane Neumann, Thiago Pereira Kovalski, Regina Helena Medeiros

Última alteração: 2015-10-27

Resumo


INTRODUÇÃO: O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é o transtorno mais comum em crianças e adolescentes, com ocorrência entre 3 a 5% das crianças em várias regiões do mundo onde tem se estudado. O TDAH é caracterizado pela junção de basicamente três sintomas: desatenção, impulsividade e hiperatividade física e mental. Ele tornou-se ao longo dos últimos anos um assunto extremamente comentado no mundo todo, com a grande propaganda da indústria farmacêutica sobre o fármaco cloridrato de metilfenidato, comercialmente conhecido como Ritalina®, que prometia controlar os seus sintomas. A sociedade necessita de formas de tratamento das hiperatividades menos invasivas e mais naturais, buscando tornar a vida das crianças e adolescentes portadoras do TDAH a mais normal possível, permitindo assim melhor qualidade de vida para as mesmas. OBJETIVO: avaliar junto aos gestores municipais da área de abrangência da 5ª Coordenadoria Regional de Saúde as políticas públicas relacionadas ao Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade em crianças e adolescentes junto aos segmentos da saúde e/ou da educação. PERCURSO METODOLÓGICO: A metodologia utilizada foi a quali-quantitativa. A pesquisa passou por aprovação junto a gestora da 5ª Coordenadoria Regional de Saúde, bem como da Comissão Integrativa Regional, com representantes de todos os municípios da área de abrangência desta coordenadoria de saúde, sendo realizada no dia 10 de setembro de 2013, no município de Canela-RS. Os participantes da pesquisa foram os gestores municipais dos 49 municípios da área de abrangência da 5ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS). Os dados foram coletados através de um questionário estruturado, o mesmo foi entregue aos gestores que o retornaram através de correspondência interna à 5ª CRS. A participação deles foi voluntária. Com base nos resultados obtidos através do questionário, os dados foram inicialmente tabulados e transformados em gráficos e tabelas e posteriormente analisados com base no referencial teórico construído, bem como distribuídos em dez categorias como: 1) TDAH é um problema? 2) Qual é o tamanho do problema? 3) Como e quem diagnostica? 4) Há programa e/ou política sobre o TDAH municipal? 5) Abordagem medicamentosa 6) Outras abordagens para o TDAH 7) Rede de cuidados para o TDAH 8) Educação Permanente em Saúde para o TDAH 9) Programas de Saúde Escolar 10) Legislação x TDAH. RESULTADOS: Obteve-se retorno de 26,5%, o equivalente a 13 dos 49 municípios convidados a participar da pesquisa. Os gestores responsáveis pelos dados foram em sua grande maioria representantes da área da saúde, porém obteve-se também o retorno de dois municípios que responderam o questionário com a percepção da educação, o que permitiu uma breve caracterização de como o TDAH estava sendo abordado por essas duas áreas. É importante salientar que a baixa adesão no retorno dos dados da pesquisa, talvez estivesse relacionada a inexistência de uma política municipal nesta temática. Percebeu-se que 84,6% dos participantes relataram que o TDAH é um problema em seu município e 84,6% deles não possuíam indicador de incidência de casos de TDAH. Ao questionar os gestores municipais referente a existência de algum protocolo para diagnosticar casos de TDAH em crianças e adolescentes, 77% responderam não possuir. Os critérios utilizados para diagnóstico eram consultas com especialistas como, psiquiatra, neurologista, pediatra e neuropediatra. Alguns diagnósticos são realizados também por clinico geral e pedagogo além de outros profissionais como os professores. Observou-se, também, que 77% dos municípios não possuíam política ou programa municipal de atendimento integral a crianças e adolescentes com TDAH. Dentre os municípios que não possuíam uma política nessa área, 63,6% deles demonstraram interesse em possuir. Em 61,5% dos municípios existia registro do número de casos com abordagem medicamentosa, sendo que o metilfenidato (psicoestimulante) foi o fármaco relatado em 77% dos casos para o tratamento do TDAH, a Imipramina (antidepressivo) em 15,4% e a Risperidona (antipsicótico) em 7,6% dos casos. Apenas 2 municípios relataram o número de usuários de medicamento, reafirmando que não se tinha controle do número real de usuários em nível municipal. Em 92,3% dos municípios não havia protocolo de tratamento para o TDAH. Quanto às outras abordagens para o TDAH, em 100% dos municípios as crianças e adolescentes eram encaminhados para atendimento psicológico, 84,6% relataram que as crianças e adolescentes faziam uso de medicação para controle do TDAH, 77% dos municípios possuíam encaminhamentos para neurologista para avaliação do problema, 69% encaminhavam as crianças e adolescentes para consultas psiquiátricas, 61,5% dos municípios as crianças e adolescentes com TDAH faziam acompanhamento com psicopedagogo, 23% utilizavam grupos, 15,6% utilizavam a ludo-terapia como método de abordagem no enfretamento ao TDAH, 15,5% utilizavam a arte-terapia para trabalhar com as crianças e adolescentes com o TDAH, e 7,7% dos municípios as crianças e adolescentes eram atendidos por serviços de homeopatia, fonoaudiologia, consultas com médico clínico geral e serviço de psicoterapia. Em 75% dos municípios não havia fluxograma ou protocolo para encaminhamento de casos. Em 69,2% não existia ambulatório ou serviço específico para transtornos de aprendizagem. Quanto aos municípios respondentes, 77% não haviam estratégias de Educação Permanente em Saúde relacionada à temática e 69,3% relataram interesse em ampliar o tema durante sua gestão, 23% dos municípios responderam não ter interesse e 7,7% não responderam a questão. Em 53,8% dos municípios não havia Programa de Saúde do Escolar apenas 30,8% responderam que tem um programa voltado para a temática, 7,7% responderam que ainda não tinham, porém demonstravam interesse em possuir e 7,7% não responderam a questão. Em 61,5% dos municípios não tinham conhecimento sobre o projeto de Lei 7.081 de 2010 que está tramitando no senado, o qual dispõe sobre o Diagnóstico e o Tratamento do TDAH e Dislexia na Educação Básica. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Analisando as respostas dos municípios ficou claro como o conhecimento sobre leis federais é muito limitado em nível municipal, justificando capacitações aos gestores neste sentido. Conclui-se que a baixa adesão dos participantes pode ser considerada relevante, uma vez que se pode relacioná-la ao conhecimento restrito ou limitado dos gestores municipais sobre o tema, bem como a inexistência de serviços, programas ou políticas específicas para o TDAH em crianças e adolescentes em nível municipal. O enfermeiro, como profissional coordenador do cuidado, tem um importante papel relacionado ao TDAH, buscando articular saúde x educação x família x crianças e adolescentes, através de abordagens inter e transdisciplinares em saúde, sensibilizando gestores para efetivação de políticas e programas específicos para o atendimento integral a crianças e adolescentes com esta necessidade. Deve também lutar contra a medicalização do social e do processo ensino-aprendizagem, ampliando pesquisas nesta temática e buscando outras abordagens, a exemplo das práticas integrativas e complementares de cuidado no Sistema Único de Saúde. Ainda ficam perguntas pendentes e sugestões de novos estudos, onde se possa desmistificar a psiquiatrização do TDAH, questionar as formas diagnósticas e os tratamentos/abordagens meramente medicamentosos ainda vigentes. Chamas-se à atenção também para a necessidade de uma maior abordagem deste tema junto às universidades, tanto em nível de ensino, como na área de extensão e pesquisa, uma vez que praticamente na área da saúde, esta temática passa despercebida.

Palavras-chave


Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade; Crianças e Adolescentes; Políticas Públicas; Medicalização do Processo Ensino Aprendizagem.

Referências


ABDA - Associação Brasileira de Déficit de Atenção. Disponível em: <http://www.tdah.org.br/> Acesso em: 27 abr. 2013.

MÓYSES, Maria A. A.; COLLARES, Cecília A. L. Preconceitos no cotidiano escolar: ensino e medicalização. São Paulo: Cortez: Campinas: Unicamp: Faculdade de educação/Faculdade de Ciências Médicas, 1996.

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POLIT, DENISE F; CHERYL, TATANO Beck. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: avaliação de evidências para a prática da enfermagem. Tradução: Denise Regina de Sales; Revisão técnica: Anna Maria Hecker Luz, Lísia Maria Fensterseifer, Maria Henriqueta Luce Kruse. – 7. Ed. – Porto Alegre: Artmed, 2011. 669p.