Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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PARTICIPAÇÃO SOCIAL: UM PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO COMO PLANO DE MELHORIA NO CUIDADO ÀS PESSOAS VIVENDO COM HIV/AIDS
Malena Gadelha Cavalcante, Elizabeth De Francesco Daher, Ana Cláudia de Brito Passos

Última alteração: 2015-11-02

Resumo


A não adesão dos soropositivos envolve fatores psicossociais, socioeconômicos, regime terapêutico, relações profissional-paciente, paciente-profissional-família-meio social, estigma da doença, negação ou renuncia da enfermidade, falha virológica, risco potencial de evolução para a AIDS acrescida de complicações e redução da sobrevida do paciente. Considerando a necessidade de conhecer melhor esta problemática e os sujeitos que a envolvem, buscando suprimir particularidades individuais e características comuns coletivas relacionadas aos cuidados farmacêuticos facultados a pessoas vivendo com HIV/AIDS foi proposto a todos os participantes implicados neste processo uma construção de um Plano Operativo (PO) como atividade pedagógica e didática, realizando uma análise situacional dos problemas a fim de criar ações e mudanças de condutas para suavizar ou solucionar as dificuldades existentes. O cuidado farmacêutico envolve educação e promoção à saúde, educação continuada, promoção do uso racional de medicamentos, atividades assistenciais e clínicas tanto individuais quanto coletivas. O objetivo dessa pesquisa foi relatar a experiência da construção do PO como estratégia de melhoria para o cuidado farmacêutico ofertado às pessoas vivendo com HIV/AIDS em um serviço especializado. O presente trabalho é resultante de uma pesquisa do curso de Especialização de Gestão de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde, com intuito de melhorar os serviços farmacêuticos. É um estudo de caso com metodologia quantitativa e qualitativa, de abordagem avaliativa e observacional. A produção dos dados foram desenvolvidos por meio de reunião, oficina, observação participante e diário de campo para construção de um PO que teve como foco principal avaliar os cuidados farmacêuticos aos pacientes vivendo com HIV/AIDS em um Serviço de Assistência Especializada. O Plano Operativo é fundamentado pelo Planejamento Estratégico Situacional (PES) de Carlos Matus (1993), utilizado para delinear uma análise situacional, averiguando criticamente as dificuldades, viabilizando estratégias e ações para minimizar ou sanar os problemas encontrados, além do monitoramento das mesmas, suscitada por diferentes atores como estratégia de valorização do indivíduo e suas experiências. Matus propõe quatro momentos: explicativo, normativo, estratégico e tático-operacional. O momento explicativo marca o inicio do plano o qual deve ser analisado a situação atual, o hiato existente e o futuro desejado. Distintos sujeitos avaliam a realidade presente da sua prática identificam e selecionam os problemas existentes explicando suas causas e consequências. O momento normativo desenha o que deve ser, defini e direciona operações e ações que conduzam a situação atual (problemática) para uma ideal findando em resultados desejados. O momento estratégico avalia a questão de viabilidade das operações e ações propostas e identifica quem são os seus atores executantes. O tático-operacional é o momento em que as ações tornam-se concretas, há o monitoramento destas com proposições de possíveis mudanças ou ajustes ao longo do processo. O processo de construção do PO delongou-se por 08 meses (agosto/2014 a abril/2015). O desenvolvimento do plano operativo foi facilitado e desencadeado como um dos temas estratégicos no grupo de adesão. A reunião ocorreu no espaço do Centro de Referência Especializado de Assistência Social no período matutino com início às oito horas e término ao meio dia na data de 27 de agosto de 2014. 25 pessoas participaram do primeiro momento (explicativo), dentre estes 18 eram usuários/PVHA, três trabalhadores de saúde do SAE (farmacêutica, enfermeira e assistente social), um gestor da área técnica de DST/AIDS (Secretaria Municipal de Saúde), dois familiares (mães) e um representante de ONG/AIDS (Conselheiro Estadual de Saúde). Nesta reunião houve a identificação dos problemas relacionados aos cuidados farmacêuticos aos soropositivos. A priorização do problema ocorreu por processo de quantificação numérica ao utilizarmos uma escala de zero a quatro, pontuação que variava do menos ao mais relevante, estimada pelos critérios: magnitude (tamanho), transcendência (interesse), vulnerabilidade (fragilidade), urgência (prazo de resolução) e factibilidade (recursos). Após a atribuição das notas o problema que obtivesse maior somatório classificava-se como o de maior prioridade. Em seguida identificamos os descritores, as causas e as consequências convergentes relacionados ao problema priorizado, o que findou por compor uma rede explicativa na forma de espinha de peixe. Os momentos normativo, estratégico e tático-operacional foram desenvolvidos pelo pesquisador do trabalho em outra ocasião a partir das observações do estudo. No momento explicativo os 25 participantes presentes na oficina, fomentaram os diálogos de forma horizontalizada no processo de argumentação para identificação dos problemas relacionados ao foco. Os problemas foram elencados com suas respectivas pontuações de priorizações: 1-Conhecimento insatisfatório dos pacientes a terapia antirretroviral obteve 19 pontos; 2-Pauperização dos pacientes ficou em segundo lugar com 18 pontos; 3-Estigma da doença alcançou 15 pontos. O Momento Normativo foi estabelecido às operações que serão executadas no SAE: acompanhar a adesão do paciente ao tratamento; estimular a participação do paciente no Grupo de Adesão; e ações que serão desenvolvidas para enfrentar o problema: verificar exames laboratoriais e clínicos; acompanhar mensalmente os pacientes; identificar as principais queixas; estimular o vinculo entre a equipe; estimular autonomia do paciente; estimular o compartilhamento de decisões; realizar educação permanente. O Momento estratégico foi construído mecanismos para viabilizar ações e operações essenciais para que o PO torne-se exequível. Para o problema foco foi realizada a análise estratégica e observou-se que para todas as operações e ações propostas haveria viabilidade de decidir, executar e manter, além de factibilidade de auxilio humano, o que cessaria o déficit existente. Para finalizar o Plano, foi necessário o estabelecimento de indicadores de monitoramento e avaliação para o acompanhamento de sua execução à medida que for sendo colocado em prática. Os indicadores elaborados para o plano operativo foram: percentual de pacientes que retiraram os medicamentos/mês: 88,88%; percentual de pacientes ativos no grupo de adesão: 17,64%; percentual de pacientes que comparecem as consultas clínicas: 90,90%; percentual de evolução do atendimento interdisciplinar e/ou farmacêutico: 81,81%. Neste momento foram inseridas outras competências cuja equipe interdisciplinar encarregou-se de executar e acompanhar as ações propostas, tornando-se o ator principal. Facilitar a compreensão da doença ou da terapia medicamentosa, com modelo participativo, é um processo interativo com base em estratégias de comunicação que ajuda a pessoa/paciente a refletir e obter tomadas de decisões. Essa pesquisa adotou práticas libertadoras de Paulo Freire, na qual ambos os sujeitos envolvidos, profissional de saúde, usuário, familiar, gestor e conselheiro de saúde, tentaram não somente desvelar a realidade vivida, mas criticamente conhecê-la e recriá-la. Ambos tornaram-se sujeitos do processo crescendo juntos não havendo mais argumentos de autoridades. Fomentou-se uma educação que possibilitou o usuário a uma discussão corajosa de sua problemática e realidade. Jamais conseguiríamos fora do diálogo permanente. O compartilhamento de conhecimento é considerado um elemento inseparável da participação social trazendo como sustentabilidade aos cidadãos o direito de participar ativamente em todas as instâncias da sociedade em que estão inseridos. O monitoramento e avaliação das ações executadas nesta pesquisa revelaram-nos excelentes resultados, revelando um bom percentual na retirada de medicamentos e no comparecimento das consultas clínicas demonstrou uma boa adesão dos pacientes. O atendimento e o cuidado interdisciplinar foram desenvolvidos com êxito pela equipe. Considerações finais O plano operativo não foi meramente uma ferramenta técnica, mas promoveu uma mudança operativa e social a todos os participantes envolvidos no processo avaliativo, construtivo e de implementação de ações. A experiência provocou uma satisfação para os usuários e para a equipe de saúde que permeou na história, nas expectativas, na solução dos problemas e nos novos desempenhos e atividades implantadas no serviço especializado e seus respectivos monitoramentos.        

Palavras-chave


PARTICIPAÇÃO SOCIAL, AIDS, PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO

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