Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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CONSIDERAÇÕES ACERCA DE EXPERIÊNCIA DE INTERCÂMBIO DO PERCURSO FORMATIVO DA REDE DE ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL
Willian Pereira da Silva

Última alteração: 2015-11-03

Resumo


Este trabalho visa apresentar os reflexos e impactos de experiência resultante de um intercâmbio integrante do percurso formativo em saúde mental infanto-juvenil, onde houve trocas de experiências entre profissionais de uma rede preceptora da cidade de Recife, Pernambuco, e de uma rede em formação do município de Ipatinga, Minas Gerais. O percurso formativo tem sido uma estratégia encabeçada pelo Ministério da Saúde e que visa à formação em ato de profissionais que atuam na rede de atenção em saúde mental, facilitando espaços de diálogos entre as práxis; ademais, objetiva a ampliação de conhecimentos e embasamentos dos profissionais e de suas estratégias no cuidado em saúde. Sabe-se que o cuidado em saúde mental deve ser amparado por um constante embasamento que orienta as práticas de acordo com as políticas públicas e diretrizes norteadoras, implicando num contínuo processo de formação e inovação. Dessa forma, estas experiências permitiram uma troca e uma provocação dos profissionais, a partir da convivência com realidades outras, possíveis a partir do encontro; também dinamizaram e engrenaram movimentos nas redes. A cidade de Ipatinga está localizada no interior de Minas Gerais, a 210 km de Belo Horizonte, em Minas Gerais. A cidade possui cerca de 240.000 habitantes.  Há ali um CAPS-II, em exercício desde o ano de 2004, sendo necessária a inventividade para o seu funcionamento. A situação do município sinaliza ainda para a falta de um CAPS- AD. O CAPS-i também é necessário para a efetivação dos dispositivos de serviços de saúde mental em nossa cidade. Mas cabe salientar que, apesar disso, redes tem se efetivado, já que estas se constituem e se sustentam por pessoas e não somente por dispositivos. Assim, há no município um Núcleo Infantil de Saúde Mental, com uma equipe técnica que atende os casos emergenciais (graves e moderados) em saúde mental infantil. As demandas de saúde mental em álcool e outras drogas tendem a ser acolhidas e assistidas pelo CAPS e pelo Núcleo e também por toda a rede. Vale ressaltar ainda uma singularidade do desenho de nossa rede que consiste num investimento e fortalecimento da assistência em saúde mental na atenção básica, acreditando que toda a rede deve estar empenhada. Em cada território, no âmbito de uma unidade de saúde, conta-se com a figura de um técnico de referência em saúde mental que se incube do acompanhamento e da gestão do caso, em especial os moderados e graves de saúde mental, sem deixar de acolher os demais casos. Acolhimentos, atendimentos individuais, visitas domiciliares, discussão de casos em matriciamento, grupos de ressocialização, articulação da rede, atendimentos a familiares, articulação com práticas de estágio, construção do caso em equipe são algumas das atividades propulsionadas por tal técnico. A ação intersetorial é objetivada, articulando-se com diversos serviços de vários dispositivos: Consultório na Rua, Academia da Saúde, Núcleo de Apoio à Saúde da Família, CENTROP e Projeto Videiras (dispositivos específicos à população de Rua), CRAS, CREAS, Conselho Tutelar, Judiciário, dentre outros. Recife é uma cidade com cerca de 1.700.000 habitantes. Conta com uma complexa rede de serviços em saúde pública. A capital pernambucana conta com diversos dispositivos de saúde mental, sendo 17 CAPS (dentre de Álcool e outras Drogas, Transtorno Mental e Infanto-juvenil), 4 unidades de acolhimento articuladas com CAPS, 23 residências terapêuticas, 10 ambulatórios, 6 equipes de consultórios de rua e 2 equipes de consultório na rua, 8 leitos de desintoxicação, 24 leitos integrais. Pese todo movimento de desinstitucionalização, nota-se ainda na cidade a existência de leitos psiquiátricos, como no Ulisses Pernambucano; nota-se também um imenso esforço da rede, com profissionais empenhados e capacitados, em fazer valer a reforma psiquiátrica. Cabe sublinhar ainda práticas impares desenvolvidas em Recife tais como a de redução de danos através de Consultórios de Ruas, que promovem atenção a pessoas em situação de rua em uso de álcool e outras drogas e que, como um ponto da rede, se articula ao CAPS. Ademais, há um movimento singular na rede de saúde mental focada na integralidade da atenção a crianças, em especial àquelas diagnosticadas com autismo. Há práticas grupais desenvolvidas com tais pacientes, que apontam para uma eficácia e uma atenção mais potencializada e humana, focada tanto no atendimento dos pais como das crianças. A partir da interface destas duas realidades, podemos destacar avanços e desafios que se apresentam às redes de atenção em saúde mental, dentre eles: -  o empoderamento e articulação da rede de atenção em saúde mental, em todos os seus pontos e em especial na atenção básica, levando em conta a territorialidade do cuidado. Isso instiga os diversos atores na responsabilização do cuidado, atentando-os para um enfoque em saúde mental que não passa pela centralização ou pela especialização, mas que se concentre na rede. Tal é a proposta de uma clínica ampliada e das ações desenvolvidas no território do sujeito foco de nossa atenção. A configuração do Programa de Saúde Mental de Ipatinga tem perseguido tal norte ao apostar na figura de uma referência técnica em saúde mental na atenção básica como estimuladora, facilitadora e articuladora de ações. Em Recife, há todo o movimento para o fortalecimento da saúde mental na atenção básica, desconstruindo práticas isoladas e ambulatoriais e promovendo uma maior comunicação entre os dispositivos da atenção básica e outros dispositivos; entretanto, é necessário todo um movimento e construção, e até a própria dimensão do território de uma grande capital deve ser levado em consideração; - a integralidade do cuidado pressupõe um enfoque no sujeito em todas as suas dimensões, promovendo ações que visam à transversalidade do cuidado, uma atenção humanizada e construção do caso clínico pelos diversos agentes ali implicados, inclusive o próprio paciente. Em Recife, tal enfoque pode ser observado pelo via da atenção aos casos de crianças com autismo dentro dos dispositivos de saúde mental, na qual a ação articulada dos técnicos não tendia a uma verticalização, mas numa horizontalidade do cuidado, contribuindo cada profissional com seus saber fazer. Neste sentido, também alguns atravessamentos não se fazem tão gritantes, tis como a medicalização e a patologização no cuidado e na condução do caso. Não se observou esta hegemonia de um saber sobre outro, participando, por exemplo, todos nas conduções de grupos terapêuticos, inclusive médicos. Em Ipatinga, busca-se esta integralidade do cuidado, mas há certas dificuldades  no manejo com alguns profissionais que tendem a práticas verticalizadas; mas há também ganhos, frutos de ações de tantos profissionais que buscam a mobilização da rede, pese furos e faltas, promovendo uma dinâmica e vivacidade da mesma. O matriciamento tem se constituído num importante instrumento que favorece tal dinâmica e favorece uma melhor tecnologia no cuidado. A guisa de conclusão, tal experiência promoveu uma instigação e provocação dos profissionais nela envolvidos, favorecendo a engrenagem de seus serviços; em efeito, a abertura e o encontro são chaves fundamentais para a ação em saúde mental, campo em que se preza por uma inventividade e movimentação constante. Práticas devem ser construídas, inventadas e reinventadas.

Palavras-chave


saúde mental; percurso formativo; inventividade nas práticas