Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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COORDENANDO A SAÚDE MENTAL INFANTIL DA/NA/PARA A COMUNIDADE: EXPERIÊNCIA DE UM GRUPO BRINCANTE
Antonio Carlos Cremasco, Andre eduardo Mei, Gislaine Anacleto, Emelice pereira prado, Juliana Chiorlin, Pollyana silva, Livia morais, raphael Valentino

Última alteração: 2015-11-23

Resumo


APRESENTAÇÃO: Este relato traz a experiência da coordenação do cuidado ao sofrimento mental da criança e do adolescente a partir da Atenção Primária em Saúde (APS) e suas articulações – entre centros de saúde (CS) e destes com a comunidade, com o serviço especializado e com a rede intersetorial. DESENVOLVIMENTO: A partir da demanda reprimida de saúde mental infantil – em especial casos sem indicação de um transtorno ou maior complexidade clínica, como apatia, irritabilidade, casos de enurese, agressividade - em três CS de um mesmo distrito sanitário da cidade de Campinas, um grupo condutor é formado por profissionais das equipes de saúde da família identificados com a referida linha de cuidado, um terapeuta ocupacional atuante nos três CS em questão, três trabalhadoras do CAPSi e um apoiador institucional em saúde mental, com a missão de estruturar um cuidado possível. O grupo então promove algumas reuniões no centro de saúde para propor desenhos operacionais e discutir a temática do sofrimento na infância. Opta-se por estruturar um grupo comunitário de livre brincar com finalidade de avaliar, realizar seguimento dos casos leves e facilitar a referência e contra-referência com o CAPSi para os casos mais complexos. Articulou-se na comunidade a utilização do espaço físico de um salão paroquial, e doações dos funcionários dos centros de saúde compuseram o baú de brinquedos utilizados. As articulações intersetoriais se deram em uma das escolas do território (que atende a uma das microáreas mais vulneráveis da região e acompanha a maioria dos casos encaminhados), onde o projeto foi apresentado para estreitar os laços e facilitar a liberação dos alunos no horário do grupo; na reunião de rede intersetorial sediada no CRAS local e composta por representantes da saúde, educação e assistência; ainda, em serviço especializado da assistência social responsável pelo acompanhamento de algumas famílias das crianças indicadas para o grupo. O grupo então estrutura-se com a participação de referências fixas, sendo: o terapeuta ocupacional atuante nos três centros de saúde, a terapeuta ocupacional do CAPSi, e uma profissional do PSF de cada um dos três centros de saúde, respectivamente: uma auxiliar de enfermagem, uma agente comunitária de saúde e uma auxiliar de saúde bucal. Trata-se de um grupo permanente, que acolhe crianças  e adolescentes preferencialmente entre 5 e 15 anos de idade, de ambos os sexos e das áreas de abrangência dos três CS envolvidos; o número de encontros indicado para cada criança varia conforme a singularidade de cada caso; os pais e responsáveis são acolhidos à livre demanda por uma das referências. Os encaminhamentos são feitos mediante discussão nas equipes de PSF, nas reuniões de rede intersetorial ou ainda contra-referenciados do CAPSi. Os encontros possuem 1h30 de duração, onde acolhem-se as crianças novas, promove-se o brincar livre, com estimulação de projetos coletivos e cooperativos. No caso de diversas brincadeiras ocorrerem ao mesmo tempo, as referências se dividem para que cada núcleo brincante possa ter o suporte de um coordenador, ao passo que uma das referências também consiga estar livre para uma eventual atenção individualizada que surja como necessidade. O grupo finaliza-se com um lanche coletivo e as referências reúnem-se para discutir o encontro e os casos dos participantes, afinando o projeto terapêutico e outros encaminhamentos possíveis – consultas da equipe de PSF, consultas individuais de terapia ocupacional no CS, consultas de psiquiatria no CS, seguimento no CAPSi, entre outros - quando necessários. Posteriormente, os profissionais coordenadores promovem o retorno da evolução do grupo e dos participantes às suas respectivas equipes e nos espaços intersetoriais de construção do cuidado. RESULTADOS: Observou-se que o território como eixo transversal e estruturante contribuiu para facilitar o sentimento de identificação entre as crianças e delas com o coletivo formado (batizado com o nome de “grupo da amizade” pelas crianças e adolescentes participantes). O matriciamento em saúde mental conduzido pelos profissionais da terapia ocupacional (dos CS e do CAPSi), em parceria com os demais profissionais do PSF, pôde promover o brincar livre, cooperativo e inclusivo. Tal iniciativa auxiliou no fortalecimento das habilidades psicossociais das crianças, como a lida com afetos e eventos estressores – tais como frustração, rejeição, falta de proteção, medo, tristeza, entre outros - o estímulo à comunicação não agressiva e a qualificação das relações interpessoais. Ainda, trouxe impacto na vida ocupacional, através do enriquecimento do cotidiano e das novas formas de desempenhar o brincar. Esse movimento constituiu-se num processo sólido de mudança e evolução, sentido invariavelmente não apenas no contexto do grupo, mas também no ambiente familiar, escolar e comunitário, relatado através da reavaliação dos casos com os responsáveis, com as equipes de PSF e dos outros atores componentes da rede intersetorial. A coordenação do cuidado também foi avaliada pelos profissionais envolvidos como adequada e resolutiva, uma vez que os outros encaminhamentos pensados a partir do grupo conseguiram se efetivar no cotidiano da construção da integralidade, inclusive as referências ao CAPSi e outros equipamentos da rede. Ainda, os profissionais direta e indiretamente envolvidos puderam realizar troca de saberes ao longo do processo, seja na discussão dos casos ou na própria condução das atividades no desenvolvimento dos encontros, de modo a ampliar seu aprendizado e avançar na busca pela integralidade das ações em saúde. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Considera-se a experiência exitosa em seu propósito, pois além de obter sucesso na coordenação do cuidado com resolutividade, se fez promovendo o protagonismo da comunidade e invertendo a lógica medicalizante e privada. Inverteu-se a lógica medicalizante ao despatologizar o comportamento desviante e tratar os desconfortos da vida no contexto da vida, ou seja, na comunidade e não dentro dos muros da instituição. Inverteu-se a lógica privada, por sua vez, ao enfrentar o sofrimento percebido (e muitas vezes originado) na vida público-coletiva no âmbito coletivo e não no âmbito da consulta especializada individual. Destaca-se também o êxito da coordenação do cuidado pela APS a despeito de desafios como a escassez de recursos (infra-estrutura, recursos terapêuticos) e a complexidade dos arranjos e articulações entre os centros de saúde e destes com o CAPSi, com outros atores da rede intersetorial e com o território vivo e usado e seus atores.

Palavras-chave


Grupo Brincante