Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Ativando a interdisciplinaridade: relato de experiência sobre a construção dos módulos no curso de medicina da UEMS
Iane Franceschet de Sousa, Socorro Socorro Andrade de Lima Pompilio, Mirella Ferreira da Cunha Santos, Edneia Edneia Albino Nunes Cerchiari

Última alteração: 2015-11-12

Resumo


INTRODUÇÃO: O curso de Medicina da UEMS foi concebido a partir de quatro pilares fundamentais: (1) uso de metodologias ativas, entre elas a aprendizagem baseada em problemas e a problematização, na qual a educação modifica sua forma “bancária”, assumindo outras perspectivas; (2) educação orientada para a comunidade, cujo enfoque é desenvolver atividades comprometidas com a saúde para todos, através das relações entre a universidade, os serviços de saúde e a comunidade; (3) diversificação de cenários de aprendizagem, com a vivência de situações reais nos serviços de saúde, viabilizando um profícuo diálogo entre teoria e prática; (4) educação centrada no acadêmico, o qual deve ter total responsabilidade pelo seu autoaprendizado, apoiado pelo professor. As DCNs para os cursos de Medicina apontam essas estratégias para a organização curricular, como fundamentais para a construção do Projeto Político Pedagógico. De fato, essas premissas deveriam fazer parte de todos os currículos dos cursos da área da saúde, as quais são compatíveis com as crescentes demandas pautadas pela conjuntura contemporânea. Observa-se, acima de tudo, que a mudança do paradigma da educação médica vem se tornando um pré-requisito para elevar o nível de saúde das comunidades. Essa necessidade de resgatar a integridade do conhecimento leva a novas abordagens, retomando-se a discussão em torno da interdisciplinaridade, a qual pode ser entendida como uma condição fundamental do ensino e da pesquisa na sociedade atual.  O professor interdisciplinar é aquele que caminha na fronteira entre o seu fazer e o fazer do outro, proporcionando o compartilhamento; o diálogo; buscando incessantemente às transformações na educação. Portanto, o perfil do docente que atua nesse novo paradigma de formação médica valoriza a interdisciplinaridade. De fato, não se pode exigir que a universidade promova a formação de profissionais que trabalhem de forma interdisciplinar se não souber criar um clima interdisciplinar no seu interior, entre docentes e funcionários. Esse trabalho pretende relatar a experiência vivenciada no Curso de Medicina da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), durante a construção dos módulos interdisciplinares do primeiro ano, enfatizando o trabalho interdisciplinar da equipe de docentes nesse processo. DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA: O curso de Medicina da UEMS iniciou a primeira turma em março de 2015. A construção do primeiro ano do curso ocorreu de janeiro a novembro de 2015 e foi executada pela própria equipe de docentes, com apoio técnico-pedagógico de consultoria externa. A carga-horária de trabalho para a construção dos módulos interdisciplinares totalizou 312 horas. A equipe de criação contou com 17 docentes das áreas de Medicina, Enfermagem, Psicologia, Fonoaudiologia, Biologia, Farmácia e Química. Essa ampla gama de profissionais foi fundamental para que o caráter interdisciplinar nos módulos fosse valorizado. Dois desses docentes auxiliaram na criação do Projeto Pedagógico do Curso, juntamente com outros oito, os quais conceberam as premissas teórico-metodológicas para o curso de Medicina da UEMS. Como eixos estruturantes do curso estão os módulos interdisciplinares ou temáticos, possibilitando aos acadêmicos o aporte teórico das Ciências Médicas. Os módulos longitudinais servem de alicerce teórico-prático, através das atividades em diversos cenários. RESULTADOS E/OU IMPACTOS: os efeitos percebidos decorrentes da experiência As atividades do primeiro ano do curso de Medicina da UEMS estão distribuídas em cinco modalidades: (1) sessões tutoriais: são atividades desenvolvidas em pequenos grupos de até oito acadêmicos, conduzidas pelo tutor docente, através da Aprendizagem Baseada em Problemas; (2) atenção à saúde individual e coletiva: contempla atividades desenvolvidas em ambientes reais da comunidade e do sistema de saúde (unidades de saúde, hospitais, ambulatórios, etc.) e atividades em ambientes simulados e laboratórios; (3) atividades integradoras para desenvolvimento de competências: compreende atividades de reflexão individual e Tempo de Estudo Autodirigido (TEAD), em horários protegidos na estrutura curricular; (4) atividades complementares: envolve a participação de livre escolha dos acadêmicos em atividades complementares, sob a lógica da flexibilização curricular; (5) estágio eletivo: são módulos intensivos com duração de duas semanas letivas, cujo tema selecionado foi a Saúde Indígena, haja vista que Mato Grosso do Sul possui a segunda maior população indígena aldeada do Brasil. O primeiro ano do curso conta com seis módulos temáticos: Introdução ao Estudo da Medicina, Abrangência de Ações em Saúde, Concepção e Formação do Ser Humano, Metabolismo, Funções Biológicas e Mecanismos de Agressão e Defesa. Na construção de cada módulo temático, a equipe de docentes atuou de forma conjunta e interdisciplinar. A partir da ementa dos módulos, foram construídos os objetivos educacionais, que por sua vez foram elencados dentro da estratégia da ABP, através dos problemas e palestras. Os módulos longitudinais também foram produzidos em conjunto pelos docentes, que são: Interação Ensino Serviço e Comunidade (IESC), Iniciação e Fundamentos Científicos (IFC), Habilidades de Comunicação, Liderança e Gestão (HCLG), Habilidades Médicas (HM) e Suporte de Aprendizagem Multidisciplinar (SAM). Os diversos olhares possibilitaram a riqueza dos enfoques de conteúdos, sobretudo em relação à incorporação da concepção ampliada de saúde com ênfase na integralidade e no cuidado no processo de formação profissional, bem como a aprendizagem para o trabalho em equipe multiprofissional. Os docentes, durante a construção dos módulos, demonstraram atitude de reciprocidade que impeliu à troca, ao diálogo com pares idênticos, com pares anônimos ou consigo mesmo; atitude de humildade diante da limitação do próprio saber; atitude de perplexidade ante a possibilidade de desvendar novos saberes; atitude de desafio diante do novo, desafio de redimensionar o velho; atitude de envolvimento e comprometimento com os projetos e pessoas neles implicados; atitude de responsabilidade, mas, sobretudo, de alegria, revelação, encontro, enfim, de vida. A interdisciplinaridade foi construída no encontro, e a educação só tem sentido no encontro. A educação só tem sentido na “mutualidade”, na relação de reciprocidade, amizade e respeito mútuo. O trabalho interdisciplinar vivenciado exigiu da equipe atitudes adequadas com a prática, através de um olhar diferenciado para o cotidiano, como o trabalho conjunto na busca de soluções. Afinal, a interdisciplinaridade não se ensina nem se aprende, apenas vive-se. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Um dos fatores que levaram ao sucesso na construção do primeiro ano do curso de Medicina da UEMS foi, certamente, a interação e o trabalho interdisciplinar da equipe de docentes. Durante todos os momentos de trabalho em equipe, exigiu-se dos docentes uma postura diferenciada, reflexiva, com uma bagagem cultural e pedagógica importante para organizar um ambiente e um clima de aprendizagem coerentes com a filosofia subjacente a este tipo de proposta curricular. Assim, a construção do curso exigiu do corpo docente um esforço contínuo de superação para a busca do trabalho interdisciplinar, o qual requereu a eliminação de barreiras, tanto entre as disciplinas e áreas de conhecimento, quanto entre as pessoas, implicando em um trabalho coletivo, em um planejamento conjunto e integrado. Na perspectiva de formar para a interdisciplinaridade, o docente deve estar provido de espírito educacional que vai além da simples transmissão de conhecimentos, mas sim de uma educação transformadora, guiadora e facilitadora do conhecimento, onde o estudante é o centro do aprendizado e é dele a responsabilidade pelo mesmo. É fundamental que as Instituições de Ensino Superior criem mecanismos para qualificar seus formadores em práticas integradoras, a fim de que possam incorporar e trabalhar o ensino atrelando a interdisciplinaridade, bem como na capacitação docente em metodologias ativas de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave


Interdisciplinaridade; educação médica, metodologias ativas