Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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AS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS DE SAÚDE E A POLÍTICA DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL DO SUS
Danielli Pin Tonoli, Marina Eulália Vieira do Nascimento, Fabiana Turino, Francis Sodré, Maristela Dalbello-Araújo

Última alteração: 2015-11-02

Resumo


A crise fiscal do Estado teve seu início nos anos 1970 no cenário mundial, porém foi somente na década de 80 que se firmou na América Latina, principalmente no Brasil. A medida de enfrentamento proposta foi a Reforma do Estado que foi idealizada através do Plano Diretor da Reforma Administrativa do Estado (PDRE) criado pelo Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE) em 1995. Com a reforma gerencial o Estado reduz sua função à execução de serviços, passando, dessa forma, a restringir-se a um regulador de serviços. É possível afirmar que a Reformar do Estado serviu para transferir ao setor privado as suas funções sociais, destinando-as ao mercado. Com o neoliberalismo, a política social tomou o rumo da privatização, da focalização, da seletividade e da descentralização.  A saúde foi aberta para o mercado, processo conhecido como o “Desmonte da Saúde Pública”. A partir da descentralização das políticas sociais, a responsabilidade de geri-las foi transferida para o âmbito privado, o que expandiu ainda mais após a formulação do “Programa de Publicização”. Assim, como consequência temos a flexibilização dos contratos de trabalho, e também o desmonte da gestão única do SUS. De posse de um Estado menor, reduzido de suas responsabilidades diretas com os serviços sociais, exercendo o papel de regulador, ele passa a subsidiar as entidades sem fins lucrativos, assim como as empresas públicas não-estatais, representados pelas Organizações Sociais. Na saúde pública interessou-nos sua implantação das Organizações Sociais de Saúde por meio da Lei nº 9.637/98, e dessa forma foram criadas as entidades privadas sem fins lucrativos que tem com o Estado um contrato de gestão e passam a ser responsáveis pelas atividades não-exclusivas do Estado. A saúde pública foi um dos principais alvos desse modelo de gestão. Nesse aspecto, as Organizações Sociais de Saúde (OSS) nos chamou atenção em função de ser um tema recente no Estado do Espírito Santo, sem muitas pesquisas concluídas.  As OSS chegaram tardiamente no estado, em comparação ao nível nacional, mas não perdeu sua relevância por isso. Tendo um processo de expansão intenso. Em cinco anos das OSSs, três hospitais estaduais estão sendo gerenciados por essa forma de administração privada. No primeiro momento do estudo, escolhemos estudar como as organizações sociais foram debatidas pelo conselho estadual de saúde (CES), pelo fato dos CES serem espaços deliberativos e de fundamental importância para o SUS.   Ao tentarmos fazer a busca por produções científicas que contemplassem a temática do trabalho nos deparamos com a inexistência de livros sobre este tema. E ao procurarmos por teses e dissertações no site da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações – BDTD notamos que existem poucas teses e dissertações que abordavam a referida temática.   A partir de uma perspectiva qualitativa, analisamos as atas com a finalidade de encontrarmos como aconteceu a implantação das OSSs no Espírito Santo, e como foram aprovadas as formas de gestão dessas instituições no CES. Definimos que começaríamos pelo ano de 2009, pois foi o primeiro ano de implantação das OSSs no Espírito Santo. No entanto, ao procurarmos no site do CES/ES as atas de 2009 não estavam disponibilizadas. Por este motivo, o corte temporal que escolhemos para começar a análise das atas foi de 2010 a 2015, referente à gestão completa do governo liderado por Renato Casagrande (PSB) e o início do governo de Paulo Hartung (PSDB).   Para direcionar o trabalho de pesquisa nas atas, utilizamos um roteiro guia para auxiliar a leitura desses documentos, esse nos norteou na leitura e na coleta de dados. A partir de então procuramos durante a leitura identificar: os nomes das OSS’s qualificadas no estado, a palavra organização social de saúde (no plural, no singular e na sigla), e os nomes dos três hospitais gerenciados por OSS’s. Analisamos também como as OSs aparecem nas reuniões: como ponto de pauta, inclusão ou informe. Qual seria o contexto que aparecem: se são nas reuniões ordinárias ou extraordinárias, por qual conselheiro foi proposto, se houve votação/deliberação, se houve questionamento ou discordância, se o presidente do CES/ES fez alguma intervenção.   Partindo para a análise dos dados coletados nas atas, percebemos que de 2010 a 2012 o CES/ES se mostrou pouco combativo e questionador, além de adotar uma postura conivente com a secretaria de saúde. Diversas reuniões não tinham quórum, as atas eram pouco descritivas e não traziam muitas informações sobre as reuniões. Nota-se, também, que o fato do Presidente do CES/ES ser o secretário de saúde do estado talvez tenha inibido um enfrentamento maior por parte dos conselheiros. Em muitos momentos o presidente do CES/ES aparentou defender/representar apenas a governo do estado, inclusive com seus discursos a favor da gestão privada. Mostrou-se favorável e até mesmo defendeu o modelo de gestão por Organizações Sociais. Destacamos que os conselheiros representantes dos funcionários são os primeiros a questionarem sobre as OSSs, talvez pelo fato dos profissionais lidarem diretamente com a gestão das OSSs. Tardiamente os conselheiros representantes dos usuários também trouxeram uma série de questionamentos a respeito dos contratos de gestão das entidades, principalmente do Hospital Dr. Jayme dos Santos Neves. Acreditamos que os questionamentos não tenham surgido anteriormente, pelo fato dos usuários não conhecerem sobre o assunto. O tema OSSs nunca apareceu como ponto de pauta nas atas, por diversas vezes somente como inclusão ou informe. Os hospitais gerenciados por OSSs aparecem apenas três vezes como ponto de pauta, dentro de um período de cinco anos em que as OSSs já estavam no Estado. Em diversas reuniões os conselheiros solicitaram que fosse discutido o contrato de gestão dessas empresas, mas não foram acatados. Fizeram perguntas relevantes, mas não foram atendidos. O fato da contratação das OSSs não ter sido discutida e deliberada no CES/ES é inconstitucional, uma vez que é assegurada por lei que o controle social tenha participação direta na política de saúde pública. No entanto, observamos que mesmo com muitos questionamentos, alguns assuntos foram aprovados, ou tinham apenas uma abstenção. Diante da leitura, as OSSs parecem ser privilegiadas pela SESA, uma vez que mesmo com vários cortes em hospitais filantrópicos elas não eram afetadas. Notamos que os conselheiros desconfiam de um possível favorecimento em relação a essas organizações pela SESA. Outro ponto que pudemos observar foi o processo de sucateamento dos hospitais públicos que parece estar ligado intimamente com o aparecimento das organizações, pois o governo deixa o hospital ser esvaído para em seguida entrega-lo a gestão das OSSs. Mas antes de entregá-lo, produz uma reforma do hospital transformando-o numa grande estrutura. Este é um fenômeno que se repete em quase todos os hospitais geridos pelas OSSs no ES. Os conselheiros não têm acesso aos hospitais gerenciados pelas OSSs, e que muitas vezes até o próprio conselho gestor da OSS é excluído de processos relevantes. Vimos que os conselheiros buscam certa autonomia e tentam efetivar e fazer com que seja reconhecida a participação no controle social dentro do SUS, como é garantido por lei. Ressaltamos que as pesquisas sobre os Conselhos Estaduais de Saúde e sobre Organizações Sociais de Saúde, ainda precisam de mais estudos e investigações que apontem como funciona o processo de trabalho na relação público-privado na gestão do Estado, entre outras temáticas quando enfrentadas para assegurar a participação social no SUS.

Palavras-chave


Controle Social; Participação Social; Organização Social

Referências


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