Anais do 12º Congresso Internacional da Rede Unida
Suplemento Revista Saúde em Redes ISSN 2446-4813 v.2 n.1, Suplemento, 2016
PECULIARIDADES DE CADA GÊNERO NAS NECESSIDADES DE INTERVENÇÃO DAS DOENÇAS CRÔNICAS
Eduardo José Cecchin, Luiza Pinto de Macedo Soares, Karla Ferreira Rodrigues, Nevoni Goretti Damo, João Luiz Gurgel Calvet da Silveira, Carlos Roberto de Oliveira Nunes, José Augusto Bach Neto, Gabriela Tessaro Cremoneis
Última alteração: 2015-11-11
Resumo
As doenças crônicas não transmissíveis representam grandes desafios para os atuais sistemas de saúde e para a população atingida. Para a Organização Pan-americana da Saúde as doenças crônicas são responsáveis por 59% dos 56,5 milhões de óbitos anuais e 45,9% do total de enfermidades no mundo. A atenção continuada dos pacientes crônicos, portanto, é de suma importância para se evitar as complicações e exacerbações das patologias, que costumam interferir social e economicamente na vida de seus portadores. A diabetes mellitus (DM), por exemplo, necessita de acompanhamento ininterrupto seja do próprio diabético (autocuidado), seja do sistema de saúde, haja vista a dificuldade de manter as mudanças nos hábitos de vida necessárias ao tratamento. Em se tratando do termo “qualidade de vida” (QV), pode ser definido como a percepção do indivíduo na sua posição no contexto da cultura e sistema de valores em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações. Está relacionada também ao grau de satisfação encontrado na vida familiar, amorosa, social e ambiental e à própria estética existencial. A utilização de instrumentos de avaliação da qualidade de vida permite uma análise mais objetiva e clara do impacto global de doenças crônicas, como a DM, na vida dos pacientes que frequentam as unidades de saúde. Dessa maneira, entender as alterações da QV em usuários portadores de DM pode resultar em melhorias nas intervenções feitas na atenção básica, melhorando assim o tratamento e a resolubilidade do trabalho em relação à doença. O estudo PRÓPET-Saúde, da Universidade Regional de Blumenau (FURB), objetivou avaliar a qualidade de vida de usuários portadores de diabetes mellitus de quatro unidades de atenção básica de Blumenau – SC, através do questionário validado WHOQOL-bref (World Health Organization Quality of Life Bref). A amostra foi de 196 retirada de uma população de 244 usuários, cujas 48 perdas se deveram a não localização dos usuários e a recusa de participação. Foram adotados os níveis de significância de p ≤ 0,05 e de confiança de 95%. O questionário WHOQOL–bref levanta diferentes dimensões de avaliação de qualidade de vida, expressas nos domínios: físico (1), psicológico (2), relações sociais (3), meio ambiente (4) e avaliação geral da qualidade de vida (5), além de um domínio total, relativo a todos os outros cinco domínios. Em seguida, os domínios foram relacionados às categorias: sexo, tabagismo, se usa insulina, se tem parceiro afetivo e se mora sozinho. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Regional de Blumenau em 24 de outubro de 2013 sob o parecer 435.159. Dos entrevistados, 58,2% (n=114) eram do sexo feminino, e 41,8% (n=82) do sexo masculino. A idade média dos participantes foi de 62 anos. Em relação à diabetes, o tempo médio de diagnóstico foi de 11 anos, sendo que 26% faziam uso de insulina, com a média de 5,79 anos de uso. Destaca-se que mais mulheres estudadas (19,9%) relataram não ter parceiro afetivo em relação aos homens (5,2%) e que 15% usam antidepressivos (contra 5% dos homens). Quando analisamos a questão 1 (Q1), que pergunta objetivamente como o usuário avalia a própria qualidade de vida, observamos que os homens se autoavaliam melhor (média de 3,86 para os homens contra 3,61 para as mulheres, sendo p< 0,05). Dentre as dimensões avaliadas, a mais comprometida foi o domínio físico (3,39 ± 0,79). Foi identificado que 26% dos usuários obtiveram pontuação menor que três nesse quesito, classificando-se como “precisam de melhorias” na escala do WHOQOL-bref. Ao observamos a média geral da dimensão, percebemos que a mais negativamente afetada refere-se à “dependência de tratamento médico e uso de medicação” (média 2,97), sendo que as mulheres se autorreferiram significativamente pior que os homens nesse quesito. Destaca-se que 42,1% das mulheres responderam objetivamente que necessitam “bastante” ou “extremamente” de tratamento médico para levar suas vidas diárias. Além disso, as mulheres também obtiveram médias inferiores aos homens em relação à dor e desconforto (Q03), à energia e fadiga (Q10) e à mobilidade (Q15). Em relação à dor, 31,5% das mulheres responderam que a dor física impede “bastante” ou “extremamente” suas atividades diárias, contra 19,5% dos homens. Apenas 16,6% das mulheres relataram que conseguem se locomover “completamente” (contra 32,9% dos homens), sendo que 20,1% das mulheres afirmaram não ter “nenhuma” ou “muito pouca” energia para as atividades do dia a dia, número esse que conflita com 13,4% das respostas masculinas. Em relação ao domínio psicológico, os sentimentos positivos foram aferidos através da Q5 “o quanto você aproveita seu dia?”, sendo que 23% responderam “nada” ou “pouco” e outros 30% responderam “mais ou menos”. Comparando a pergunta entre os gêneros, percebe-se que a mesma questão foi respondida como “nada” ou “pouco” por 29% das mulheres, contra 14,8% dos homens. Destaca-se, também, que em relação aos sentimentos negativos (Q26), 26% das mulheres responderam ter mau humor, desespero, ansiedade e depressão de forma “frequente”, “muito frequente” ou “sempre” durante as duas últimas semanas (os homens atingiram índice de 15% na mesma questão). Além disso, 41% das mulheres aceitam de forma “média”, “muito pouco” ou “nada” sua condição de aparência física, contra 23% dos homens. Em relação ao domínio meio ambiente, a faceta mais acometida foi a de “participação e oportunidade de recreação/lazer”, seguido de “recursos financeiros”. Destaca-se que 32,6% do geral de entrevistados responderam ter “muito pouco” ou “nada” de oportunidade de lazer, sendo que esse número atinge 40% das mulheres e 21% dos homens. Somente 9,6% das mulheres afirmaram ter a oportunidade de atividades recreativas. A questão 23, referente à satisfação com o local onde mora, obteve a maior média geral entre todas as facetas do WHOQOL-bref estudadas. A média 4,15 configura-se como “boa” na escala do WHOQOL e foi atingida, pois 86% dos entrevistados referiram estar “satisfeitos” ou “muito satisfeitos” com o local onde vivem. Não houve diferença significativa entre homens e mulheres nessa questão. Aqueles sob insulinoterapia apresentaram níveis mais baixos de qualidade de vida autorreferida em relação aos demais nos domínios psicológico e de avaliação global. Ser tabagista e morar sozinho não alterou significativamente os resultados. O padrão da amostra sugere que os usuários apresentam nível regular de autoavaliação de qualidade de vida e saúde. O domínio físico foi o mais comprometido, sendo que mais de um quarto dos usuários obtiveram índices muito baixos nesse quesito e, portanto, deve haver um maior esforço interventivo no sentido de melhorar esse indicador, principalmente entre as mulheres. Além disso, sugere-se uma maior atenção psicológica aos usuários sob insulinoterapia, que se autoavaliaram pior que a o resto da amostra. O estudo demonstrou que o grupo feminino tem necessidades e problemas diferentes em relação ao grupo masculino e deve, portanto, sofrer interferências focais específicas por parte de ações de saúde. Ressalta-se a necessidade de ações de cunho psicológico e de reabilitação física às mulheres diabéticas, bem como maiores ações de lazer e recreação, que faltam no local. Além disso, adicionar os temas acima citados aos grupos educativos de diabetes das Unidades pode trazer bons resultados de melhora aos índices de qualidade de vida da população estudada.
Palavras-chave
Diabetes mellitus; mulheres; qualidade de vida; atenção primária à saúde.
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