Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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As Políticas de Educação Permanente em Saúde dos governos Lula: um olhar para o processo político
Manuelle Maria Marques Matias, Ruben Araújo de Mattos

Última alteração: 2015-10-27

Resumo


Este trabalho parte do reconhecimento de que existiram duas políticas de educação permanente em saúde durante os governos Lula, as quais estão ratificadas em dois documentos diferentes: o primeiro através da Portaria nº 198/GM/MS, de fevereiro de 2004 e o segundo através da Portaria nº 1996/GM/MS, de 20 de agosto de 2007. E, ainda que em torno dessas políticas referidas estabeleceu-se a “formação” de dois grupos com características peculiares e práticas divergentes. Nesse sentido pretendemos pôr em questão tais reconhecimentos e apresentar uma narrativa sobre o processo político que supostamente teria dado origem a duas políticas de Educação Permanente em Saúde nos governos Lula. Através de análise dos documentos das políticas, procuraremos buscar os indícios e conexões que se colocam na formação de dois grupos em torno do tema da EPS. Para tanto não desprezaremos os documentos formais já referidos bem como outras produções textuais do período que tenham servido para dar materialidade ou sustentação teórica às duas políticas colocadas, sendo necessário que também façamos análise desses materiais. Essa análise, contudo, terá o intuito de percorrer “indiciariamente” tais documentos afim de “procurar pistas” que possam auxiliar na compreensão dos processos que os constituíram uma vez que consideramos que “os textos são produtos de acordos em vários estágios, frutos de múltiplas influências e agendas” (BALL, 2006). Seguindo os passos de Ginsburg (1989) que construiria o paradigma de um “saber indiciário” colocamo-nos, sem a pretensão de negar a complexidade das questões que se colocam, à procura de pistas ou pequenos indícios nos textos que funcionem como pequenas peças de um quebra-cabeça prestes a ser montado. Assim, em pleno acordo com o autor, procuraremos desnudar os entendimentos que subjazem às escritas de tais produções textuais oficiais e não oficiais. Concretamente falando tratar-se-ia de tentar identificar os conceitos, argumentos ou concepções presentes nos textos de cada um dos grupos referidos e seus esforços estratégicos de afirmação de si e demarcação de diferenças para outrem. Dessa forma é importante não apenas o cotejamento comparativo entre os dois grupos, mas também as formas como cada grupo dispõe sua própria identidade. Também analisaremos o processo político que deu origem às duas políticas. Nesse intuito buscaremos compreender as trajetórias e entendimentos das atrizes e atores que vivenciaram tal processo político. Para tanto propomos ainda a realização de entrevistas com as pessoas que ocupavam os seguintes cargos nos dois períodos que refletem um marco temporal das duas políticas em torno da Educação Permanente em Saúde (2003 a junho de 2005 e junho de 2005 a 2010):Secretário(a) de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde; Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES);Coordenação-Geral de Ações Estratégicas em Educação na Saúde; Coordenação-Geral de Ações Técnicas em Educação na Saúde; Coordenação-Geral de Ações Populares de Educação na Saúde; Departamento de Gestão de Regulação do Trabalho em Saúde (DEGERTS). Dessa forma estimamos a realização de 12 entrevistas. Para a coleta dessas informações será utilizado um roteiro de entrevista semiestruturada com questões abertas que terão o papel central de trazer à tona as trajetórias de engajamento dos sujeitos com a temática em torno da EPS. Tal roteiro terá o intuito de ajudar o entrevistador a conduzir a entrevista, embora, este seja apenas uma ferramenta secundária, tendo em vista que a ideia de entrevista aberta não se prende a nenhum esquema fechado e estável. Os sujeitos da pesquisa serão localizados por informantes-chave da pesquisadora e previamente contatados por telefone ou através de correio eletrônico a fim de marcarem melhor dia, horário e local para a realização da entrevista, caso desejem participar do estudo. Na ocasião será apresentado e entregue a cada um dos sujeitos um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), em duas vias, sendo que uma ficará com o sujeito do estudo e outra será arquivada pela pesquisadora, a qual os participantes assinarão no momento em que será apresentado o objetivo do trabalho e ressaltada a importância que representará a colaboração deste para a sociedade. Tal procedimento será realizado a fim de garantir a liberdade dos sujeitos para participarem ou não da pesquisa, a possibilidade de se afastar da investigação no momento em que desejarem sem que isto lhe traga prejuízo. Por se tratarem de pessoas que exerceram função pública na ocupação de cargos da gestão federal ou que participaram de espaços públicos trabalharemos com a possibilidade do não anonimato, a depender da autorização do sujeito. Nosso intuito é o de percorrer as trajetórias desses sujeitos através de seus relatos a fim de tentar compor uma narrativa crítica acerca dos processos e trazer à tona os embates, tensões, contradições, vivenciados àquela ocasião e que em grande medida foram responsáveis por inúmeros desfechos no campo da formação.  Sendo um trabalho de análise de políticas, o presente trabalho poderá contribuir para ofertar narrativas interessantes que podem ajudar a compreender o processo político que subjaz a formulação de uma política pública, podendo contribuir para os diversos atores envolvidos. A compreensão do processo político em torno das políticas de educação permanente em saúde por sua vez é importante porque pode trazer reflexões importantes sobre os desdobramentos das políticas no campo da formação. A narrativa crítica que queremos compor é diferente das narrativas dos sujeitos e parte de outro ponto de observação, não neutro e reconhecidamente implicado com o processo, mas que por outro lado mantém forte compromisso com a busca incessante da  objetividade já referida anteriormente. Temos em conta os desafios que se põem nesse sentido, uma vez que não consideramos possível uma redescrição exata dos acontecimentos de outrora. O próprio ato de ser entrevistado provoca reflexão através da reconstrução de fatos e memórias pelos sujeitos, que criam por vezes outras análises e leituras diferentes das que faziam quando do momento vivenciado. Por outro lado, aceitamos o desafio que está posto e tomamos o protagonismo na reconstrução desses fatos e na composição de outra história a partir das diferentes histórias. Não temos, contudo, a pretensão de chegar à verdade ou de construir a melhor narrativa, mas se há alguma certeza que nos move é a de que o caminho a ser trilhado indubitavelmente será único.

Palavras-chave


políticas, educação permanente, sistema único de saúde

Referências


BALL, SJ. O que é política? Textos, trajetórias e caixas de ferramentas. [Título original: What is policy? Texts, trajectories and toolboxes]. In: BALL, S. J. (Ed.). Education Reform: a critical and post-structural approach. Traduzido por: Joice Elias Costa, 2006. cap. 2, p.14-27.

GINZBURG, C. Mitos, emblemas e sinais: morfologia e história. 1° Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, pp. 143-179.