Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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(NÃO) PARTICIPAÇÃO SOCIAL NOS CONSELHOS DE SAÚDE E A CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NA SAÚDE DA FAMÍLIA
MARLON VINICIUS GAMA ALMEIDA, MARLUCE MARIA ARAUJO ASSIS

Última alteração: 2015-11-02

Resumo


APRESENTAÇÃO: as lutas e movimentos sociais ocorridos durante os anos 80 e 90 do século XX na América Latina trouxeram para a agenda das políticas públicas brasileiras a luta por diversos direitos. No Brasil, essa luta se refletiu na elaboração da Constituição Federal de 1988, que valoriza a cidadania como responsabilidade pública, abrindo espaço para novas relações entre direitos humanos e desenvolvimento social, reafirmando a participação da sociedade como um privilégio do ser humano e a cidadania como pré-requisito para outras conquistas. O Sistema Único de Saúde (SUS), política pública de saúde brasileira, aprovada na referida Constituição e as críticas ao modelo de atenção à saúde vigente - voltado para o processo de adoecimento e cura -, ampliaram a busca por melhorias que permitissem atender eficazmente aos anseios da população, no sentido de dar resolubilidade aos problemas e demandas dos usuários nos diferentes níveis de densidades tecnológicas que compõem o sistema de saúde. No entanto, as mudanças alcançadas com a ampliação e integração das redes ainda não se refletem no acesso efetivo dos usuários aos serviços de saúde. A participação social é entendida como um espaço de representação da sociedade, no qual se articulam diferentes sujeitos, com suas diversas representações: movimentos populares, entidades de classe, governo, prestadores de serviço, entre outros, e uma população com suas necessidades e interesses que envolvem o indivíduo, família e grupos da comunidade (ASSIS; VILLA; NASCIMENTO, 2003). As formas de efetivação da participação social na organização do SUS são representadas pelos conselhos e conferências de saúde. Estas instâncias protagonizam a inserção da comunidade na gestão do sistema, como um processo de articulação entre atores sociais que têm olhares distintos sobre a realidade, nem sempre harmônicos, em que as disputas de poder, de conflitos e de negociação estão presentes. A Saúde da Família, cenário da presente pesquisa, ao aproximar das pessoas as práticas de prevenção de doenças e agravos e de promoção da saúde, penetra no interior das comunidades e famílias com uma proposta de reordenamento das práticas profissionais e serviços de saúde, ao mesmo tempo em que se propõe a deslocar o foco da doença, descentralizar o poder e incentivar a participação de todos os envolvidos e a construção da cidadania. Neste contexto, o presente estudo tem por objetivo analisar o processo de participação social nos Conselhos de Saúde e a construção da cidadania nos diferentes olhares dos dirigentes do SUS municipal, equipe de saúde e usuários da Estratégia de Saúde da Família em dois municípios da Bahia, Brasil. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: o estudo baseia-se no modelo teórico desenvolvido por Assis e Abreu-de-Jesus (2012), que analisam as dimensões políticas, econômico-sociais, técnicas, organizativas e simbólicas em relação ao acesso aos serviços e práticas de saúde.  Busca-se compreender as políticas formuladas e sua execução, envolvendo a gestão com tomada de decisão e participação da sociedade, além das práticas operadas no dia a dia dos serviços de saúde: como os serviços se organizam; como os trabalhadores atuam e as subjetividades que transversalizam essas relações, com seus componentes simbólicos e representacionais no atendimento às necessidades dos usuários do SUS. Assim, a pesquisa, de abordagem qualitativa, teve o número de entrevistados definidos por inclusão progressiva, interrompida pelo critério de saturação. Foram entrevistadas 102 pessoas em dois municípios da Bahia, Brasil: grupo I (equipe de saúde - 49); grupo II (usuários da Saúde da Família - 37) e grupo III (dirigentes do SUS municipal - 16). Técnicas de coleta de dados: entrevista semi-estruturada e observação sistemática. MÉTODO DE ANÁLISE: análise de conteúdo temática e fluxograma analisador. RESULTADOS E/OU IMPACTOS: o estudo revela que, os Conselhos de Saúde ainda não se constituíram em espaço político democrático e potencializador da cidadania. Identificaram-se acomodações e desgastes por parte dos trabalhadores e desconhecimento da população sobre as formas de participação asseguradas em lei. O processo da (não) participação social, a luz das dimensões política e simbólica apontadas por Assis e Abreu-de-Jesus (2012), demarca uma série de demandas individuais, pontuais e que requerem soluções focalizadas ou quando existe alguma moeda de troca dos serviços que possam compensar a atenção dispensada, como lanches e brindes. Tais aspectos limitam-se, no entanto, primeiramente, pela incipiência dos Conselhos de Saúde e pela falta de confiabilidade em seu papel na solução dos problemas apresentados dentro do sistema público de saúde, com ênfase na Saúde da Família. Se por um lado conhece-se o espaço da participação social como eficaz na escuta e acolhimento das demandas por práticas profissionais, por outro, a sua baixa visibilidade e a falta de representação da realidade das comunidades, diminuem o seu crédito e eficácia dos serviços. As reuniões ocorridas no Conselho Municipal de Saúde, não representam o cenário das demandas da sociedade e os setores da saúde, sendo vistas, muitas vezes, como uma obrigatoriedade. Esta obrigatoriedade pode estar associada à questão de dever de participação, que perfaz o sujeito político dentro de uma sociedade, ao tempo em que, revela o quão frágil é o reconhecimento que muitas pessoas têm sobre o que é ser cidadão e sobre o que seja cidadania, cruciais na construção do controle social. Neste contexto, a falta desta visibilidade talvez seja a razão da sociedade preferir a comunicação através de rádios quando precisa dar vazão as suas queixas, já que parece acreditar que este organismo tenha um alcance maior na resolução de seus problemas. Na construção do direito à comunicação e informação em saúde, que envolve também, o direito à cidadania, o papel dos meios informativos, sobretudo os comunitários, potencializa a participação direta do cidadão na esfera pública. Se comparados com os grandes meios de comunicação social, as difusoras de rádio locais estão mais facilmente ao alcance do povo, uma vez que se situam no ambiente em que as pessoas vivem, conhecem a sua localização e, portanto, podem se aproximar com maior simplicidade, como os estudos de Peruzzo (2004), podem corroborar. CONSIDERAÇÕES FINAIS: os usuários e famílias precisam ser resgatados como sujeitos da mudança nos serviços de saúde, assim como em fóruns de deliberação coletiva, tais como as Conferências e Conselhos de Saúde. O fortalecimento da participação cidadã pode despertar para uma nova fase na construção da Saúde da Família, que de fato, esteja voltada para as necessidades da população. 

Palavras-chave


participação social; cidadania; saúde da família.

Referências


ASSIS, M. M. A.; VILLA, T. C. S.; NASCIMENTO, M. A. A. Acesso aos serviços de saúde: uma possibilidade a ser construída na prática. Ciência & Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, v. 8, p. 815-23, 2003.

ASSIS, M. M. A.; ABREU-DE-JESUS, W. L. Acesso aos serviços de saúde: abordagens, conceitos, políticas e modelo de análise. Ciência & Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, v. 17, n. 11, p. 2865-75, 2012.

PERUZZO, C. M. K. Comunicação nos movimentos populares: a participação na construção da cidadania. 3a ed. Petrópolis: Vozes, 2004.