Tamanho da fonte:
A Vigilância em Saúde e do Trabalhador: a problemática do uso de agrotóxicos na fumicultura
Última alteração: 2015-11-23
Resumo
APRESENTAÇÃO: A utilização de múltiplas classes de agrotóxicos nos mais diferentes tipos de sistemas produtivos no Brasil tem trazidos graves problemas para a saúde pública e ambiental. Quando os agricultores utilizam o sistema de produção familiar, as implicações são ainda mais preocupantes, devido a permanente exposição de mais de um membro da família em todo o processo produtivo, do cultivo a colheita incluindo a armazenagem. A produção do tabaco tem sido amplamente estudada nos mais diferentes campos do conhecimento, desde o melhoramento genético até as questões econômicas que envolvem o processo. No entanto, pouco se avançou no sentido de uma produção mais sustentável em termos sociais, ambientais e de segurança com a saúde do trabalhador. No que corresponde ao campo da saúde, as intoxicações por agrotóxicos são situações emergenciais, que demandam ações de vigilância epidemiológica e sanitária, em seus âmbitos de atuação. Este trabalho tem como objetivo conhecer as ações realizadas pela Vigilância em Saúde do Trabalhador quanto ao uso de agrotóxicos pela população rural produtora de tabaco. DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: Trata-se de um estudo qualitativo do tipo exploratório. A seleção de três municípios foi intencional para analisar os objetivos da Pesquisa. Foram selecionadas três microrregiões com maior expressão na produção de fumo em toneladas e, a partir delas, foram selecionados três municípios, com significativa produtividade em cada região. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os gestores das Secretarias Municipais de Saúde e com gestores/profissionais que atuam na saúde do trabalhador nos Municípios em estudo, no período de 2014. A análise dos dados está em andamento e procede a partir do referencial categorização temática proposta por Minayo. A categorização foi realizada com a ajuda do software NVivo8. A presente análise insere-se em um estudo maior que possui uma etapa qualitativa e outra quantitativa, intitulado: Impactos do Cultivo do Tabaco na saúde do trabalhador e na qualidade do solo e da água em propriedades dos municípios da “Metade Sul” do Rio Grande do Sul. A pesquisa é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) chamada FAPERGS/MS/CNPq/SESRS n. 002/2013. Em relação às considerações éticas, o presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em março de 2014, sob Parecer nº 555.912. RESULTADOS: As ações realizadas pela Vigilância em Saúde dos Municípios ainda estão concentradas na sensibilização dos profissionais sobre a notificação de casos suspeitos de intoxicação por agrotóxicos. Os principais notificadores nestes casos são os profissionais de saúde dos hospitais e das Unidades Básicas de Saúde, que, segundo os relatos dos entrevistados, a Atenção Básica ainda apresenta grande dificuldade em realizar as notificações. Isto pode estar relacionado com o desconhecimento dos profissionais sobre os sinais e sintomas de casos de intoxicação por estas substâncias, ou a dificuldade em diagnosticar um caso de intoxicação com auxílio de exames laboratoriais. Os Municípios em geral, têm impedimentos financeiros para realizar exames de análises clínicas que identifiquem os casos de intoxicação, mesmo aquelas intoxicações que já são descritas na literatura, como é o caso do marcador biológico chamado cotinina, que avalia a exposição à nicotina, presente na folha verde do tabaco. Nos Municípios em que já houve a realização de exames na tentativa de rastrear possíveis casos de intoxicações, estes se deram em função de pesquisas de cunho científico, realizadas por Universidades ou em parcerias com outras instituições, como o Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST). As atividades da Saúde do Trabalhador disputam espaço, recursos e pessoal com outras atividades existentes nos Municípios. No entanto, em determinadas situações, a vigilância do município precisa atuar, como é o caso de ações motivadas pelo CEREST, grandes empresas envolvidas em casos de denúncias ou ainda situações em que há Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) envolvendo a Vigilância em Saúde. Em relação à Vigilância em Saúde do Trabalhador Rural, há o reconhecimento de que ainda não existem ações específicas voltadas a esta população. E, naquelas situações em que são desenvolvidas ações de vigilância em Saúde do Trabalhador, isto está relacionado aos casos de doenças infecciosas, como a leptospirose, situações em que a Vigilância Epidemiológica e a Ambiental atuam juntas. Em um dos Municípios foram desenvolvidas ações com o caráter de “capacitação” para os trabalhadores rurais em um momento no qual se estabeleceu parceria com o Sindicato de Trabalhadores Rurais e a Coordenadoria Regional de Saúde, focando nos acidentes fatais com máquinas agrícolas e outros equipamentos de trabalho utilizados no meio rural. Além disso, foi relatado que os serviços locais de saúde não estariam capacitados para atender os agricultores que estão permanentemente expostos aos agrotóxicos, tampouco para identificar os riscos à saúde humana e ambiental destas substâncias. Isto tem gerado dificuldades na notificação e na avaliação da situação real das intoxicações. Este fato indica falhas no papel do Estado em oferecer apoio institucional para estes municípios, por meio das Coordenadorias Regionais de Saúde e Secretaria Estadual em Saúde, para que os serviços locais tenham mais condições de atuar no enfrentamento desta problemática. Para agravar a situação, como apontado pelos entrevistados, as orientações sobre a utilização dos agrotóxicos provêm dos funcionários das empresas que vendem estes produtos num sistema integrado e de uso, na prática, obrigatório. Os órgãos de extensão rural, como no caso da EMATER, são procurados pelos agricultores, de um modo geral, quando o solo já se apresenta esgotado em função de práticas agronômicas inadequadas, e não oferece mais condições de rendimento. É nestas situações, que os técnicos tomam ciência, inclusive, dos problemas de saúde das famílias. Outra questão que emergiu nas entrevistas foiàs dificuldades que a Vigilância em Saúde enfrenta para chegar até os trabalhadores rurais, em virtude da distância geográfica. Isto explicaria a falta de ações voltadas à educação em saúde e prevenção das intoxicações por agrotóxicos para esta população vulnerável. A justificativa seria de que os trabalhadores rurais não aderem a estas atividades, em função da rotina de trabalho e das distâncias a serem percorridas. CONSIDERAÇÕES FINAIS: As ações da Vigilância em Saúde do Trabalhador carecem de regulamentação e qualificação técnica de todos os profissionais envolvidos neste campo. As atividades de produção do tabaco, em especial, necessitam de políticas públicas de proteção, tendo em vista que este processo produtivo é permeado pelos mais diferentes interesses que geram um ciclo de pobreza e dependência, inerentes a esta forma de exploração econômica.
Palavras-chave
Saúde da População do campo; Vigilância em Saúde; Saúde Coletiva