Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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NOVA ESTRATÉGIA DE TREINAMENTO NA HANSENÍASE EM MATO GROSSO DO SUL (BRASIL)
Marli Marques, Eunice Atsuko Totumi Cunha, Cleide Aparecida Alves, Luis Carlos Oliveira Junior

Última alteração: 2015-12-01

Resumo


INTRODUÇÃO: O estado é classificado como área de alta endemia na hanseníase (HS), porém com  distribuição heterogênea: 30% dos municípios com níveis hiperendêmicos, 10% com baixa endemia ou silenciosos e 60% com níveis endêmicos elevados. A fim de implementar o controle da endemia optou-se pelo treinamento em serviço a fim de favorecer maior freqüência de  médicos. OBJETIVO: Apresentar os resultados dos treinamentos em serviço na HS desenvolvidos entre 2010-2014 nos municípios sul-mato-grossenses. MATERIAIS E MÉTODOS: Realizaram-se treinamentos em serviço com uma média de 5 semanas/ano, com custo médio/semanal R$10.000,00 atingindo 77/79 municípios ao final de 5 anos. A Secretaria de Estado de Saúde (SES) organizava os treinamentos, convidada os monitores, garantia deslocamento ao município, executava as ações de capacitação, efetuava pagamento de despesas e registrava e retroalimentava os serviços e instâncias parceiras. A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) escolhia o local das atividades teóricas e práticas, convidava os profissionais, clientela a ser examinada. Os treinamentos incluíam levantamento do conhecimento sobre a doença (pré-teste) e repasse de conteúdo teórico e posterior atendimento da clientela pelos monitores e com os treinandos (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, farmacêuticos, bioquímicos, biomédicos, outros técnicos de nível superior envolvidos na atenção aos doentes com hanseníase e técnicos de nível médio). A ONG (Associação Alemã de Assistência aos Hansenianos e Tuberculosos – DAHW) garantia as despesas do monitor oriundo de São Paulo (ILSL), recebia os consolidados e divulgava no site as matérias elaboradas pela equipe de monitores, ao final de cada semana de treinamento. RESULTADOS: Participaram de aulas expositivas 4.134 TNS e TNM (técnicos de nível superior e nível médio) e nas palestras e roda de conversa 971 Agentes Comunitários de Saúde (ACS) e comunidade. Participaram da aula prática 1.715 profissionais: 690 enfermeiros, 339 médicos, 159 fisioterapeutas/terapeutas ocupacionais, 117 farmacêutico-bioquímicos-biomédicos, 84 TNS de outras categorias e 320 TNM (ACS, de enfermagem e laboratório). Realizaram-se 1.532 atendimentos, onde 699 eram contatos de HS (45,6%). Entre todos os atendimentos confirmaram-se 362 casos novos (25,4%), sendo 39 PB e 323 MB (89,3%). Deste universo, 23/362 eram menores de 15 anos (6,4%) predominando neles formas MB 10/23(43,5%). Confirmaram-se nos contatos 258/699 casos novos (36,9%). Entre 112 atendimentos foi indicado retratamento além de conduta para 136 pacientes em surto reacional.  A pesquisa de BAAR foi realizada em 208/1.532(13,6%) atendimentos permitindo ajustes na técnica. Diagnosticaram-se casos em crianças entre 16/79 municípios (20,2%) e entre 14 trabalhadores da saúde em 14/79 municípios (17,7%). Além dos resultados observou-se incremento nas notificações: a partir dos treinamentos, os profissionais passaram a buscar e examinar ou reexaminar os contatos. Esta rotina implementou a notificação de casos novos entre 26 municípios (44,0%), com incremento variando de 10,0% a 450,0%, representando 7,9% para os municípios treinados e 3,5% para Mato Grosso do Sul. Houve também melhoria no exame de contatos: os percentuais de exame de contatos em nível estadual referente a 2008, 2009 e 2010, avaliado no primeiro semestre do ano posterior, e avaliado no primeiro trimestre de 2012, mostrou melhoria dos percentuais em 21 municípios em 2008, em 14 municípios em 2009, e 37 municípios em 2010. Também foram observadas melhorias na rotina laboratorial: as supervisões realizadas nos laboratórios dos 27 municípios mostraram a utilização da técnica de coleta, coloração, corante e leitura de acordo com a técnica orientada durante treinamento que está padronizada pelo Ministério da Saúde desde 2009. Houve incremento em 2012 do número de municípios que passaram a enviar lâminas ao LACEN-MS para o controle de qualidade (37% - 2011 e 50% - 2012). Acima de tudo, e ainda mais relevante, observou-se melhoria na atenção aos doentes: através das supervisões realizadas em 2011 e 2012 (16 e 36 municípios) tem sido verificado nas localidades que dispõe de fisioterapeutas/TO treinado, que houve sensível melhoria, com incorporação destes profissionais na avaliação físico funcional dos doentes, tanto no diagnóstico quanto na cura, bem como na prevenção e recuperação de incapacidades físicas. CONCLUSÕES: A responsabilização do município na organização e uso da logística local favoreceu ampla participação dos profissionais, prioridade a uma doença negligenciada, maiores resultados em vista dos baixos custos para cada parceiro. A participação de diferentes categorias profissionais no atendimento e assistência ao doente supera outras metodologias. Tanto por favorecer a assistência multiprofissional e entrosamento como pelos benefícios diretos aos pacientes. A elevada frequência de casos novos diagnosticados em adultos e crianças e manejo dos surtos e reações não atendendo ao protocolo do Ministério da Saúde e a Portaria 3125, de 07 de outubro de 2010, que contemplam normas e rotina para o controle da HS no país. Situação gerada pela falta de atualização dos profissionais, insegurança dos médicos no diagnóstico clínico e extrema dependência de exames laboratoriais confirmatórios, que além de retardarem o diagnóstico mantinha a transmissão entre contatos. O uso racional dos recursos financeiros, maior cobertura da população, amplos benefício para a saúde pública e para a comunidade foram reconhecidos pelo Governo do Estado de Mato Grosso do Sul com o Prêmio de Gestão Pública/2012, na modalidade Prática Inovadora da Gestão Estadual. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Considero-se esta estratégia como inovadora por ter aproximado um serviço de referência nacional às necessidades da população e dos profissionais sul-mato-grossenses que careciam de apoio para problemas de todas as ordens, mas principalmente os mais complexos. A possibilidade de discussão e solução de suspeita de resistência medicamentosa entre casos atendidos, cuja tecnologia encontra-se disponível no Instituto Lauro de Souza Lima/SP que é uma referência em Hanseníase para a América Latina mostrou-se acessível a nossa população e de conhecimento dos profissionais do Estado. Esta nova estratégia de treinamento em serviço, cuja proposta era inicialmente examinar os contatos de HS, foi ampliada para pacientes já tratados e apresentando queixa. A partir dos treinamentos foi possível conhecer a situação das ações de controle da HS nos municípios, além de suprir uma fragilidade dos serviços em relação ao baixo número de exame de contatos, apoiar os profissionais que acompanhavam os doentes já tratados apresentando surtos reacionais, bem como o cuidado com as seqüelas decorrentes da doença. A população compareceu e aceitou ser atendida em regime de treinamento, teve oportunidade de compartilhar suas queixas seja pela falta de diagnóstico da doença, tratamento equivocado sem melhora, manejo de intercorrências pouco adequados, pouco interesse no atendimento e baixa qualidade da assistência recebida. Esta estratégia buscou atingir principalmente os profissionais médicos, colocando-os diante da realidade, com o propósito de capacitá-los frente a uma doença endêmica em nossa região, preparando-os para atender os casos de forma mais segura e seguindo o protocolo, em vista da pouca experiência dos médicos no atendimento desta patologia durante sua formação. Os pacientes com HS necessitam ser assistidos por uma equipe multiprofissional, desempenhando ações complementares, cujo treinamento possibilitou esta integração e valorização da atuação de cada profissional. Este trabalho favoreceu o desenvolvimento de ações onde os gestores estaduais e municipais não desejavam novos diagnósticos, a comunidade não deseja ter a doença (estigma e preconceito), as equipes de saúde queixam-se da demanda gerada devido às intercorrências como surtos, reações, sequelas e necessidade de acompanhamentos frequentes. Todos estes aspectos foram amplamente discutidos enfatizando o tratamento como única forma de evitar novos casos, que o problema existe e não deve ser negligenciado.

Palavras-chave


Treinamento em serviço; Hanseníase; Mato Grosso do Sul