Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Gênero e Parto Humanizado entre o Ideal e o Real
Zoraide Vieira Cruz, Rita Maria Radl Philipp, Tânia Rocha Andrade Cunha

Última alteração: 2016-01-06

Resumo


APRESENTAÇÃO: A assistência ao parto era exclusivamente feminina, realizado por parteiras, as quais embora não dominassem o conhecimento científico, eram conhecidas por suas experiências. Assim, os acontecimentos na vida da mulher se sucediam na sua residência, onde elas trocavam conhecimento e descobriam afinidades. A partir do século XIX, a condução do parto mudou, deixou de ser visto como natural, privativo e familiar e passou a ser vivenciado na esfera pública, em instituições de saúde com vários atores conduzindo este processo. Tal fato favoreceu a submissão da mulher a qual deixou de ser protagonista do processo do parto, tudo isso em nome de uma assistência segura. Surge então a política de humanização do parto,proposta de atendimento à mulher  garantindo seus direitos a uma maternidade segura e prazerosa; com uma assistência centrada em suas necessidades. Ao longo da história, as mulheres sofrem perseguições e discriminações que se manifestam através de atos para calar suas vozes, descaracterizar suas necessidades e vontades. E, no caso do processo de parturição essa realidade não é diferente. Acredita-se que trabalho possa servir para ampliar a reflexão sobre a assistência ao parto  ofertada à mulher nas instituições de saúde no processo de parturição as quais representam ações de desumanização. O presente trabalho objetivou apresentar e denunciar algumas circunstâncias a que a mulher está sujeita no processo de parturição METODOLOGIA: Estudo qualitativo, reflexivo das práticas de atendimento ofertadas às mulheres no momento do parto. O corpus de documentos da mídia escolhidos para a análise retórica desta pesquisa foi composto por matérias jornalísticas produzidas pelos atores sociais responsáveis por blogs regionais que denunciaram mesmo sem usar esta expressão, a Violência Obstétrica na assistência direcionada ao atendimento ao parto de mulheres atendidas em um hospital conveniado ao SUS no município de Itapetinga. O critério de escolha deu-se devido a gravidade e visibilidade nacional que estes fatos tiveram e ainda estão tendo na região e na Bahia. Os dados coletados foram analisados à luz das questões preconizadas pela Política de Humanização do Parto e Nascimento do Ministério de Saúde do Brasil contribuindo assim na elaboração desta reflexão. Resultados e Discussão A Unidade Hospitalar citada neste estudo é conveniada  também ao SUS; funciona  24h, atendimento de emergência, clínico, cirúrgico pediátrico, ortopédico e obstétrico, além de ter uma Unidade de Terapia Intensiva. Os profissionais médicos, atendem em regime de plantão e de sobreaviso, neste último caso, o médico não se encontra necessariamente no espaço físico do hospital, sendo convocado quando necessário. No que concerne  ao atendimentos às gestantes, a admissão é de livre demanda, quando chegam são avaliadas pelo plantonista e referenciada ao pré parto ou devolvidas para casas em caso de falso trabalho de parto.   Observa-se que os registro das práticas de assistência ao parto invisibiliza detalhes importantes que fazem a diferença nos desfechos de saúde de mães e bebês, mas, em alguns casos, infelizmente trágicos como o apresentado,neste estudo. J.S.M, 9 meses de gestação, secundigesta, deu entrada no pronto socorro da referida Unidade de Saúde,com o trabalho de parto em curso, já perdendo líquido amniótico; ficou em observação,aguardando atendimento do especialista o qual, conforme dados veiculados na mídia, também estava de atuando como médico plantonista serviço na Unidade de Pronto Atendimento e no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência. É estarrecedor  imaginar que uma unidade de saúde, que se presta a atender à gestante não tenha in loco um especialista para tal procedimento. Neste caso aqui abordado,  parturiente foi admitida na Unidade , avaliada pelo clínico no turno matutino , apenas sendo vista pelo especialista à noite, visto que  este, ferindo todas as leis  trabalhistas, código de ética médica e, o mais impressionante ferindo a  lei da física, estava trabalhando em três lugares ao mesmo tempo. Sabe-se que a assistência ao parto deve ser segura, devendo ser garantido a cada mulher os benefícios dos avanços científicos, mas fundamentalmente, permitindo e estimulando o exercício da cidadania feminina, resgatando a autonomia da mulher no parto. O objetivo dos profissionais que atendem partos deve ser o de se obter ao fim da gestação, um recém-nascido saudável, com potencialidade para desenvolvimento biológico e psicossocial futuro; e também uma mulher/mãe com saúde e não traumatizada pelo processo de nascimento que acabou de experimentar. Observa-se na verdade o que  Saffioti e Almeida (1995) relatam, ocorre uma “conspiração do silêncio”, significando que, em geral, não há denúncia de violência, impedindo, assim, tanto de forma qualitativa quanto quantitativa, que dados sejam revelados, evidenciando a gravidade e a magnitude desse fenômeno. Esta mulher encontrava-se totalmente vulnerável, sofrendo, sem forças e com o seu filho em risco de morte. Parece até um território fora do alcance da lei, onde mais se dá o fenômeno da violência de gênero por parte de profissionais  médicos,sexo masculino. As Unidades Hospitalares possuem protocolos os quais dizem até mesmo as horas que um parto, período máximo para se ter um bebê, desrespeitando as peculiaridades de cada organismo. Seguem series de intervenções por vezes desnecessárias e violentas, ferindo a subjetividade materna. Assim ocorreu: o médico informou ao marido  que  o bebê faleceu,que iria tentar salvar a mulher. Esclareceu que  a criança tinha quase 6 kg, e por isso manobras foram feitas as quais conseguiram que a cabeça do bebê saísse mas, mesmo quebrando as clavículas da criança não teve êxito sendo necessário uma cesária e decapitar a criança. Neste caso, a violência institucional/obstétrica é evidenciada pela negligência no atendimento,excesso de intervenções que trazem dores e marcas físicas e psíquicas. O conhecimento médico hegemônico em relação a assistência ao parto, parte de um modo de pensar e agir que reforça uma lógica colonial e produtivista, tendo como marco a intervenção sobre o corpo feminino. Não se vislumbra cumprimento dos preceitos do parto Humanizado. O discurso da classe médica em destacar o bem estar da paciente pode ser visto como estratégia de dominação no processo do parto e nascimento. Considerações Finais Verifica-se descompasso entre a política de Humanização e a prática e que a distância entre o que se recomenda e que se faz possa ser reduzida através da adoção de um conjunto de medidas de ordem estrutural, gerencial, financeira e educativa, de forma a propiciar às mulheres brasileiras - sobretudo aquelas mais carentes – um parto verdadeiramente humanizado. Espera-se que com este trabalho, possa dar visibilidade às diversas situações vividas por nós, mulheres, como usuárias do sistema de saúde brasileiro. Mulheres de todo o país relatam ter sofrido diversas formas de agressões na assistência à saúde, principalmente na gravidez, no parto, pós-parto e nos casos de abortamento. Essas agressões são tão comuns que se tornaram previsíveis e até mesmo esperadas, mas a realidade não deveria ser essa. 

Palavras-chave


Parto Humanizado;Gênero:violência obstétrica

Referências


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