Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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PERFIL DE ADULTOS E IDOSOS CARCERÁRIOS COM ESCORE POSITIVO PARA TRANSTORNOS MENTAIS
Juliana Ferreira da Silva, Dra. Gylce Eloisa Panitz Cruz, Bárbara Cristina Santiago Martins, Fabiana de Castro Sampaio, Adriana Gonçalves de Oliveira, Patrícia Peres de Oliveira, Juliano Teixeira Moraes

Última alteração: 2015-11-23

Resumo


APRESENTAÇÃO: No Brasil, entre as décadas de 40 e 60, houve redução significativa da mortalidade, altos níveis de fecundidade e uma população jovem com expressivo crescimento. A partir do final dos anos 60 os níveis de fecundidade reduziram, desencadeando o processo de transição demográfica e, como resultado, o país vem apresentando um processo de envelhecimento acelerado nas últimas décadas, com modificações de impacto nos perfis epidemiológicos, sociais e culturais de sua população. Associado ao processo do envelhecimento, de transições e mudanças que envolvem adultos e idosos, em diferentes segmentos no país, registra-se uma frequência significativa de carcerários com 50 anos ou mais de idade. É fato que a detenção praticada no país pode trazer consequências à saúde e à vida do detento. O aprisionamento prolongado muitas vezes traz alterações na conduta psíquica, dificultando a reinserção social e familiar. Os transtornos mentais emergem, e podem ser frequentes, promovendo problemas maiores ao encarcerado, decorrentes muitas vezes do confinamento, superlotação dos espaços, ausência de visitas familiares e outros complicadores. Assim, embora a velhice não seja um sinônimo de doença, o envelhecimento pode resultar na presença de múltiplas delas, além de prejuízos e incapacidades com consequente deterioração da saúde dos idosos, sejam nos aspectos físicos e/ou mentais.  Vários fatores associados ao aumento da idade podem predispor ao desenvolvimento de transtornos mentais, especialmente sintomas distímicos (depressão leve). No aprisionamento carcerário, os efeitos sobre a saúde mental dos adultos e idosos podem ser percebidos apenas como alterações da idade avançada, não sendo tratados a tempo de evitar maiores complicações. O objetivo deste estudo, portanto, é caracterizar o perfil sociodemográfico, econômico e de saúde dos adultos e idosos carcerários com escore positivo para o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos. METODOLOGIA: Trata-se de um estudo descritivo transversal realizado em outubro de 2013 em um presídio, situado na região Centro-Oeste de Minas Gerais. Participaram da pesquisa ao todo 17 presidiários com 50 anos de idade ou mais. O National Institute of Corrections define presos mais velhos como aqueles com 50 anos de idade ou mais, pois embora indivíduos nesta idade que vivem em liberdade sejam considerados jovens, aqueles em situação de confinamento estão expostos a diversos fatores que aceleram o envelhecimento, como o convívio diário com outros detentos, situações de estresse, abstinência do álcool e outras drogas e as mudanças abruptas no estilo de vida para se submeter ao sistema carcerário. A coleta de dados foi realizada através de um questionário autoaplicativo, elaborado pelas pesquisadoras, organizado pelas seguintes seções: dados de identificação, caracterização do perfil sociodemográfico, econômico, de saúde, do comportamento sexual, do cárcere e a caracterização da saúde mental (humor). Na avaliação da saúde mental (humor) foi aplicado o Questionário de Rastreamento Psicogeriátrico (QRP), versão brasileira do Short Psychiatric Evaluation Schedule (SPES). Este questionário é composto por 15 questões no modelo sim/não, valendo um ponto cada resposta e o escore total é obtido quando somamos o número de respostas positivas.  Assim, foi considerado o ponto de corte maior ou igual a seis pontos, porque apresenta um bom desempenho como indicadores de sintomas psiquiátricos tipo distimia (depressão leve) sem conferir precisão diagnóstica. Por motivos estruturais do presídio envolvendo a superlotação e o quadro insuficiente de agentes penitenciários que poderiam garantir a segurança das pesquisadoras e dos detentos, não foi permitido acesso direto a eles, o que impossibilitou uma coleta de dados mais precisa. Diante disso, os participantes responderam questionário autoaplicativo, sendo o diretor de atendimento previamente capacitado pelas pesquisadoras para receber os envelopes contendo os questionários, lacrá-los e entregá-los aos detentos. O desenvolvimento do estudo atendeu às normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos. RESULTADOS: Do total de participantes da pesquisa, 64,7% apresentaram escore positivo para transtornos mentais, de acordo com o QRP. Considerando os aspectos sociodemográficos e econômicos destes participantes com screening positivo na avaliação da saúde mental, temos que 72,7% eram do sexo masculino, 91,0% com faixa etária entre 50 a 59 anos, 45,4% eram casados, 72,7% se declararam brancos, 81,8% tinham filhos e 63,6% moravam com pelo menos um membro da família ao serem presos. Em relação às condições de domicílio desses participantes, 54,5% tinham coleta de lixo, rede geral de abastecimento de água, rede de esgoto e iluminação elétrica, porém 27,3% não tinham coleta de esgoto e 9,1% não tinham abastecimento de água e esgoto. Quanto aos dados de escolaridade e renda, 36,3% dos participantes declararam tempo de escolaridade de 7 a 14 anos, 63,6% relataram não ser aposentados, 63,3% não recebiam renda no momento, 91,0% recebiam renda de até um a dois salários mínimos antes de ser preso e 100% dos participantes negou receber auxílio reclusão. Caracterizando o perfil de saúde dos participantes com screening positivo na avaliação da saúde mental, 90,9% declararam possuir morbidades, 90,9% declararam utilizar medicamentos, 63,6% consideraram sua alimentação inadequada, 72,7% relataram já ter usado álcool e tabaco, 45,4% consideraram sua saúde ruim, 54,6% consideraram sua saúde igual ou pior que a de pessoas da mesma idade, 45,4% manifestaram média satisfação com a vida. Quanto ao atendimento de saúde no presídio, 63,6% declararam receber algum tipo de atendimento, sendo que destes, todos possuíam acesso à assistência médica, 42,8% recebiam apoio psicológico e 14,3% usufruíam de outros tipos de especialidades médicas. Em relação aos objetivos após atingirem liberdade penal, 81,8% dos participantes demonstraram o desejo de ficar com a família, 45,4% almejam procurar um novo trabalho e permanecer no trabalho no anterior, respectivamente e 9,1% revelaram a preferência por estudar. CONSIDERAÇÕES FINAIS: As condições oferecidas pelo sistema penitenciário brasileiro são deficitárias em circunstância violadora aos direitos humanos básicos. Um período prolongado de aprisionamento pode provocar alterações na conduta, proporcionando inclusive sequelas psíquicas, muitas vezes irreversíveis. A alta prevalência de transtornos mentais na faixa etária investigada pode contribuir para um prejuízo da saúde se considerar que os reclusos recebem uma assistência de saúde deficiente, o que pode interferir na qualidade da senescência, principalmente quando agregada ao confinamento, seja ele a curto ou longo prazo. Este estudo busca contribuir em direção à criação de novas pesquisas e estratégias de intervenção na prevenção e no tratamento da saúde mental para a população que envelhece no Brasil em sistemas carcerários.

Palavras-chave


Enfermagem em saúde comunitária; Enfermagem geriátrica; Saúde mental;

Referências


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