Resumo
APRESENTAÇÃO: O tabagismo é considerado uma epidemia mundial, atingindo cerca 1,1 bilhão de pessoas, sendo responsável por quatro milhões de mortes anuais no mundo. Para atender a esta demanda, o Ministério da Saúde criou em 2001, o Programa de Abordagem e Tratamento do Fumante, que através de apoio medicamentoso e de abordagem cognitivo-comportamental visa à cessação do hábito de fumar. O município de Água Clara/MS oferece este serviço desde 2012 e suas taxas de cessação estão entre 30 e 50%, semelhante à média nacional. O objetivo deste estudo foi traçar o perfil dos usuários que do Programa de Abordagem e Tratamento do Fumante do município de Água Clara, a fim de se conhecer melhor a população atendida, suas características, e realidade local, para que através dos resultados, seja possível desenvolver estratégias de intervenção mais adequadas ao perfil desta população. MÉTODO DO ESTUDO: Trata-se de um estudo transversal que se utilizou de dados secundários provenientes dos prontuários dos pacientes. Foram coletados dos prontuários dados relativos a variáveis sócio-demográficas e informações referentes aos hábitos de vida, hábito tabágico e presença de fatores associados. Os resultados foram analisados por meio de estatística descritiva. RESULTADOS: Foram investigados 173 prontuários, sendo este o total de pessoas que procuraram o programa para o tratamento do tabagismo desde sua implantação em 2012 até setembro de 2015. Deste total de participantes, 63,1% eram do sexo feminino e 36,9% do sexo masculino. A idade média dos participantes na data em que procuraram o serviço de saúde era de 45,99 anos e a média de idade em que começaram a fumar foi de 14,38 anos. Com relação àscomorbidades que podem estar relacionadas ao uso do tabaco, destacaram-se problemas emocionais, considerando-se depressão e ansiedade (75,14%), sendo que somente 35,84% já fizeram algum tipo de tratamento psicológico ou psiquiátrico. A depressão torna as pessoas mais frágeis para o processo de cessação de fumar, necessitando de um tratamento diferenciadocom antidepressivos. Neste caso, 38,15% dos fumantes, apresentavam algum grau de depressão, os outros 36,99% relatam serem ansiosos o que também dificulta a superação do hábito de fumar. Outros problemas associados encontrados foram os estomacais (68,20%), problemas pulmonares (52,02%), alergias respiratórias (49,13%). Entre os fatores que dificultam o tratamento, encontra-se o uso frequente do álcool, presente em 28,90% dos participantes, sendo que destes, 5,78% apresentaram forte tendência ao alcoolismo. Entre os fumantes 52,60% informaram uso de prótese dentária o que pode ser explicado tanto pela idade de quem procura o tratamento ser mais avançada, quanto pelo fato de que o uso prolongado do cigarro pode acelerar o desgaste dos dentes. Dentre os pacientes, 62,43% relataram fazer uso de algum tipo de medicação e na maior parte das vezes para tratamento de problemas que podem ser causados ou agravados pelo hábito de fumar. Com relação aos momentos e situações em que é associado o uso do cigarro no dia a dia, destacou-se o consumo do café para 75,72%, após as refeições (94,21%), ansiedade (82,66%), tristeza (77,46%) e bebida alcoólica (46,24%). Considerando-se as percepções dos fumantes sobre o cigarro, 78,03% acreditam que o cigarro acalma quando estão nervosos; 95,38% não consideram o hábito de fumar bonito e 51,45% relatam que sentem prazer em fumar. A maioria destes usuários já fizeram outras tentativas para deixar de fumar, 54,34% tentou de 1 a 3 vezes e 26,01% já fizeram mais de 03 tentativas, nos dois casos, ficando pelo menos 01 dia sem fumar, 10,98% relatou que tentou, mas não conseguiu ficar nenhum dia sem fumar e 8,67% nunca fez nenhuma tentativa para parar de fumar, sendo esta a primeira vez. Foi também verificado a utilização anterior de algum recurso para tentar deixar de fumar sendo que a maioria (75,72%) nunca utilizou e 23,70% utilizaram algum tipo de medicação (adesivos, bupropiona, pastilha, goma, ou outro). Sobre a motivação dos pacientes para procurarem o tratamento e deixar de fumar, os motivos mais citados foià preocupação com a saúde no futuro (82,66%), o cigarro já esta prejudicando sua saúde (79,77%), desejo de deixar a dependência (38,73%) e o hábito de fumar ser antissocial (36,94%). Motivações relacionadas à família, foram as menos citadas, 30,64% disseram que querem parar de fumar pelo bem-estar da família, a mesma porcentagem relatou que é devido aos gastos com o cigarro, 30,06% porque os filhos pedem, 27,75% porque tem pessoas pressionando, 26,01% devido às restrições de ambientes para fumar e por último, 24,86% porque fumar é um mau exemplo para as crianças. Dos entrevistados, 37,57% convivem com outros fumantes em casa e 31,79% preocupam-se em ganhar peso se pararem de fumar. A avaliação do grau de dependência dos fumantes pelo teste de Fagerstrom apontou que a maior parte deles, 40,46% possuem grau de dependência elevado, 27,75% muito elevado, 12,72% médio, 14,45% baixo e 4,62% muito baixo. CONSIDERAÇÕES FINAIS: A pesquisa apontou que os tabagistas que procuram este serviço de saúde são em sua maioria adultos, que iniciaram o hábito de fumar muito jovens, apresentando um período de tempo de dependência longo. Além disso, mostrou a predominância do sexo feminino na busca do tratamento e o baixo índice de homens que procuram este serviço de saúde para o tratamento. Foi identificado que grande parte destes usuários, quando procuram o tratamento, já apresenta alguma comorbidade que pode ter sido causada devido ao hábito de fumar, além da existência de uma associação forte entre o hábito de fumar e problemas emocionais. Indicando que estas pessoas tem uma predisposição maior para a dependência, considerando-se ainda que tais fatores funcionam como uma barreira para a superação deste hábito, o que indica uma necessidade de suporte psicológico para o auxílio no tratamento. Também é observado que as pessoas de maneira geral, estão mais preocupadas com sua saúde, o que pode ser efeito das campanhas de prevenção desenvolvidas nos últimos anos, pelo Ministério da Saúde. Além disso, percebe-se que a decisão de abandonar o fumo vem na maioria dos casos, de uma conclusão da própria pessoa, não sendo tão eficientes as intervenções e pressões familiares. Outra conclusão a que chegamos é que a maior parte dos fumantes que procuram auxílio para deixar de fumar, encontra-se em um grau de dependência alto (elevado a muito elevado), o que pode explicar a taxa de cessação entre as pessoas que fazem o tratamento não ser mais alta. Este grau de dependência é identificado a partir do Teste Fagerstrom, que é estabelecido pelo Ministério da Saúde para direcionar o tratamento medicamentoso. Os resultados obtidos neste trabalho de pesquisa auxiliarão o município a reorganizar suas ações, buscando desenvolver estratégias que atendam às demandas identificadas, como captação de jovens, homens e oferecimento de suporte psicológico para aqueles que apresentem problemas emocionais. Além disso, sugere-se a intensificação de ações preventivas, tanto com os jovens, quanto com aqueles que ainda não apresentam grau de dependência alto, já que quanto menor a dependência, maior a chance de sucesso no tratamento.
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BRASIL. Instituto Nacional do Câncer. Organização Pan-Americana de Saúde. Pesquisa Especial de Tabagismo – PeTab: relatório Brasil. Rio de Janeiro: Inca, 2011.
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