Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Integralidade do cuidado na Estratégia Saúde da Família na ótica do usuário
Carmem Tiéle Vale Garcia, Elisangela da Silva Almeida, Daiane de Aquino Silva, Roberta de Vargas Zanini, Lana Carneiro Almeida

Última alteração: 2015-10-31

Resumo


A Atenção Primária à Saúde é considerada a mais eficaz estratégia para melhorar a situação de saúde populacional.  No Brasil, a Estratégia Saúde da Família, criada em 1994, tem como objetivo a reorganização do modelo assistencial de saúde, passando a ser prioridade na reestruturação da Atenção Básica no país por sua capacidade de oferecer atenção integral individual e coletiva através de ações que promovam, mantenham e protejam a saúde da população. A Atenção Primária à Saúde vem sendo determinada operacionalmente por quatro indicadores essenciais: acesso de primeiro contato, longitudinalidade, integralidade e coordenação, além de outros três indicadores denominados derivados: orientação familiar, comunitária e competência cultural, que elevam seu poder de interação com a comunidade e com o indivíduo. O indicador integralidade é composto por outros dois componentes: serviços disponíveis e serviços prestados. Nas últimas duas décadas, a preocupação com a qualidade dos serviços vem determinando as discussões sobre o aperfeiçoamento dos sistemas de saúde por se tratar de uma questão decisiva para gestores e por ser um processo gradual que abrange diversos aspectos. Assim, este estudo teve como objetivo avaliar a qualidade do serviço de saúde prestado pela Estratégia Saúde da Família (ESF), quanto ao indicador integralidade, em um município da Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, Brasil, na percepção dos usuários. Esta pesquisa faz parte de um estudo transversal maior intitulado “Estratégia Saúde da Família: qualidade do serviço e perfil nutricional do usuário”. Foram incluídos indivíduos de 20 anos de idade ou mais, cadastrados nas ESF do município, que utilizaram o serviço nos doze meses anteriores à entrevista, residentes na zona urbana. Indivíduos que apresentaram incapacidades que os impossibilitassem de responder ao questionário foram excluídos da pesquisa. Foi utilizado um questionário que incluiu questões sobre identificação, características sociodemográficas e de saúde dos usuários; o PCATool-Brasil Adulto versão reduzida; e questões do Critério de Classificação Econômica Brasil. A qualidade do serviço de saúde foi avaliada por meio de respostas em escala tipo Likert, a partir das quais foram construídos escores de APS com intervalos de 1-4. Para definição de significância estatística, utilizou-se o valor de p<0,05. Como ponto de corte foi utilizado o valor de 6,66, que é o valor mínimo adotado no PCATool indicativo de qualidade. O estudo principal foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNIPAMPA, Parecer n.º 954.173. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido previamente à entrevista, ao final da qual, todos os participantes receberam um retorno com os 10 Passos para uma Alimentação Saudável. Em todas as etapas do estudo foi garantido o cumprimento das exigências que constam na Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta o desenvolvimento de pesquisas envolvendo seres humanos. Entre os 370 participantes da primeira etapa do estudo, prevaleceram indivíduos do sexo feminino (80,0%), da faixa etária de 40 a 59 anos (41,8%) e, com escolaridade de 0 a 4 anos de estudo (40,2%). A maior parte dos entrevistados (50,8%) pertencia à classe C de classificação econômica e 67,0% referiram não ser beneficiários do Programa Bolsa-Família. Os resultados observados no perfil da amostra são semelhantes aos encontrados em outros estudos que analisaram o serviço de saúde 3-4, confirmando o fato de as mulheres utilizarem mais os serviços de saúde do que os homens, e também ratifica a maior utilização pela faixa etária adulta, sugerindo que pessoas do sexo feminino e aqueles que ainda não chegaram à senilidade podem ter um maior zelo com relação à saúde. O percentual elevado de usuários com baixo índice de escolaridade e menor classificação econômica foi também evidenciado em outros estudos 5, 6, 7 que observaram a predominância desta população na utilização do serviço público de saúde. Nenhuma das variáveis independentes apresentou associação estatisticamente significativa com o desfecho, indicando que, na amostra estudada, a qualidade dos quesitos que compõem o atributo integralidade independem de sexo, idade, escolaridade, classe econômica e ser beneficiário ou não do Programa Bolsa-Família. No entanto, observou-se que nenhum dos escores resultantes das respostas dos participantes, nas categorias das variáveis independentes, alcançou o ponto de corte de 6,66. Ao apresentar valores médios de escore inferiores aquele considerando indicativo de qualidade, em todas as variáveis analisadas, fica evidente que o serviço apresenta falhas na disponibilidade e prestação de serviços, através de orientações e aconselhamentos preventivos e promotores da saúde, além de apontar para uma prática assistencial individualizada e não direcionada à família como um todo ou mesmo à comunidade que atende. Estudos conduzidos no Brasil utilizando o PCATool 8,9, também revelam esta tendência centrada na cura e reabilitação e não no caráter biopsicossocial que a ESF deve ter enquanto orientada à Atenção Primária à Saúde. Deste modo, o serviço pode ser considerado ineficaz como provedor de atenção integradora de cuidados na atenção à saúde dos usuários, visto que a reorientação da atenção primária deve requerer o reconhecimento da pessoa como um todo, seu modo de vida, situação social, econômica e familiar, considerando assim todos os fatores que levam ao adoecimento da população e não só o fator biológico. Os resultados desta pesquisa evidenciam que o serviço atualmente prestado está ainda fortemente orientado ao processo curativo e não à prevenção dos agravos e manutenção da saúde, como preconiza a atual Política Nacional de Atenção Básica. Uma melhor organização e aperfeiçoamento são necessários para resolver as principais falhas observadas no serviço, através de ferramentas que possibilitem uma maior participação popular tanto no controle, quanto na gestão para que se alcance a tão almejada qualidade.

Palavras-chave


Atenção Primária à Saúde; Avaliação em Saúde; PCATool.

Referências


1. Brasil. Ministério da Saúde (MS). Manual do instrumento de avaliação da atenção primária à saúde. Brasília: MS; 2010.

 

2. Brasil. Portaria no. 2.488. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família - ESF e o Programa de Agentes Comunitários de Saúde - PACS. Diário Oficial da República Federativa do Brasil 2011; 24 out.

 

3. Dias OV, Vieira MA, Dias JP, Ramos LH. As dimensões da satisfação dos usuários do Programa Saúde da Família: confiabilidade e empatia. Acta Paulista de Enfermagem 2011; 24:225-31.

 

4. Lins IL, Neto RTL, Leite SFP, Oliveira JMC, Felipe FA, Ferreira NB. Avaliação da Assistência Prestada na Estratégia de saúde da família na Ótica do Usuário. Id on line Revista de Psicologia 2014; 24:21-33.

 

5. Dias-da-Costa JS et al. Utilização de serviços de saúde pela população adulta de São Leopoldo, Rio Grande do Sul, Brasil: resultados de um estudo transversal. Cadernos de Saúde Pública 2011; 27:868-76.

 

6. Levorato CD, Mello LM, Silva AS, Nunes AA. Fatores associados à procura por serviços de saúde numa perspectiva relacional de gênero. Ciência & Saúde Coletiva 2014; 19:1263-74.

 

7. Fernandes LCL, Bertoldi AD, Barros AJD. Utilização dos serviços de saúde pela população coberta pela Estratégia de Saúde da Família. Revista de Saúde Pública 2009; 43:595-603.

 

8. Silva SA, Fracolli LA. Avaliação da Estratégia Saúde da Família: perspectiva dos usuários em Minas Gerais, Brasil. Saúde Debate 2014; 38:692-705.

 

9. Sala A, Luppi CG, Simões O, Marsiglia RG. Integralidade e Atenção Primária à Saúde: avaliação na perspectiva dos usuários de unidades de saúde do município de São Paulo. Saúde Sociedade 2011; 20:948-60.