Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Satisfação do usuário com o serviço prestado pela Estratégia Saúde da Família
Elisangela da Silva Almeida, Carmem Tiéle Vale Garcia, Daiane de Aquino Silva, Roberta de Vargas Zanini, Lana Carneiro Almeida

Última alteração: 2015-10-31

Resumo


A Estratégia Saúde da Família (ESF) tem por objetivo viabilizar o acesso de pessoas com complexas necessidades sociais às ações e serviços de saúde, porém revela uma porta de entrada estreita, o que merece um olhar mais distinto, para que a organização dos serviços tenha como base as necessidades dos indivíduos1. Tendo em vista que a ESF é o modelo atual de organização do serviço de saúde no Brasil, e com o objetivo de avaliar a satisfação dos usuários com o serviço prestado na Fronteira Oeste do Rio Grande do Sul, foi realizado um estudo transversal em um município dessa região. Foram incluídos no estudo indivíduos com idade igual ou superior a 20 anos, cadastrados na ESF, residentes na zona urbana e que utilizaram qualquer serviço prestado pela ESF ou Núcleo de Apoio à Saúde da Família nos 12 meses anteriores à entrevista.  A coleta de dados foi realizada de março a agosto de 2015 de maneira simultânea nas unidades de ESF do município. Foi utilizado um questionário composto por questões de identificação, características sociodemográficas e de saúde dos usuários; satisfação do usuário com o serviço e questões do Critério de Classificação Econômica Brasil (ABEP). A satisfação do usuário com o serviço prestado pela ESF foi avaliada através de 17 perguntas que apresentavam possibilidade de respostas “Excelente”, “Bom”, “Regular”, “Ruim”, “Péssimo”, “Não se aplica” e “Não sabe”. A variável satisfação foi categorizada em: Satisfeito = Excelente + bom, e Insatisfeito = Regular + Ruim + Péssimo. Considerou-se como ponto de corte para satisfação o valor de 60%. Foram entrevistados 369 usuários das ESF, contabilizando-se quatro recusas. A maior parte dos entrevistados era do sexo feminino (79,9%), encontrava-se na faixa etária dos 40 a 59 anos (41,2%) e apresentou cor da pele observada não branca (60,4%). Em relação à escolaridade, 40,1% dos participantes tinha até quatro anos de estudos. A maioria (65,9%) referiu morar com companheiro(a). Quanto à situação de trabalho, 35,8% referiram estar trabalhando no momento da entrevista e 27,6% referiram estar aposentados. De acordo com a classificação da ABEP, observa-se que mais da metade (52,0%) da amostra pertencia à Classe Econômica C, seguida de 37,1% na classe D-E. Quase 67% da amostra referiu não ser beneficiário do Programa Bolsa Família. Com relação à última assistência recebida da ESF, “consulta” foi referida pela maioria (69,6%), ficando em segundo lugar (14,0%) a realização de exames. Os resultados da avaliação da satisfação dos usuários com o último atendimento recebido na ESF revelam que nenhum dos itens investigados obteve classificação “Excelente” por 50% ou mais dos entrevistados. Os itens que tiveram maiores percentuais na avaliação “Bom” pelos usuários foram: Tempo gasto com o deslocamento (66,4%); Falar em privacidade com o profissional (65,9%) e Intimidade respeitada durante exame físico (63,9%). O item Liberdade em escolher o profissional foi classificado como “Bom” por 48,4% dos usuários, enquanto 10,8% classificaram como “Ruim”; de maneira semelhante, o item Tempo de espera até ser atendido foi classificado como “Bom” por 43,8% dos participantes e como “Ruim” por 13,4%. O item que os usuários referiram maior insatisfação foi Disponibilidade de medicamentos, que recebeu 33,9% de avaliação “Regular”, 16,9% “Ruim” e 11,3% “Péssimo”. A maior satisfação dos usuários com o item “Tempo gasto com deslocamento” foi um resultado já esperado em virtude da propositada proximidade das unidades de ESF às famílias cadastradas, para facilitar o acesso, estratégia fruto da descentralização, que obedece a critérios de territorialização para a implantação das unidades3, 4. Assim como foi observado em estudo realizado em quatro municípios do Ceará5, a maioria dos participantes deste estudo referiu “consulta” como a última assistência recebida na ESF, evidenciando que o modelo biomédico ainda persiste, com a maior parte de suas ações voltadas para a cura e não necessariamente para a prevenção de doenças. Depois da acessibilidade, os itens com maiores percentuais de satisfação são aqueles relacionados diretamente com o atendimento do profissional de saúde: Intimidade respeitada durante exame físico, Sigilo das informações e Falar em privacidade com o profissional. De acordo com a literatura, os usuários tendem a mostrar mais satisfação com a qualidade do serviço recebido por parte do profissional que o atende nas unidades, o que é um resultado relevante para o serviço de saúde local, visto que um dos pilares da ESF é a boa relação profissional-usuário6, 7. Já os menores percentuais de satisfação do presente estudo foram observados nos itens Tempo de espera até ser atendido e Disponibilidade de medicamentos, resultado semelhante ao encontrado em outros estudos6, 8, o que leva a questionar se os serviços estão realmente adequados às necessidades dos usuários. Segundo Mendes et al.9, a Política Nacional de Medicamentos, em vigor desde 1998, institui como dever do município, assegurar o suprimento adequado de medicamentos básicos para a população; por outro lado, deve-se observar se a prescrição médica mantém coerência com a padronização de medicamentos, que leva em consideração o contexto epidemiológico local. Os resultados obtidos neste estudo reafirmam a importância de se avaliar o sistema de saúde dos municípios, pois mesmo com um alto percentual de usuários satisfeitos em relação a alguns aspectos, a evidência de insatisfação em relação a outras características do serviço mostra que o cenário objetivado pelos preceitos da ESF deve ser uma busca constante. Portanto, estes dados são capazes de embasar o direcionamento de ações futuras, tanto por parte dos gestores quanto por parte dos usuários, que podem fortalecer o controle social através da sua inclusão nos processos de planejamento, estreitando assim a relação entre os usuários e o Sistema Público, para juntos encontrarem formas de melhorar o sistema local.

Palavras-chave


Atenção primária; Avaliação em saúde; Sistema Único de Saúde (SUS)

Referências


1. Azevedo ALM, Costa AMA. Estreita porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS): uma avaliação do acesso na Estratégia de Saúde da Família. Interface. (Botucatu) 2010; 14: 35.

 

2. ABEP. Critério de Classificação Econômica Brasil. São Paulo: Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, 2014. http://www.abep.org/criterioBrasil.aspx (Acesso em 30/ nov/2014).

 

3. Teixeira CF. Promoção e vigilância da saúde no contexto da regionalização da assistência à saúde no SUS. Cad. Saúde Pública 2002; 18: S153-S162.

 

4. Cunha ABO, Vieira-da-Silva LM. Acessibilidade aos serviços de saúde em um município do Estado da Bahia, Brasil, em gestão plena do sistema. Cad. Saúde Pública 2010; 26: 725-737.

 

5. Santiago RF, Mendes ACG, Miranda GMD, Duarte PO, Furtado BMASM, Souza WV. Qualidade do atendimento nas Unidades de Saúde da Família no município de Recife: a percepção do usuários. Ciênc. Saúde Coletiva 2013; 18: 35-44.

 

6. Szwarcwald CL, Leal MC, Gouveia GC, Souza WV. Desigualdades socioeconômicas em saúde no Brasil: resultados da Pesquisa Mundial de Saúde, 2003. Rev. Bras. Saúde Mater. Infant. 2005; 5: s11-s22.

 

7. Mendes ACG, Júnior JLCAA, Furtado BMASM, Duarte PO, Santiago RF, Costa TR. Avaliação da satisfação dos usuários com a qualidade do atendimento nas grandes emergências do Recife, Pernambuco, Brasil. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant. 2009; 9: 157-165.

 

8. Gouveia GC, Souza WV, Luna CF, Szwarcwald CL, Souza JPRB. Satisfação dos usuários com a assistência de saúde no estado de Pernambuco, Brasil, 2005. Ciênc. saúde coletiva 2011; 16: 1849-1861.

 

9. Mendes ACG, Miranda GMD, Figueiredo KEG, Duarte PO, Furtado BMASM. Acessibilidade aos serviços básicos de saúde: um caminho ainda a percorrer. Ciênc. saúde coletiva 2012; 17: 2903-2912.