Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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USO DO PROJETO TERAPÊUTICO SINGULAR COMO METODOLOGIA ATIVA: VIVÊNCIA DE ACADÊMICAS DE ENFERMAGEM
THAISSA BLANCO BEZERRA, AUDREY MOURA MOTA GERONIMO, GLAUCIA SIDNEIA MEDINA BELJAK, CARLA GABRIELA WUNSCH, SAMIRA RESCHETTI MARCON

Última alteração: 2015-10-31

Resumo


Atualmente o ensino tem passado por diferentes transformações frente às legislações pertinentes à área. No entanto, a maioria dos currículos se apresenta com metodologias tradicionais de ensino, resultando em fragmentação do saber e ocorrendo uma constante reprodução do conhecimento científico. A metodologia ativa, oposta ao ensino tradicional, é uma estratégia que possibilita a formação de profissionais capazes de identificar os problemas da população atendida por meio da vivência de situações cotidianas. Neste sentido, o Projeto Terapêutico Singular (PTS) possibilita ao acadêmico conhecer a história e as necessidades individuais do usuário em seu contexto de vida. Trata-se de uma ferramenta interdisciplinar, fruto da discussão coletiva de uma equipe de profissionais de saúde, mediante compartilhamento de saberes, em conjunto com o usuário atendido e sua família e que deve ser direcionado para a resolução de situações complexas, estando prevista a prescrição de cuidados e as intervenções a serem realizadas como parte do processo. Tem por finalidade a construção de condutas terapêuticas que objetivam tanto sanar os sintomas apresentados, quanto promover a reinserção social, sendo um instrumento que foi proposto com o intuito de superar o paradigma médico psiquiátrico excludente, em especial por respeitar a subjetividade do sujeito atendido. Usam-se diversos recursos terapêuticos (comunicação terapêutica, a escuta atenta e reflexiva, as atividades grupais e os atendimentos individuais, dentre outros) para a definição das propostas de ações a serem aplicadas para o indivíduo, sua família e o grupo social ao qual faz parte, buscando as diferenças como ponto central de articulação. A prática do aluno ocorre de maneira singular para com a pessoa e sua família, tornando o PTS uma ferramenta de aprendizagem ativa, permitindo qualificar o cuidado a ser prestado aos usuários e revelando-se como um potencializador para uma formação crítica e reflexiva. Este é, por sua vez, utilizado na disciplina de Enfermagem em Saúde Mental, que compõe a grade curricular do Curso de Graduação de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Assim, este trabalho é um relato de experiência das acadêmicas de enfermagem do sexto semestre, campus Cuiabá, realizado no decorrer das atividades do segundo semestre do ano de 2014 e a escolha da usuária se deu após a discussão com a equipe da Unidade de Saúde da Família. A construção do PTS se deu por meio dos contatos com a pessoa a ser acompanhada e sua família e discussão com a equipe, docente e acadêmico, seguindo as etapas de visita domiciliar, acolhimento, construção do histórico do sofrimento psíquico, levantamento de problemas, estudo da psicopatologia, proposição das intervenções e avaliação. Os encontros ocorreram na residência da usuária, totalizando três encontros, que foram previamente acordados com a mesma. Durante o desenvolvimento da prática e a construção do PTS foram utilizados conceitos pautados no modelo de atenção psicossocial. Considerando que o PTS se caracteriza como um conjunto de condutas terapêuticas articuladas e direcionadas a um sujeito individual e/ou coletivo, o trabalho foi iniciado por meio da visita domiciliar na qual se deu o acolhimento, estratégia fundamental para o desenvolvimento das ações em saúde. Neste contato, iniciou-se o estabelecimento de um vínculo, mediante a utilização de uma escuta qualificada com usuária e familiares a fim de conhecer a história e suas necessidades de saúde, permitindo o estabelecimento de uma relação cidadã e humanizada, caracterizando-se como elemento-chave para promover a ampliação efetiva do acesso à atenção básica bem como os demais serviços assistenciais de saúde. Embora inicialmente a proposta fosse trabalhar com a usuária, portadora da Doença de Alzheimer (DA), a aproximação com a família despertou o olhar da equipe para o cuidador, ao qual acabou sendo direcionado o PTS. Nesse primeiro encontro foi visualizada a família, sua organização e a situação vivenciada de modo geral. Todavia, no segundo momento foi realizada a coleta de dados. A usuária apresentava um estágio avançado da DA, com comprometimento de funções cognitivas (linguagem, memória, coordenação motora, desempenho das atividades de vida diária), de auto cuidado e de convívio social. Foram observadas alterações psíquicas e comportamentais relacionadas à fase avançada da psicopatologia, com sintomas psicóticos, alterações do humor (agressividade e sintomas depressivos), do sono e medo de morrer. Frente a este quadro, percebeu-se a necessidade de um cuidado mais direcionado ao cuidador, seu esposo, que se mantinha como o principal responsável pela usuária, iniciando-se assim a identificação e levantamento de problemas. Para o planejamento das intervenções, buscou-se na literatura embasamento teórico, visando à articulação teórico-prática, o que proporcionou às envolvidas um aprendizado sólido e significativo, além de possibilitar a construção de instrumentos como o genograma e o ecomapa, que permitiram conhecer a organização familiar e a relação desta com a rede de cuidados à saúde. No terceiro encontro, foi finalizada a coleta de dados, aproveitando-se o momento para discutir com o cuidador suas dificuldades vivenciadas e realizar algumas orientações, como informações sobre a DA e a importância de uma alimentação adequada, ajudando-o a entender a respeito da patologia. A dedicação praticamente exclusiva do cuidador exigida pelo portador de Alzheimer pode levar ao isolamento social e presença de sintomas depressivos, já que assume uma responsabilidade superior aos seus limites físicos e emocionais, necessitando de apoio, valorização e reconhecimento quanto a sua carga de trabalho. Desta forma, é necessário envolver outros familiares na rotina dos usuários atendidos visando minimizar a sobrecarga do cuidador. Vale ressaltar, que as intervenções foram propostas para serem efetivadas a médio e longo prazo, o que não foi possível frente a curto período de realização das atividades práticas da disciplina. A última etapa do PTS, avaliação, foi realizada positivamente pelas acadêmicas, cuidador e equipe de saúde. O uso do PTS como uma metodologia ativa oportunizou acolher uma família, vivenciar sua situação de vida e traçar intervenções a partir das necessidades dos sujeitos envolvidos, sendo fundamental para o crescimento e amadurecimento no processo de formação profissional, conduzindo a um aprendizado significativo e crítico, fato que deve ser estimulado no ambiente acadêmico com vistas a instrumentalizar os futuros enfermeiros para a prática cotidiana que irão enfrentar. Embora o PTS não tenha sido aplicado pelas acadêmicas em sua totalidade, a construção em conjunto com a equipe da ESF, permitiu a sua continuidade, além de apresentar para os profissionais da unidade uma nova tecnologia de cuidado na atenção primária à saúde.

Palavras-chave


Enfermagem; Metodologias ativas; Projeto Terapêutico Singular.

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