Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Políticas Públicas sobre Drogas: a discricionariedade dos profissionais da Atenção Básica na produção de cuidado
Emanueli Paludo, Claudia Tirelli

Última alteração: 2015-11-23

Resumo


A literatura sobre implementação de políticas públicas tem chamado atenção para o fato de que os agentes implementadores “fazem a política” e, nesse sentido, atuam também como decisores políticos, transformando políticas em ações (LOTTA, 2012). Esses atores ocupam diversas posições dentro das organizações, participando de espaços que vão desde a gestão da implementação do serviço até a produção de cuidado no território. A importância dos chamados “burocratas de nível de rua” na implementação de políticas públicas se deve ao seu alto grau de autonomia e de discricionariedade no atendimento direto a população (LIMA; D’ASCENZI, 2013). Ou seja, seus valores, ideias e habilidades profissionais, aliados aos recursos de que dispõem para a realização do seu trabalho (financeiros, físicos, humanos), irão condicionar a forma como executam as ações da política pública, refletindo na escolha dos beneficiários prioritários, nos encaminhamentos e no ritmo da oferta do serviço. No caso da saúde, os profissionais que atuam na Atenção Básica também são fazedores de política, pois tomam decisões diárias nos serviços de saúde e criam estratégias de cuidado no cotidiano. Nesse sentido, este trabalho pretende discorrer sobre a maneira pelas quais os profissionais da saúde da Atenção Básica produzem formas de cuidado aos usuários de drogas a partir do seu poder de discricionariedade nas ESF do município de Santa Cruz do Sul. A investigação empírica realizou-se através de entrevistas semiestruturadas com 15 profissionais de duas equipes das ESFs, abrangendo enfermeiros, médicos, dentistas, auxiliar de saúde bucal e agentes comunitários de saúde. Para a interpretação do material coletado, utilizou-se a análise do discurso, posto que esta técnica permite compreender o discurso como uma prática construída histórica, social e culturalmente. Os resultados parciais da pesquisa apontam que grande parte dos profissionais entrevistados considera que não ocorrem atendimentos voltados ao uso de drogas nas ESFs. Quando admitem haver atendimentos a usuários, salientam que são para demandas de saúde sem relação direta com a droga. Os profissionais afirmam que é difícil a realização de qualquer atividade direcionada ao tema das drogas, pois todo o seu tempo é preenchido com as atividades de rotina das ESFs (vacinação, atenção às gestantes, atendimento a doentes crônicos, consultas, etc.). Entretanto, os agentes comunitários de saúde relataram diversas práticas que não são reconhecidas como implementação de políticas públicas sobre drogas, tais como escutas, orientações e busca ativa que ocorrem no contexto das visitas domiciliares. Frente ao constante questionamento sobre a realização desta pesquisa no espaço das ESFs, pôde-se perceber, também, que as ESF não são reconhecidas pela sua possibilidade de produzir cuidado ao usuário de drogas. Embora os profissionais pesquisados reconheçam os benefícios das ESF devido a sua proximidade com a comunidade, não se sentem capacitados para atuar diante da problemática das drogas e afirmam que a rede assistencial não se utiliza desta estratégia para realizar ações com a comunidade. Nesse sentido, os discursos expressam uma rede de atenção à saúde fragmentada, onde a produção de cuidado realizada na ESF não é reconhecida como tal, nem pelos próprios profissionais.

Palavras-chave


Drogas; Discricionariedade; Produção de cuidado.

Referências


LIMA L. L.; D’ASCENZI, L. Implementação de Políticas Públicas: análise da Política Nacional de Humanização a partir da burocracia implementadora. Encontro da ANPAD, Rio de Janeiro, v. 37, set., 2013.

LOTTA, G. S. Desvendando o papel dos burocratas de nível de rua no processo de implementação: o caso dos agentes comunitários de saúde. In: FARIA, C. A. P, de. (Org.). Implementação de políticas públicas: teoria e prática. Belo Horizonte: PUC-MG, 2012a.