Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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TEMA: PERFIL VOCACIONAL E APTIDÃO DOS ESTUDANTES DE MEDICINA, DE UMA UNIVERSIDADE FEDERAL, PELA MEDICINA DE FAMÍLIA E COMUNIDADE
JOAO VITOR GALO ESTEVES, Carlos Eduardo Aguilera Campos, Ana Laura Brandão, Fernanda Pereira de Paula Freitas, ALINE CARDOSO LINS

Última alteração: 2015-10-27

Resumo


Apresentação No Brasil, desde a criação da Estratégia Saúde da Família (ESF) cerca de 55 mil equipes foram credenciadas, mas o número de equipes é aquém das necessidades. Entre as causas para a falta de médicos na ESF estão a formação inadequada dos profissionais, a baixa procura dos médicos pela especialidade e a falta de recursos e de compreensão dos gestores sobre a Atenção Básica. A dificuldade em completar equipes de Saúde da Família com médicos de família com a especialidade pode ser proveniente, dentre outros aspectos, do baixo número de graduandos interessados em exercer a MFC no futuro. A especialidade MFC tem seu próprio campo teórico que vai gerar determinadas competências, habilidades e ferramentas de atuação. Estas devem ser ensinadas, desde a graduação, para se alcançar uma boa performance profissional. Esta clínica exercida de forma multidimensional é talvez a principal característica que diferencia a MFC da grande maioria das especialidades. Para que o ensino desta especialidade se dê de forma satisfatória é necessário que as condições de ensino, nas universidades, abranjam também este caráter multidimensional, e não estejam apenas centradas no diagnóstico biomédico. Este representa o grande desafio do aparelho formador médico no Brasil e no mundo (Olesen, 2003). Um conjunto importante de escolas médicas no Brasil e no mundo buscam adequar seus conteúdos curriculares para suprir a APS com este especialista (Gonçalves, 2009). Segundo a experiência de médicos da ESF, muitos alegam não ter sido dado destaque a capacitação para exercer a APS na graduação (Gonçalves, 2009). Quando ocorriam era em uma carga horária irrisória com relação ao total do curso. Existem dois importantes desafios para os profissionais que atuam na APS: a grande abrangência do trabalho e a necessidade de uma abordagem multidimensional ou biopsicossocial (Gonçalves, 2009). Avaliando o processo de ensino médico nos Estados Unidos, Bland et al. (1995) encontraram que estudantes de medicina predominantemente entram na escola médica com a preferência por carreira em APS, entretanto, esta vai diminuindo ao longo do tempo. O estudo concluiu também que a obrigatoriedade de estágios e o tempo de estágio na APS, com experiências longitudinais longas, de mais de um ano de duração, estavam fortemente relacionados à escolha dos estudantes pela APS. O referido estudo recomendou as seguintes medidas para aumentar o número de formandos na especialidade nos EUA, quais foram: criação de departamentos acadêmicos em medicina familiar; mudança de cultura da escola médica, valorizando a APS; mudar a política de admissão de alunos, incluindo tipo e composição de bancas por Médicos Familiares; aumentar o número de clínicas aptas a receber o aluno em tempo integral, estabelecer estágios longitudinais em APS; obrigatoriedade de estágio em APS no terceiro ano; e estabelecimento de um programa de aconselhamento vocacional com acompanhamento e avaliação de impacto. (Blandet al., 1995). Segundo Romano (2008), os MFC pesquisados valorizaram o vínculo e a humanização da relação médico-paciente, considerados assim, como uma prioridade. A maioria dos médicos relatou sentir-se pouco seguro ou totalmente inseguro diante de “conflitos psicológicos” como demanda. O que os interessou na MFC foi a ideologia do trabalho, com enfoque na prevenção, na prática generalista, na ampliação do olhar, para além da doença. Além disso, Vieira (2015) entrevistou egressos de cursos de medicina de instituições de ensino localizadas no estado do Rio de Janeiro que optaram pela formação e atuação na MFC. A análise documental de currículos e os projetos pedagógicos assim como as entrevistas apontaram para a frágil contribuição da graduação em medicina para a sensibilização dos futuros médicos quanto à escolha e atuação futura na MFC. (Vieira, 2015). Considerando o exposto, o objetivo do trabalho é avaliar o perfil vocacional de estudantes de medicina segundo características ligadas à prática da Medicina de Família e Comunidade (MFC) e os motivos de interesse e desinteresse em seguir esta especialidade e compará-lo à literatura internacional. Desenvolvimento do trabalho Neste sentido, a principal metodologia adotada no trabalho foi a aplicação de um questionário de auto resposta em estudantes do 6º ano de medicina, concluintes do curso em 2015. O questionário foi constituído a partir de atributos, características ou aspectos pessoais considerados ideais para o exercício desta especialidade, a partir das seguintes fontes: Ministério da Saúde do Brasil; Princípios da Medicina Familiar definidos na literatura por docentes de MFC europeus e norte-americanos e revisão bibliográfica com artigos que abordaram o mesmo tema. O questionário continha 20 questões sobre características relacionadas ao desempenho da MFC, e duas questões abertas a respeito do interesse e desinteresse pela especialidade. Estas questões refletem a auto percepção do aluno sobre a respectiva característica. Cada questão foi formulada como uma afirmativa, a qual o aluno deveria atribuir uma nota de 1 a 5, segundo a escala de Linkert. Sendo 1, “Discordo Completamente”, e 5, “Concordo Completamente”. Desta forma, a pontuação final atingida pela soma das respostas tem o valor máximo de 100. Os dados foram tabulados e analisados e as questões abertas foram listadas. Resultados e/ou impactos Foi observado que somente 15% (n=136) dos estudantes afirmaram ter interesse em cursar a especialidade. A pontuação média atingida pelo total de alunos foi de 72,7 ± 10,1, indicando uma amostra bastante dispersa. Neste sentido, foram destacadas as características mais ligadas à prática da Medicina em geral, enquanto atributos comuns, de forma geral, aos estudantes de medicina e médicos, tais como: “Tenho interesse de saber e aprender coisas novas ou desconhecidas”, “Tenho Pensamento Crítico”, “Respeito e valorizo o trabalho de outras categorias profissionais da saúde”. Contudo, analisando somente os alunos que afirmaram ter interesse pela especialidade, percebemos pontuação média de 81,2 ± 6,34, revelando uma amostra com padrão de resposta mais coeso. Desta forma, observamos que características mais ligadas à prática da MFC destacam-se nas respostas destes indivíduos, tais como: “Tenho sensibilidade para as questões sociais”, “Gosto de trabalho social e comunitário”, “Costumo valorizar os aspectos culturais do processo saúde-doença”, “Costumo valorizar os aspectos emocionais do processo saúde-doença”. Este dado revela que este grupo possui atributos comuns aos indivíduos pertencentes, e que estas se destacam frente às características gerais de médicos e estudantes de medicina. Além disso, as características que se destacaram dentre os alunos que possuem interesse em cursar a MFC são amplamente citadas na bibliografia existente. Considerações finais Desta forma, buscamos identificar características pessoais ligadas ao perfil vocacional para a MFC, bem como possíveis motivos de interesse e/ou desinteresse pela especialidade. Neste sentido, pudemos observar que os estudantes que manifestam interesse pela MFC possuem perfil vocacional distinto do corpo de alunos de uma forma geral, e também apresentam características pessoais que favorecem a atuação e/ou escolha pela especialidade. Os resultados deste estudo podem constituir importantes norteadores para o ensino e a prática da MFC nas Faculdades de Medicina, uma vez que apontam quais os atributos e características que podem ser aprimorados entre os estudantes de forma a desenvolver uma maior aptidão e interesse pela especialidade. A necessidade de estágios curriculares mais intensos e prolongados de forma a aumentar a aquisição destes atributos seria também necessária uma vez que estes estágios aumentariam o contato dos alunos com os especialistas e docentes em MFC. Além disso, faz-se necessária também a análise qualitativa dos motivos apontados pelos discentes para escolher ou não atuar dentro da especialidade.

Palavras-chave


Educação Médica; Medicina de Família e Comunidade; Especialidades Médicas

Referências


Bland CJ, Meurer LN, Maldonado G. Determinants of primary care specialty choice: a non-estatistical meta-analysis of the literature. AcadMéd. 1995; 70 (7):620-41.

Gonçalves, Rebeca Jesumary, et al. "Ser médico no PSF: formação acadêmica, perspectivas e trabalho cotidiano." Rev bras educ med 33.3 (2009): 382-92.

Olesen F. A framework for clinical general practice and for research and teaching in the discipline.Family Practice. 2003; 20: 318–323.

Romano, Valéria Ferreira. "A busca de uma identidade para o médico de família; In searchofidentity for thefamilydoctor." Physis (Rio J.) 18.1 (2008): 13-25.

Vieira, Swheelen de Paula. Abordagem da atenção básica nos cursos de graduação em medicina : o panorama do estado do Rio de Janeiro. 3. Orientadora: Celia Regina Pierantoni. Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Medicina Social. Rio de Janeiro, 2015. 163pág.