Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Docência com foco nos encontros de aprendizagem: ensi-g-namentos nas Residências em Saúde
Daniela Dallegrave, Ricardo Burg Ceccim

Última alteração: 2015-10-27

Resumo


Apresentação As Residências em Saúde são programas de educação pelo trabalho para profissionais da saúde. No Brasil, não há currículo para este tipo de formação. Nas práticas pedagógicas realizadas nestes programas, observa-se que os signos do trabalho em saúde produzem aprendizagens e conformam os encontros de aprendizagem. Esses encontros de aprendizagem são tomados como potencialidades de produção de aprendizagens inscritas no corpo, aquelas que provocam marcas e produzem ensinamentos. Neste trabalho, a escolha por utilizar a grafia ensinamentos está embasada em Deleuze (2010) e refere-se ao entendimento dos signos do trabalho em saúde como capazes de produzir aprendizagens singulares. Esta grafia fala da possibilidade de abertura de espaços ao protagonismo destes signos, mas também da possibilidade de que eles escorram e saiam da cena de ensinagem a qualquer instante. Os saberes aqui reunidos são fruto de uma tese de doutorado em educação defendida na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Brasil) no ano de 2013 e intitulada “Encontros de aprendizagem e governa mentalidade no trabalho em saúde: as Residências no País das Maravilhas” (Dallegrave, 2013). Um dos objetivos foi reunir um conjunto de elementos a fim de sistematizar e construir aporte teórico para o conceito de encontros de aprendizagem nas Residências em Saúde. Desenvolvimento do trabalho O desenho de pesquisa contou com a análise das normativas vigentes no Brasil sobre as Residências em Saúde, seu entrelaçamento com conversas com participantes dos Encontros – Gaúcho e Nacional – de Residências e do Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva, eventos ocorridos em 2012. Acolheu também manifestações livres e interessadas em expressar experiências de aprendizagem nas Residências em Saúde. A docência nas Residências em Saúde é realizada por profissionais da assistência ou da gestão em saúde, os quais geralmente não possuem qualquer formação para execução desta tarefa pedagógica (Fajardo, 2011). Estes profissionais são chamados de preceptores e possuem a função de acompanhar outros profissionais durante o programa de Residência. Em geral, o profissional aprendiz (denominado residente) não possui experiência prévia de trabalho na área da saúde, configurando suas primeiras experimentações no mundo do trabalho. Esta função preceptoria, ou seja o acompanhamento como exercício da docência, representa a possibilidade de coletar todas as potências dos encontros de aprendizagens, os quais são capazes de ensinar a pensar modos de cuidar diferentes a cada situação de atendimento realizado pelo profissional residente. Esses encontros de aprendizagens nas Residências aparecem na tese como a possibilidade de violentar o já instituído para produzir novos sentidos ao cuidado. São ainda possibilidades de habitar com amor onde poderia prevalecer uma maquinaria escolar ou os regramentos advindos do trabalho. São possibilidades de furar a instituição, de forçar o vazamento. São, sobretudo,  possibilidades de torná-la suscetível aos prazeres das relações afetivas, dos furacões afetivos que colhem devires do trabalho e devires da aprendizagem. O que há de movimento em cada um deles. O que faz movimentar cada um de nós, presentes na cena de ensinagem. A vontade de potência de cada um multiplicando as possibilidades de ser. De ser-cuidado, de ser-cuidador, de ser-que-ensina-a-cuidar. Os devires emergem dos convites para experienciar (que se presentificam na educação no trabalho). Experienciar novos modos de estar ali, da produção de outros-em-nós, a partir da multidão que já somos. Nesses convites, somos fabricantes intensivos de aprendizagens no mundo do trabalho. É a possibilidade de se surpreender com a multidão que é o outro que está ali junto na cena de cuidado. Resultados e/ou impactos Os encontros de aprendizagem nas Residências em Saúde são constituídos por: 1) uma ética do acompanhamento que se dá na relação entre preceptor e residente; 2) por um acoplamento das potências e capturas da educação e do trabalho e 3) pela possibilidade de produzir projetos pedagógicos singulares em substituição a currículos-programa. A ética do acompanhamento produz os devires do trabalho e da aprendizagem. No acoplamento educação-trabalho nas Residências, as potências de um vão propondo ao outro processos de reflexão e as capturas de um, colocando protocolos para o exercício do outro. Os projetos pedagógicos singulares seriam produzidos no trabalho, com orientação às aprendizagens, assim como aos preceptores/docentes e residentes/alunos. Nesta construção de projetos pedagógicos singulares se considera os indivíduos que estão sendo formados pelas Residências, suas trajetórias individuais, suas necessidades percebidas de formação. E neste contexto não faria sentido a determinação de tempo total para formação (início e fim do curso), nem a definição prévia de um currículo-programa, com disciplinas ou outros modos tradicionais pensados para a educação, como a educação em módulos, ou séries a serem percorridas por um grupo, onde todos deveriam sair com as mesmas competências, para se ter um certo perfil de egressos. Os projetos pedagógicos singulares, em oposição aos currículos-programas em que todos os alunos “recebem” todos os componentes da formação da mesma forma, apresenta sustentabilidade ao se centrar nas aprendizagens e não nos conteúdos. Provoca também reconhecimento de si aos participantes da cena de aprendizagem, isto é, ao preceptor, ao residente e também a quem está sendo cuidado. É com o trabalho que a aprendizagem acontece, construindo autonomias e produção de perguntas e problematizações onde no currículo-programa estão localizados os conteúdos. O projeto pedagógico singular seria, então, um conjunto de ações pedagógicas, um arranjo gestor e operador da aprendizagem, resultante de discussão e construção coletiva, protagonizadas pelo sujeito que está na condição formal de aprendiz – o residente – e com a proposta de ultrapassar os saberes já sedimentados. Considerações finais A proposta de um projeto pedagógico singular, em que fossem possíveis trajetórias individuais de aprendizados, itinerários formativos e desafios ao pensamento, com organização de currículos singulares, provocação e questionamento a serviço do aprender, “narraria” um currículo de saberes a serem adquiridos.

Palavras-chave


Residência em Saúde; Saúde Coletiva; Avaliação de Tecnologias Educacionais em Saúde

Referências


Dallegrave, D. (2013). Encontros de aprendizagem e governamentalidade no trabalho em saúde: as Residências no País das Maravilhas. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Deleuze, G. (2010). Proust e os signos. Traduzido por Antônio Piquet e Roberto Machado. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária.

Fajardo, A. P. (2011) Os tempos da docência nas Residências em Área Profissional da Saúde: ensinar, atender e (re)construir as instituições-escola na saúde. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul.