Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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EDUCAÇÃO POPULAR E PAULO FREIRE: CONTRIBUIÇÕES JUNTO AO PROGRAMA CUIDAR BRINCANDO
DANIELA DE OLIVEIRA SOARES, AUDREY MOURA MOTA GERONIMO, RAFAEL MOSHAGE THOMA, ROSA LUCIA ROCHA RIBEIRO, GENECILIA APARECIDA DE ATAÍDES LACERDA

Última alteração: 2015-10-19

Resumo


Apresentação: Trata-se de reflexão sobre a experiência da pedagogia de Paulo Freire durante oficina da capacitação de novos educadores do Programa Cuidar Brincando no ano de 2013. O Programa Cuidar Brincando é uma ação de extensão desenvolvida pela Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) que já perdura 10 anos e tem como finalidade promover o direito das crianças e adolescentes hospitalizados. O principal cenário é o Hospital Universitário Júlio Müller, mas também atua na defesa dos direitos das crianças e adolescentes hospitalizadas na rede hospitalar de Cuiabá. Conta com a participação de estudantes (graduação/pós-graduação), docentes, voluntários, servidores da UFMT e parcerias. O Programa se fundamenta em teorias, práticas, tecnologias, legislações e metodologias que auxiliam a construção da autonomia e cidadania dos usuários de saúde, em especial das crianças, adolescentes e familiares. Dentre os seus fundamentos, destaca-se a pedagogia de Paulo Freire, que tem como proposta central trabalhar a educação como um instrumento de libertação, um processo de conscientização e empoderamento. Desenvolvimento do trabalho: Em dezembro de 2013 foi realizada uma oficina de capacitação para novos educadores do grupo, tendo sido designada a tarefa de apresentação da pedagogia de Paulo Freire como apoio teórico do Programa. Utilizou-se a metodologia ativa como forma de aprofundar os conhecimentos teóricos acerca da temática, do desenvolvimento do senso crítico e consequente processo de empoderamento que o mesmo proporciona a partir da conscientização. A atividade foi iniciada com um momento de valorização de pessoas que se destacaram pela trajetória de vida em busca da conscientização e transformação do indivíduo em prol de um coletivo, citando-se Paulo Freire, Betinho, Zilda Arms, Irmã Doroty, Chico Mendes, Nelson Mandela, Martin Luter King. Em seguida, as atividades foram divididas em cinco momentos bem definidos, que visavam promover o empoderamento dos envolvidos. No primeiro foram apresentadas imagens dos protestos populares de junho de 2013, realizando-se os seguintes questionamentos: “o que fica forte dessas passeatas para você?”, “acredita que elas promoveram alguma mudança?”, “onde você poderia fazer a diferença?”. Pretendia-se desvelar o que cada um pensava a respeito dos acontecimentos que marcaram o país, direcionando para o senso crítico de cada participante. No segundo momento, apresentou-se o vídeo “Analfabeto político”, de Bertold Brecht e se questionou a respeito do papel da política na vida de cada um e de todos os segmentos sociais, sobre o que é uma postura política e se identificavam algumas questões que se tivesse havido alguma posição crítica poderia ter mudando o resultado final. O terceiro momento foi composto por trecho de um filme que visava transmitir uma contribuição na conscientização da existência de uma estrutura social da qual somos partes e, estando inseridos nela, a influenciamos mediante nossos atos, individual ou coletivamente. Para tanto, partiu-se dos seguintes questionamentos: “o que você faz para mudar algo que não o agrada?”, “você procura sempre atender às determinações, mesmo que não concorde com elas?”, “qual a sua colaboração no contexto coletivo?”, objetivando uma reflexão de que mesmo sendo indivíduos dotados de valores e crenças características, somos parte de um coletivo e o influenciamos pelo simples fato de fazer parte dele. O quarto momento trouxe a pedagogia de Paulo Freire de forma esquemática, sendo montada na medida em que se foi explicando, desvendando toda a proposta metodológica. Buscou-se uma forma sintética explicar o que para muitos parecia ser incompreensível e complexo. Foi na simplicidade que se tentou alcançar a compreensão. O quinto e último momento foi para mostrar a importância de cada um na luta coletiva, realizando uma retrospectiva do aprendizado e retorno com as palavras que foram sendo construídas a partir desse processo como um todo, encerrando-se a capacitação conforme o planejado. Impactos: Constatou-se que tal processo tanto favorece a autonomia do indivíduo, quanto promove o despertar de sua curiosidade, estimulando as tomadas de decisões individuais e coletivas, levando-o a se assumir e se entender como parte de um coletivo. Nesse contexto, a metodologia da problematização de Charles Maguerez norteou os trabalhos, já que é baseada na participação ativa dos sujeitos e que considera o contexto de vida, sua história e as experiências dos envolvidos, valorizando e considerando o ritmo de aprendizado individual de cada um. O principal desafio assumido para a capacitação foi transmitir a metodologia de Paulo Freire de modo que os participantes entendessem que as mínimas ações cotidianas representam decisões políticas, precisando ser críticas e postas em prática, concretizadas. Conscientizar-se que existe uma estrutura social da qual se é parte, onde os atos a influenciam tanto individual, quanto coletivamente. A forma como cada um busca mudar o que não o agrada, é reflexo de sua bagagem política, do aprofundamento do senso crítico e do nível de empoderamento. Deve-se observar o valor da memória coletiva, da comemoração, dos rituais, dos símbolos e dos conteúdos, reconhecendo a importância da historicidade de um povo. Paulo Freire alicerçava seu pensamento na certeza da capacidade humana de construir, reconstruir, desconstruir e tornar a construir o conhecimento, ressaltando que uma mudança real na sociedade se daria justamente por meio da reflexão, defendendo como pilares de sua filosofia a conscientização e o diálogo, de forma reflexiva e participativa, mediante a escuta autêntica de modo a possibilitar o desenvolvimento da criticidade, da liderança e da autonomia. A conscientização significava uma abertura à compreensão das estruturas sociais como possíveis modos da dominação e da violência. Pregava uma metodologia que não visava ensinar o indivíduo apenas a repetir palavras, e sim a dizer sua palavra de modo a assumir conscientemente sua essencial condição humana, ressaltando a necessidade de mudança de uma consciência ingênua ou intransitiva, fruto de uma sociedade fechada, agrária e oligárquica, para uma consciência crítica, fator primordial ao engajamento ativo no progresso político e econômico do país. O processo de conscientização em si já representava uma possibilidade de mudança social ao reconhecer que leva a uma mudança de postura, saindo do individualismo e chegando a uma postura coletiva, grupal, reconhecendo na relação entre os homens uma forma de liberdade que nunca poderia ser alcançada baseada no individualismo. A natureza coletiva do ser humano lhe possibilitava viver a verdadeira liberdade. Partiu-se no decorrer de todo o processo dos conhecimentos que cada um dos participantes já possuía, socializando-os, da mesma forma que a atividade foi finalizada refletindo o aprendizado no decorrer dos momentos propostos, tornando-os conscientes da aprendizagem e da sua própria capacidade de análise da realidade, evidenciando que ora se aprende, ora se ensina, em um processo de ir e vir que qualifica a conscientização resultante. Considerações finais: Ao se acreditar que o conhecimento é capaz de transformar as pessoas, admite-se que estas são realmente capazes de transformar o mundo. Como uma das premissas mais básicas da educação que é tornar o indivíduo o agente em um ambiente tão repleto de variáveis, pode-se afirmar que o desenvolvimento do senso crítico é essencial nesse processo. A prática é dotada da capacidade de transformar a realidade, levando o indivíduo a ser verdadeiramente livre, residindo na atitude de cada um enquanto ser político, a chave para mudar o que não está de acordo com os princípios de igualdade, liberdade e justiça. Trata-se de um exercício diário que torna possível mudar consciências, aprofundar práticas, conduzindo para um reposicionamento do seu papel enquanto cidadão.

Palavras-chave


Educação Popular; Paulo Freire; Programa Cuidar Brincando.

Referências


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