Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

Tamanho da fonte: 
FORMAÇÃO POLÍTICA COMO FERRAMENTA TRANSFORMADORA DE UMA PROFISSÃO: A REALIDADE DA ENFERMAGEM DESDE A ACADEMIA
AUDREY MOURA MOTA GERONIMO, RENATA ITO DE ARAUJO, BRUNA PAESANO GRELLMANN, DANIELA DE OLIVEIRA SOARES, RAFAEL TEIXEIRA FERNANDES, LHAYS SILVA BARROS, IRIAN VICTOR RIOS DE AZEVEDO, KARINE SAMARAH PEREIRA CAMPOS

Última alteração: 2015-10-22

Resumo


Falar sobre política e politização remete a uma resistência que é cultural para o brasileiro. Tal posição reflete tanto o grau de maturidade, quanto a falta de identificação advinda do distanciamento desses tópicos com a prática de cada indivíduo no decorrer de sua vida. Todo ato humano, individual ou coletivo, representa uma escolha política, mesmo quando essa decisão seja a de não decidir, permitindo que impere preconceito, arrogância e falta de diálogo quando se trata de política. Além disso, já há mais de uma década vem se descortinando um processo de reorientação da formação do profissional em saúde, visando uma aproximação das demandas do Sistema Único de Saúde (SUS), agregando a concretização dos princípios doutrinários e organizativos do mesmo. A formação do enfermeiro deve estar centrada em criar profissionais generalistas, críticos, reflexivos, capazes de aprender a aprender e de atender às necessidades de saúde da população atendida, sem perder de vista os princípios que regem o SUS. Tal formação exige também estar pautada no desenvolvimento de competências, que o habilite a uma atuação inegavelmente ampla. Por representar a maior força de trabalho em saúde, a Enfermagem se destaca, tendo sob sua responsabilidade o cuidado direto e integral de pacientes em todos os níveis de atenção e ações em saúde, capacitando-a a auxiliar efetivamente nas transformações que essas novas demandas exigem. Dessa maneira, sua formação precisa extrapolar os muros da academia e dos serviços, rumando ao encontro de uma compreensão tanto da história do país, quanto da própria profissão e do SUS como um todo, o que essa conquista representa para a saúde e para o povo brasileiro. Tal realidade requer que a Enfermagem e o SUS tenham profissionais que lhe sejam comprometidos cotidianamente com o indivíduo e suas necessidades, bem como com toda a história que garantiu sua conquista. Assim, este trabalho é um relato de experiência que enfatiza a importância da formação política como ferramenta para contribuir nas mudanças que a categoria de Enfermagem necessita desde a formação acadêmica, mediante vivência como membros do Diretório Acadêmico de Enfermagem (DAENF) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), campus Cuiabá. Fez-se uso da Metodologia da Problematização de Charles Maguerez, através do Método do Arco, baseada na participação ativa dos sujeitos e que considera o contexto de vida, a história e as experiências dos envolvidos, valorizando e considerando o ritmo de aprendizado individual de cada um. Busca-se, em especial, o desenvolvimento do senso crítico e consequente processo de empoderamento que o mesmo proporciona a partir da conscientização. Tal processo tanto favorece a autonomia do indivíduo, quanto promove o despertar de sua curiosidade, estimulando as tomadas de decisões individuais e coletivas, levando-o a se assumir e se entender como parte de um coletivo. O resultado é um futuro profissional da enfermagem consciente e crítico, capaz de transforma a realidade de sua categoria profissional. Quando se entra no ambiente acadêmico, torna-se inevitável ouvir, falar, interagir politicamente. Essa realidade não é diferente na Faculdade de Enfermagem da UFMT. Assim, o DAENF, enquanto esfera de representação dos estudantes do curso, acaba sendo um dos caminhos que possibilita dialogar sobre tal temática e todas as esferas e formas de deliberação, representação, exercício da democracia. As dificuldades já aparecem nas relações diárias em sala de aula. O estímulo à reflexão e ao diálogo deve ser uma constante, garantindo a preservação do direito dos acadêmicos de dizer a palavra e o dever do educador de escutá-los. Somente assim se estabelecerá uma escuta autêntica, capaz de representar o falar entre as partes e não somente o falar unidirecional, representando uma maneira de não ouvir. Quando o educador negligencia o direito do educando de dizer a palavra, expondo suas ideias e seu discurso, estará negligenciando a formação de seres políticos, porque é o dizer a palavra que irá diferenciar os homens entre si. Dessa maneira, a formação política precisa estar articulada com a forma de ensino, devendo estimular a reflexão e a criticidade, assumindo-se como uma educação problematizadora, na qual o processo de formação deve ocorrer enquanto construção conjunta entre educador e educando, necessitando imprescindivelmente incorporar o diálogo à prática. Nesse contexto, o educador educa e é educado, assim como o educando ao ser educado também educa. O estímulo ao pensar crítico e à reflexão, além da prática coerente ao discurso, requer um exercício constante e a assunção de modelos de ensino e conduta baseadas na problematização, em contraposição à mera transmissão do conhecimento que minimiza o pensar crítico e a autonomia dos sujeitos. Percebe-se que a falta de prática, exercício do diálogo e criticidade sobre política acabam por prejudicar a mais simples das decisões. Falar sobre uma questão coletiva se choca com os interesses individuais, devendo prevalecer o bem ao grupo, a um coletivo.  Ademais, a formação tem que promover a criticidade, empoderamento e corresponsabilização com as questões que transcendem o indivíduo e envolve toda uma categoria e a sociedade. Frente ao exposto, percebe-se que estar na universidade nada representa se a realidade é esmagada sob a égide de uma estrutura curricular sufocante e contraditória com uma formação libertadora e problematizadora. Torna-se óbvio que o conhecimento é caminho para a transformação, para o desenvolvimento de um pensamento verdadeiramente crítico, livre de amarras e subjugação, evitando a dominação sem escrúpulos que se vê cotidianamente. Aceitar as diferenças é comungar com a diversidade que compõe o povo brasileiro. Todavia, as desigualdades devem ser combatidas, fato que somente com a conscientização será possível fazer frente aos desmandos dos opressores. Os profissionais da Enfermagem precisa se perceber e se assumir enquanto lideranças políticas, fato que promoverá impacto tanto na academia, quanto nos serviços de saúde, garantindo uma mudança estrutural profunda que se refletirá não só no gerenciamento, como também no cuidado e na assistência. Para se alcançar esse nível de “liberdade”, fazem-se necessárias condições que possibilitem transpor o que já está pronto, permitindo que a formação seja verdadeiramente libertadora e transformadora, com cada indivíduo sendo parte atuante desse processo. Não é o papel de mero expectador que possibilitará transformar uma categoria. É necessário se mexer, sair da zona de conforto e transpor o que está pacificado.

Palavras-chave


Enfermagem; Formação política; Metodologia ativa.

Referências


ARENDT, H. A condição humana. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

BATISTA, K. B. C.; GONÇALVES, O. S. J. Formação dos Profissionais de Saúde para o SUS: significado e cuidado. Saúde Soc., São Paulo, 2011, v. 20, n. 4, p. 884-99.

BORGES, T. S.; ALENCAR, G. Metodologias ativas na promoção da formação crítica do estudante: o uso das metodologias ativas como recurso didático na formação crítica do estudante do ensino superior. Cairu em Revista, 2014, Ano 03, n. 04, p. 119-43.

CAMARGO JÚNIOR, E. B.; TEIXEIRA, C. A. B.; SELEGHIM, M. R.; CASTANHO, L. C.; MARTINS, L. M.; BUENO, S. M. V. Reflexão sobre as contribuições de Paulo Freire para a área da Saúde e Enfermagem. Revista Saúde Multidisciplinar, 2014, Ano 1, v. 2, p. 95-107.

CECCIM, R. B.; FERLA, A. A. Educação e Saúde: ensino e cidadania como travessia de fronteiras. Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, 2008, v. 6, p. 443-56.

FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.

__________.  Pedagogia do oprimido. 47. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

__________. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 33. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

MENEGAZ, J. do C; BACKES, V. M. S.;  AMESTOY, S. C. Formação política para fortalecimento de liderança em enfermagem: um relato sobre a experiência. Enfermagem em Foco, 2012, v. 3, n. 4. p. 190-3.