Anais do 12º Congresso Internacional da Rede Unida
Suplemento Revista Saúde em Redes ISSN 2446-4813 v.2 n.1, Suplemento, 2016
HORTA POPULAR BOA ESPERANÇA: UMA ESTRATÉGIA DE PROMOÇÃO DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA
Ana Paula Maia EspÃndola Rodrigues, Ana Claudia Cavalcanti Peixoto de Vasconcelos
Última alteração: 2015-11-02
Resumo
Nas últimas décadas, além das transformações sociais que resultaram em mudanças socioeconômicas, políticas e tecnológicas no país, houve modificações significativas no padrão de saúde e consumo alimentar da população brasileira. Essa realidade contribuiu para a diminuição da pobreza e da exclusão e consequentemente da fome e da desnutrição, porém ainda é expressivo o numero de famílias em situação de insegurança alimentar, vulnerabilidade e risco social, além de que, paralelo a isso ocorreu um aumento do excesso de peso em todas as camadas da população apontando para um cenário em que coexistem a obesidade, as doenças crônicas não transmissíveis, a desnutrição e as doenças oriundas de carências nutricionais em um mesmo espaço. Por isso, é fundamental a realização de propostas sustentáveis e autônomas que abordem a questão alimentar para além do modelo prescritivo e biologicista, através de processos horizontais e dialógicos que promovam a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) e o Direito Humano a Alimentação Adequada (DHAA). Considerando os aspectos socioculturais da alimentação, a horta comunitária consiste em uma potente estratégia de Educação Alimentar e Nutricional. Assim, à medida que aproxima os sujeitos da terra e do alimento consumido, favorece a legitimidade dos saberes e práticas populares, além de proporcionar o acesso a alimentos livres de agrotóxicos e ainda auxiliar na integração entre membros de uma mesma comunidade e destes com a natureza, estimulando a preservação dos recursos naturais, o cuidado ambiental e a sustentabilidade. Nesse contexto, o Programa de Extensão Universitária “Práticas Integrais de Promoção da Saúde e Nutrição na Atenção Básica – PINAB” vinculado aos Departamentos de Promoção da Saúde e de Nutrição da Universidade Federal da Paraíba atua em comunidades no Bairro do Cristo Redentor em João Pessoa-PB desenvolvendo ações de Promoção da Saúde e da SAN, norteado pelo referencial teórico-metodológico da Educação Popular em Saúde, que tem como base o respeito pelas experiências anteriores dos sujeitos, a promoção da autonomia, a troca e a construção de novos saberes com vistas à emancipação humana. Participam do PINAB graduandos de diversas áreas da UFPB e outras instituições de ensino superior, docentes, profissionais de uma Unidade de Saúde da Família (USF) e lideranças comunitárias, que juntos atuam em diversas frentes e/ou Grupos Operativos, tais como: Puericultura, HiperDia, Saúde Mental, Horta Comunitária, Espaço de Diálogo, Escola e Idosos, assim como participam das reuniões de planejamento do Programa e buscam o envolvimento em atividades pedagógicas desenvolvidas no território, como forma de construir, planejar e fortalecer de forma participativa as ações desenvolvidas nas comunidades. Dentre os diversos grupos do Programa, o da Horta Comunitária se destaca na promoção da SAN e do DHAA, visto que mediante as iniciativas em torno da construção e manutenção da Horta Popular Boa Esperança (localizada próxima à nascente do Rio Jaguaribe na comunidade Boa Esperança) aborda, por meio de atividades educativas e lúdicas, o sistema alimentar em sua integralidade, a sustentabilidade, a valorização do alimento e a promoção da autonomia e do autocuidado. Além disso, valoriza os processos ativos e permanentes de educação que incentivam a troca de saberes, o diálogo e a construção compartilhada, como forma de propiciar a inclusão de indivíduos em temáticas de interesse da comunidade, procurando estimular a mobilização social e a busca por melhorias no território. A partir de metodologias participativas com ênfase na problematização da realidade local, o PINAB promove atividades semanais que vão desde o ato de adubar, semear, regar e colher até ações de retirada do lixo, preservação do meio ambiente, atividades educativas envolvendo temáticas como o lixo local e o tempo de degradação dos objetos encontrados próximo à nascente do Rio Jaguaribe, assim como discussões sobre a importância do espaço para os participantes, atividade integrativas como forma de conhecer melhor o outro e oficinas de lambedor, chá e fabricação de sabão. Dentre as dificuldades observadas, ressalta-se a tímida e inconstante participação da comunidade no espaço, devido a algumas questões como: fragilidades socioeconômicas das famílias do território, problemas quanto à segurança pública local e certa descrença, por parte de alguns moradores, quanto às alternativas e possibilidades de transformação social. Além disso, a poluição e o descarte inapropriado do lixo permanecem em áreas circunvizinhas à Horta, uma vez que a coleta urbana não é satisfatória, contribuindo para o deposito de resíduos em terrenos ociosos próximo à nascente do Rio Jaguaribe, o qual se encontra quase que totalmente no perímetro urbano e, por isso, sofre com o descarte de lixo e redes de esgotos clandestinos, sendo mais um foco de poluição na comunidade. Como resultado desse trabalho, evidencia-se a motivação de crianças e jovens no sentido de contribuir com a horta, auxiliando na limpeza e manutenção do ambiente e a participação de mulheres que enriquecem o espaço com novas mudas e ensinamentos populares. Por outro lado, percebe-se o envolvimento dos profissionais da USF do território, que divulgam e incentivam a comunidade a participar e buscar alternativas terapêuticas a partir dos produtos cultivados na Horta, além da utilização de plantas medicinais na produção de chás servidos durantes as reuniões e atividades educativas realizadas pelas equipes de saúde. Ressalta-se a participação ativa e o envolvimento cada vez mais efetivo de estudantes de diversos cursos de graduação em assuntos relacionados a SAN, que anteriormente estava muito vinculada aos alunos de Nutrição do Programa. Nessa perspectiva, tem se valorizado a dimensão interdisciplinar, buscando uma formação mais abrangente, crítica e comprometida com as classes populares. Além disso, o referencial da Educação Popular em Saúde, que orienta as ações do PINAB, contribui efetivamente para a formação de estudantes mais sensíveis e sintonizados com as adversidades e complexidades próprias não apenas das práticas alimentares, mas principalmente da realidade local. Essa abordagem favorece o enfrentamento dos desafios encontrados, uma vez que desconstrói conceitos pré-formados e, de forma crítica, possibilita o dialogo entre os sujeitos e a problematização das situações que incomodam e oprimem. Nessa direção, no contexto da Horta Popular, o Programa vem contribuindo com a construção de estratégias participativas de enfrentamento de condições de desigualdade, fomentando a mobilização para a transformação social, de forma a promover a SAN e o DHAA.
Palavras-chave
Direito Humano à Alimentação Adequada; Segurança Alimentar e Nutricional; Educação Popular
Referências
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica.Básica. – 1. ed., 1. reimpr. – Brasília : Ministério da Saúde, 2013.
VASCONCELOS, A.C.C.P; PEREIRA, I.D.F; CRUZ, P.J.S.C. Educação Popular e a Promoção da Segurança Alimentar e Nutricional em Comunidades: desafios com base em uma experiência de extensão. In: VASCONCELOS, E.M; CRUZ, P.J.S.C. Educação Popular na Formação Universitária: reflexões com base em uma experiência. São Paulo: Hucitec; João Pessoa: editora universitária da UFPB; 2011.
VASCONCELOS, E.M. Educação popular, um jeito de conduzir o processo educativo. In: VASCONCELOS, E.M.; CRUZ, P.J.S.C. (Org.). Educação popular na formação universitária: reflexões com base em uma experiência. São Paulo: Hucitec; João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2011.