Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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O PROGRAMA DE TUTORIA DA UFF E OS PROCESSOS DE SUBJETIVAÇAO PRODUZIDOS A PARTIR DOS ENCONTROS
Daniel Noro de Lima

Última alteração: 2015-10-31

Resumo


APRESENTAÇÃO: O Programa de Tutoria da Universidade Federal Fluminense (PTUFF) instituído desde 2010, tem como principal objetivo a diminuição da evasão escolar, problema comum nos primeiros períodos de diversos cursos de graduação. Deve também, servir como apoio em relação às questões gerais da Universidade como o uso da biblioteca, acesso às instalações e serviços, importância do CR (coeficiente de rendimento) na sua vida acadêmica, entre outras. As atividades desenvolvidas pelo programa podem também apresentar as possibilidades de inserção nas diversas áreas de atuação que o profissional formado pode ter ao concluir o curso, tendo potencial para despertar novos interesses e motivações. A orientação do PTUFF é oferecida por alunos regularmente inscritos em cursos de pós-graduação strictu sensu da própria Universidade, os quais, a partir de agora, apresentam seus relatos das vivências nos encontros proporcionados pela Tutoria com os alunos do curso de odontologia da UFF. (PROGRAD, 2015) DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA E RESULTADOS: Logo no primeiro encontro com a turma do 1º período nos é colocado um desafio. Todos os 32 alunos manifestaram interesse em participar do programa. Em diversas das visitas planejadas há restrição de quantidade de pessoas, pois as estruturas dos serviços muitas vezes não comportam tanta gente. Visto isso, como faríamos para não excluir alunos que poderiam se beneficiar daqueles encontros?  Após discussão de algumas propostas, pactuamos coletivamente fazer um sistema de escalas feitas pelo What´sApp, o que veio funcionar a contento. Após uma breve apresentação da proposta da tutoria, e uma rodada de apresentações e expectativas quanto ao curso, identificamos o segundo e principal desafio: a grande maioria (cerca de 90%) queria fazer medicina, mas passou para odontologia como segunda opção e estavam ali abraçando a oportunidade de conhecer melhor a profissão. Nossa proposta então seria proporcionar encontros onde os alunos pudessem perceber as diversas atividades praticadas pelos odontólogos, discutir os núcleos e campos do conhecimento aos quais estão vinculados, seu papel enquanto profissional de saúde, a produção do cuidado e as diferentes oportunidades de trabalho nos serviços de saúde. Evidentemente, nossas vivências como profissionais e nossas implicações éticas e políticas permeavam as relações tanto com os alunos quanto com os trabalhadores dos serviços que visitamos. Após as atividades, fizemos avaliações onde, tutores e alunos puderam se expressar. A partir de agora, descreveremos sucintamente dois serviços visitados e analisaremos o retorno dado nas rodas de avaliação. O projeto Bom Dia, Boa Noite, desenvolvido sob a forma de extensão no Hospital Universitário Antônio Pedro, tem como proposta levar ao encontro dos pacientes internados a relação com estudantes da área biomédica utilizando a música como meio de expressão e de troca de afetos. Eis algumas falas dos alunos: “Se eu tivesse que descrever a visita em uma palavra, seria “emocionante”. “é como se fosse um remédio que dá uma nova vida a realidade do triste hospital”. “O cuidado transforma a relação entre os seres humanos, tornando-os mais sensíveis e perceptivos”. “Muito além de cuidar da saúde bucal esse projeto me mostrou que cuidarei, primeiramente, de vidas”. “Levar alegria e atenção muda não só o dia de quem recebe como o de quem leva essa alegria.” Refletindo sobre esses relatos, percebemos que houve uma troca de afetos significativa nestes encontros, analisando a partir dos sentidos que nos propõe o Spinoza de Deleuze (2002). Palavras como cuidado, emocionante, alegria, nos revelam que a percepção sobre o trabalho em saúde toma uma dimensão para além dos conhecimentos técnicos e passa primeiramente por uma relação entre pessoas, que quando sensibilizadas permitem afetar o próximo e for afetadas mutuamente. Entendemos que essa sensibilidade também é um conhecimento (SPINOZA, 2004) e deve ser estimulado, desenvolvido e valorizado durante todo o processo de formação na área da saúde. A outra vivência que trazemos para discussão foi à visita ao Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO), hospital de nível terciário de atenção, referência nacional para traumato-ortopedia e para o desenvolvimento de pesquisa na área. Fomos recebido de maneira muito atenciosa pela enfermeira e pela odontóloga designadas para nos acompanhar na atividade proposta. Após breve apresentação sobre a política do SUS, a inserção do INTO na rede de saúde, a descrição de suas atividades de atenção, pesquisa e ensino,  conhecemos as enfermarias e salas de readaptação. Percebemos que os alunos se impressionaram com a estrutura do INTO. Ouvimos alguns ficarem surpresos pelo fato da instituição ser pública: “Parece até um hospital particular”, “Funciona, né?!” Carregam com eles a difundida imagem que o serviço público de saúde não funciona ou é de baixa qualidade. Daí a surpresa quando se deparam com outra realidade que não é vinculada na grande mídia. Percebemos aqui, outro potencial que tem a tutoria. O de produzir desconstruções de territórios instituídos e a possibilidade de produção de novos territórios por meio da aproximação com novas experiências (ROLNIK, 1989) Ao final das atividades foi realizada uma avaliação geral do programa. Nela apareceram mudanças nas percepções iniciais dos alunos. Pelo menos quatro, disseram ter desistido de cursar outra faculdade. Outros manifestaram aumento do interesse pelo curso de odontologia. Um deles demonstrou uma relação de identidade com a Universidade quando diz “Não troco a UFF por nenhuma outra Universidade”. Houve ainda aqueles que elevaram sua autoestima: “Hoje tenho orgulho do que resolvi fazer. Não me sinto diminuída por não fazer medicina.” Podemos dizer também, que surgiram questões relacionadas ao trabalho multiprofissional, afetivo e à produção do cuidado por meio destas falas: “Percebi que o dentista está ligado a muitos outros profissionais”, e “Vi o lado do trabalho humano, e não só a parte prática e técnica”. Por último, apareceram novos olhares sobre o mercado que os aguarda: “A tutoria nos permitiu abrir os horizontes e nos preparar para o que nos espera”, “Serviu para me mostrar esse outro lado da prática”, “Não queria ficar preso no consultório, a tutoria me ajudou a ver outras possibilidades”, e ainda “Não conhecia a possibilidade de trabalhar no SUS. Achei que só tinha consultório”. Contudo, houve alunos que não aumentaram seu interesse pelo curso e pela profissão: “Ainda não me apaixonei pela odontologia”. Isto nos revela que os afetamentos gerados pelos encontros e os processos de subjetivação produzidos são individuais e nem sempre elevam o interesse e a motivação pelo objeto em questão (DELEUZE, 2004). CONSIDERAÇÕES FINAIS: Concluímos a partir do que foi exposto, que o PTUFF desenvolvido com o 1º período da Faculdade de Odontologia apresentou um elevado potencial na produção de subjetividades em todos aqueles que participaram dos encontros. A grande maioria dos alunos, produziu o despertar de novos interesses e possibilidades em relação à profissão, o que contribui com o objetivo inicial do programa de diminuir a evasão nos primeiros períodos da graduação. 

Palavras-chave


Formação, educação em saúde, subjetividade

Referências


PROGRAD - PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO/ UFF. EDITAL Nº 01/2014 - SELEÇÃO INTERNA DE PROJETOS PARA O PROGRAMA DE TUTORIA DO SEGUNDO PERÍODO DE 2014. Acessado pela internet no endereço http://www.noticias.uff.br/noticias/2014/04/edital-tutoria-2-2014.pdf em 14/09/2015.

DELEUZE, G. Espinoza e filosofia prática. São - Paulo: Escuta, 144 p. 2002.

Spinoza, B. Tratado da Reforma da Inteligência/ Benedictus de Spinoza; tradução, introdução e notas de Lívio Teixeira. -2ª Edição. – São Paulo: Martins Fontes, 2004.

Rolnik, S. Cartografia Sentimental. Transformações contemporâneas do desejo, Editora Estação Liberdade, São Paulo, 1989.