Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Movimentos de Educação Permanente em Saúde: Uma pororoca no cotidiano do trabalho
Francijane Diniz de Oliveira, Uememson da silva Soares, Ligiana Nascimento de Lucena, José Guilherme Wady Santos, Ricardo Henrique Vieira de Melo, Nayara Santos Martins Neiva Melo, Antônio Medeiros Junior, Marise Soares Almeida

Última alteração: 2015-10-19

Resumo


Trata-se de um relato de experiência desenvolvido por profissionais de saúde de uma equipe de Saúde da Família (Recife/PE). Iniciado em 2014, o processo de EPS em Movimento do qual tem participado uma das autoras, trouxe reflexões sobre a prática do Agente Comunitário de Saúde (ACS), uma vez que a experiência está pautada na política de educação permanente como propulsora de movimentos capazes de causar mudanças no mundo do trabalho, Isso permitiu a criação de uma caixa de ferramentas para sistematizar o trabalho desse profissional e que, entre outras coisas, tem permitido propor mudanças na dinâmica de visitação domiciliar, uma vez que a frequência da visita domiciliar foi um dos dispositivos trazidos pelos usuários de uma das Unidades Básicas daquela cidade. Tendo o acolhimento como uma de suas finalidades a Equipe de Saúde, por meio da escuta qualificada das necessidades da população, partiu desse dispositivo e mobilizou-se para rever seus processos de trabalho relacionados à questão, pois os usuários demonstraram que os processos instituídos na dinâmica da visita domiciliar do ACS não estavam contemplando suas necessidades, o que abriu interrogações sobre o modo instituído como se opera o trabalho e o sentido de suas ações, naquele equipamento. Desse modo, nos colocamos em análise e, a partir do processo de EPS em movimento que se tem vivenciado, tratando-o como ferramenta pedagógica para produzir cuidado, produzimos encontros (rodas de conversa) entre ACS, enfermeira, residente e graduando em enfermagem, para compreendermos a relação dos ACS com o seu trabalho e os sentimentos despertados por este, tendo como pano de fundo o entendimento de que as respostas paras as questões do mundo do trabalho são respondidas pela análise do cotidiano e em ato. A primeira roda utilizou-se de palavras disparadoras que possibilitassem acessar as questões acerca do tema. Em um envelope continham as seguintes palavras: bom, ruim, me deixa triste, me deixa feliz, em equipe, processo, dificuldades, facilidades. O ACS deveria relacioná-las ao tema trabalho, o que proporcionou uma narrativa pessoal, onde todos expressaram suas afetações e comunicaram seus sentimentos. Os ACS da equipe estão afetados de diversas formas acerca de seu trabalho. Eles trazem a não cooperação dos colegas de trabalho como uma questão principal para as dificuldades do trabalho em equipe, além de considerarem que o compromisso não é parte de todos e isso vai desmotivando-os, aspectos esses que vão de encontro ao modo como o trabalho em Atenção Básica em Saúde deve se pautar, tais como a cooperação mútua, no apoio e no compromisso na produção do cuidado. Sabemos que Trabalhar na Atenção primária é uma tarefa que afeta muito mais o trabalhador, que convive diariamente com grandes dificuldades dos usuários o que também afeta a produção do cuidado, que depende muito da relação construídas entre os envolvidos. No encontro seguinte utilizou-se a “tenda do conto” como ferramenta metodológica de acesso à representação do trabalho como ACS. Assim, a eles foi pedido que levassem para o encontro um objeto que representasse o seu mundo do trabalho. A tenda foi construída com os seguintes objetos: Ficha A, que representou o primeiro contato com a família (a partir da qual esperava-se que ele tomasse conhecimento do que existe em sua micro área, quais os contextos de vida, sociais, de saúde e doença daquela população); o crachá, que representou a identificação com a profissão e com a comunidade para se trabalhar como ACS; O livro de registros, significando o reconhecimento da área, pois o ACS deve ser capaz de conhecer os problemas de sua comunidade, reconhecer as pessoas que lá vivem, manter vínculo, ofertar apoio quando necessário. Após a contextualização do processo de trabalho e levantado os significados deste para os sujeitos do processo, discutiu-se nos encontros seguintes o tema visita domiciliar, uma vez que foi o ruído motivador deste processo. Na perspectiva de acessar soluções para o problema posto, buscou-se refletir sobre como acontecia o momento das visitas domiciliares, tendo como pergunta norteadora: como você faz e prepara a sua visita domiciliar?  Após a conversa, evidenciou-se que as visitas eram realizadas a partir da solicitação dos comunitários. Assim, não existia uma organização e nem uma sistemática das visitas. Provocando com isso iniquidades nestes instrumentos de acesso ao sistema de saúde. Após conversa sobre os objetivos da visita domiciliar, os profissionais perceberam a necessidade de uma certa organização das mesmas, na perspectiva de minimizar os ruídos vindos da comunidade para cumprirem com a sua responsabilidade sanitária. O grupo decidiu criar instrumentos que os orientassem a realizar tal atividade e, então, coletivamente foram elaborados dois instrumentos de visitas: um que demonstra quais famílias foram visitadas durante o mês em uma visualização rápida e, outro, um formulário com uma espécie de roteiro de itens mínimos a ser averiguado durante a visita domiciliar. Inicialmente optou-se por concretizar apenas a segunda ficha. Na ficha contém um desenho de todas as ruas e casas das respectivas micro áreas que são de responsabilidade de cada ACS, possibilitando a visualização da sua abrangência de uma forma simples e completa. Esta ficha é sinalizada por cores em analogia ao semáforo: verde, amarela e vermelha. Durante a visita, o ACS de posse da ficha sinaliza cada residência seguindo a seguinte legenda: verde (casa visitada e não evidenciando problemas), amarelo (casa visitadas, porém encontrava-se fechada), vermelha (casas visitadas e com evidência de problemas) e, por fim, as casas sem visitas no mês ficariam sem sinalização. A ficha foi introduzida em meados de fevereiro de 2015, e por quatro meses os ACS a utilizaram como experiência. Após este período se constituiu mais uma roda de conversa para avaliação de sua utilização. Como produto da avaliação, os ACS construíram um vídeo demostrando como a ficha trouxe mudança no processo de organização da visita. As falas abaixo foram extraídas desse vídeo: “a criação da ficha pela equipe dois merece um troféu. Pois foi uma ideia brilhante” (Acs M03 e 06); “eu não tinha ideia como e quando visitava as casas, algumas casas visitava e  deixava outras de lado. Com a ficha eu sei quando eu visitei ou não alguma casa. Me orientando a não deixar uma família muito tempo sem visita” (ACS M01). Com este relato de experiência desejamos estimular o processo de educação permanente em saúde como reflexão da realidade concreta. Evidenciamos que os ruídos trazidos pela população são um reflexo do distanciamento do caminhar do trabalhado das reais necessidades do usuário.

Palavras-chave


Educação Permanente em saúde; Processo de Trabalho; Recursos Humanos

Referências


BRASIL. Gestão da Educação em Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Departamento de Gestão da Educação em Saúde. – Brasília: Ministério da Saúde, 2009.64 p. – (Série B. Textos Básicos de Saúde) (Série Pactos pela Saúde 2006; v. 9). Disponível em: http://www.saude.es.gov.br/download/PoliticaNacionalEducPermanenteSaude_V9.pdf. Acesso em: 25 Nov. 2014

MERHY, Emerson Elias. O desafio que a educação permanente tem em si: a pedagogia da implicação. Interface (Botucatu), Botucatu, v.9, n. 16, Feb. 2005 .Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-32832005000100015&lng=en&nrm=iso>.Acesso 25  Nov.  2014.  http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832005000100015.