Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Compartilhar, vivenciar: alunos e agentes comunitários de saúde constroem aprendizagem significativa em territórios da periferia de São José dos Campos, SP
Paula Vilhena Carnevale Vianna, Eduardo Guadagnin, João Benício de Almeida, Alessandra Lorenti Ribeiro, Marli Ferronato

Última alteração: 2015-10-22

Resumo


Apresentação: O trabalho apresenta a construção da interação ensino/serviço/comunidade a partir de uma disciplina curricular (Cidadania e Responsabilidade Social) para o primeiro ano dos cursos de biomedicina, nutrição, fisioterapia, odontologia de uma universidade comunitária de um município de grande porte do interior paulista. O município tem rede de atenção primária ampla (43 unidades básicas de saúde) e  implantação recente (um ano) da estratégia saúde da família (ESF). O objetivo é avaliar como a disciplina propiciou a aproximação da universidade com a gestão e dos alunos com o território e prática dos agentes comunitários de saúde. Desenvolvimento do trabalho: A Disciplina de Cidadania e Responsabilidade Social tem como objetivo possibilitar ao aluno reconhecer-se como sujeito portador de direitos com potencial transformador de si mesmo e da realidade social, capaz de criticamente contextualizar e analisar a sociedade e sua inserção nela como sujeito, reconhecendo a saúde como direito e o SUS como instrumento para sua efetivação. A mudança de configuração na rede municipal de saúde, que passou de 3 a 44 Equipes de Saúde da Família em 2014, possibilitou nova inserção dos alunos no campo. Visando uma aproximação que integrasse ensino/serviço de modo diferente do usual, os docentes trabalharam a partir da lógica de que o campo respondesse as necessidades da gestão, das unidades e de aprendizagem dos alunos. O trabalho foi desenvolvido em quatro etapas: a) aproximação com a SMS para discussão e elaboração conjunta da proposta. A SMS explicitou sua expectativa - conhecer como a implantação da ESF estava se dando efetivamente - e indicou as unidades de saúde da família (USF) para o campo; b) Ida da equipe de docentes às três USF selecionadas, acompanhados da articuladora e apoiadoras da atenção primária em saúde (APS). Em reunião com enfermeiros e agentes comunitários de saúde (ACS), dialogaram acerca das expectativas de ambos os lados, entregaram roteiro descrevendo os objetivos da disciplina e acordaram o modo de avaliação do trabalho de campo. Concomitante a esta sensibilização, os alunos foram preparados para a atividade, em encontros didático-pedagógicos reflexivos sobre o conceito de direitos sociais; saúde ampliada; determinantes e condicionantes do processo saúde/doença/cuidado; ESF; forma de aproximação do território e  prática do ACS; c) Os alunos foram a campo, divididos em 3 USF em períodos diferentes, acompanhados dos docentes. Na unidade, foram recebidos pelo gerente, enfermeiros e ACS. Receberam explicação sobre a unidade e a área de abrangência e foram distribuídos, em média 3 alunos por ACS, para acompanharam as visitas domiciliares.  Ao final do período, em espaço comum, preencheram roteiros de avaliação - os ACS avaliaram o interesse, a postura dos alunos e as contribuições do dia para o seu trabalho e os alunos avaliaram a prática dos ACS em relação aos fundamentos da ESF. No retorno à Universidade, os alunos consolidaram as informações obtidas e as impressões vivenciadas no território.  d. Finalização da disciplina: apresentação das experiências, no formato de seminário, com a presença de representantes da gestão e dos serviços na universidade. O consolidado das avaliações foi entregue à SMS e discutido com a equipe de gestão da APS e da EP a fim de orientar outras atividades. Resultados: Cento e vinte e três alunos (22 do curso de biomedicina; 29 de nutrição, 48 de odontologia e 24 de fisioterapia) foram distribuídos em três USF e acompanharam um período de visita domiciliar de 49 ACS (em média, 2 a 3 alunos por ACS). As atividades variaram e incluíram visita a pacientes acamados, orientações relativas à dengue, cadastro de famílias, entrega de exames, visita a gestantes e puérperas, acompanhamento de portadores de hipertensão e diabetes. A avaliação foi respondida individualmente pelos agentes e em grupos pelos alunos. Cem por cento dos ACS afirmaram terem se sentido à vontade na companhia dos alunos (alunos interessados pelo território e pelas pessoas e demonstrando atitude respeitosa, acolhedora,  interativa; em processo de mútuo aprendizado). A totalidade avaliou  que a atividade acrescentou  algo ao trabalho realizado, sendo as respostas agrupadas em quatro categorias: um dia diferente, descontraído; satisfação de poder compartilhar as atividades; percepção positiva e valorativa do próprio trabalho; contribuição para a formação dos alunos (“apresentamos umas às outras os nossos mundos diferentes”). Sugeriram que a atividade fosse mais longa; que houvesse um momento inicial, entre alunos e ACS, para o planejamento do dia; que retornem para continuidade da atividade, fornecendo orientações para os pacientes visitados. Sugeriram que os alunos levem informações à comunidade e que acompanhem as visitas domiciliares com médicos; gostariam de receber alunos dos últimos anos. Os alunos preencheram 53 formulários de avaliação. Os princípios da ESF foram reconhecidos no trabalho dos ACS (territorialização, 100%; foco na família, 98,1%; trabalho em equipe, 92,2%; vínculo entre o ACS e as pessoas visitadas,  96,2%; integralidade das ações, 98,1%), sendo o incentivo à participação social o parâmetro de menor índice, reconhecido em  68,6% das respostas. A partir do observado e estudado, os alunos propuseram como desdobramento da atividade o planejamento de atividades educativas e de prevenção; o acompanhamento das famílias visitadas;  a realização de atividades interdisciplinares voltadas à saúde em sentido ampliado e atividades tecnico-assistenciais (coleta de exames, fisioterapia funcional domiciliar). A apresentação dos resultados revelou, à gestão, informações sobre o cotidiano do trabalho no território, em especial no que se refere ao potencial do trabalho do ACS, suas forças e fragilidades. Considerações finais. A efetivação da EPS ainda se constitui um desafio quanto à integração do quadrilátero gestão/atenção/formação/participação social. As novas diretrizes curriculares e a recente integração entre as ações dos Ministérios da Saúde e da Educação favorecem o desenvolvimento de estratégias educacionais que possibilitem a efetiva integração ensino/serviço/gestão. O estímulo ao uso de metodologias ativas e aprendizagem significativa possibilita mudanças na prática educativa e contribui para que a universidade se aproxime da vivência cotidiana da rede de saúde pública. O presente trabalho demonstra que, apesar dos desafios encontrados, a mudança de paradigma é possível e tem impacto positivo para ambos os lados, ensino e serviço.  O planejamento pedagógico reflexivo e articulado à gestão contribuiu para a acolhida dos alunos na unidade e para uma postura aberta, respeitosa por parte dos alunos, que apresentaram olhar sensibilizado para o fazer dos ACS e para a dinâmica do território. A avaliação foi positiva de ambas as partes. A aproximação com os agentes mudou a visão dos alunos sobre o que é a vida na singularidade de cada território, revelando a cidade como um mosaico, que influencia os modos de viver e adoecer. Outro ponto salientado foi a mudança na visão dos alunos sobre a rede pública de saúde e, especialmente, a importância do trabalho dos agentes. Os ACS, por sua vez, se sentiram valorizados, reconhecendo a importância de sua prática pelo olhar dos estudantes, ressignificando, assim, o seu trabalho. O relatório da atividade possibilitou à gestão conhecer a efetivação da ESF a partir de um olhar externo. Os caminhos traçados abriram portas para a realização de atividades integradas, que canalizem os desejos despertados em alunos, agentes comunitários, profissionais, docentes e gestores para a reflexão e construção de práticas significativas do cuidar.

Palavras-chave


educação permanente em saúde; aprendizagem significativa; estratégia saúde da família

Referências


BRASIL, Ministério da Educação (MEC), Conselho Nacional de Educação (CNE)Parecer Nº: CNE/CES 0104/2002 13/03/2002. Recomenda a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação emBiomedicina. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0104.pdf>. Acesso em: 25/06/13

BRASIL, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Básica, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional da Atenção Básica. Série Pactos pela Saúde. Vol. 4. Brasilia, 2006

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MERHY, Emerson Elias; ONOCKO, Rosana. (Org.). Agir em Saúde: um desafio para o público. São Paulo: Hucitec, 1997. p. 71-112