Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Relato de experiência Concurso de Culinária da Velha – Sabores Tradicionais e Culturais
Mariana Campos Martins Machado, Renata Szpak Rodrigues, Letícia Pereira Zancanaro, Aline Luisa Mafra, Maristela Rodrigues Zancanaro, Maria Urânia Alves, Alessandro Guedes, Karla Ferreira Rodrigues

Última alteração: 2015-11-04

Resumo


Apresentação: O incentivo à alimentação adequada e saudável é parte integrante das principais políticas de saúde no Brasil, como o “Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022” (BRASIL, 2011) e a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (BRASIL, 2012a). A Educação Alimentar e Nutricional, através da educação popular em saúde, deve buscar o resgate, valorização e incentivo aos saberes culinários tradicionais da população brasileira (BRASIL, 2012b). No dia 15 de agosto de 2015 ocorreu o Segundo Saúde na Praça na Praça Cirilo Theiss, ao lado do Ambulatório Geral (AG) Haroldo Bachmann, evento realizado pela equipe do próprio AG, em parceria com o Programa de Extensão Liga da Saúde Coletiva, da Fundação Universidade Regional de Blumenau. O objetivo do evento foi fortalecer e valorizar a diversidade cultural do bairro da Velha, em Blumenau (SC). Entre as atividades desenvolvidas no Saúde na Praça esteve o Concurso de Culinária da Velha – Sabores Tradicionais e Culturais, que foi organizado com o objetivo de resgatar, fortalecer, valorizar e incentivar as práticas culinárias tradicionais das diversas identidades culturais presentes na comunidade envolvida. Desenvolvimento do trabalho: O Concurso foi lançado em atividade desenvolvida pelo Projeto de extensão “Desatando os Nós da Velha Grande” na Unidade Básica de Saúde Arão Rebelo, onde ocorrem encontros mensais com o grupo de puericultura - composto por mães e cuidadoras de lactentes. Em roda de conversa sobre as preparações culinárias, realizada no mês de junho de 2015, foi feita a proposta de realização do Concurso de Culinária no bairro, no dia do Saúde na Praça. Posteriormente, houve roda de conversa sobre alimentação saudável com grupo de mulheres da Velha, onde a comunidade foi novamente convidada e incentivada a participar do Concurso. É importante destacar que este grupo de mulheres é extremamente envolvido nas ações desenvolvidas na comunidade, participando ativamente das construções coletivas em saúde. O concurso contou com três juradas voluntárias. A primeira, representante da comunidade, foi uma senhora envolvida no grupo de mulheres da comunidade e em diversos movimentos da sociedade civil organizada do município. A segunda, chefe de cozinha e professora do único curso de graduação em gastronomia do município. E a terceira, dona de um restaurante tradicional do município. Somente foram aceitas inscrições de preparações que representassem a culinária tradicional e as diversas manifestações culturais da população. Não foram permitidos os alimentos industrializados, como: leite condensado, creme de leite, chocolate, margarina, alimentos com corantes e conservantes, gelatina, temperos e molhos prontos industrializados, carnes processadas industrializadas e preparações que não fossem da cultura alimentar da comunidade local.   Resultados e Impactos As rodas de conversa realizadas antes do Concurso possibilitaram espaço para o processo de escuta e reflexão sobre o conhecimento prévio das pessoas sobre a alimentação. Através de problematização e reflexão sobre as práticas alimentares da comunidade, ocorreram atividades educativas horizontais, valorizando a partilha de saberes populares, e a sua interface com os saberes dos profissionais de saúde (BRASIL, 2014). Participaram do concurso quatro concorrentes, e as preparações apresentadas foram: coxinha de frango com massa de aipim, panqueca de brócolis com carne moída e molho de tomate, bolinho integral, bolinho de alface. A participante que levou a preparação coxinha de frango com massa de aipim trouxe a receita de Rondônia, o que representa a diversidade cultural do Bairro da Velha, que acolhe migrantes de diversas regiões do País, e imigrantes de outros países. A representante que levou a preparação bolinho de alface relatou ser uma tradicional receita de família, e que sua mãe preparava este alimento em situações de restrição alimentar, em períodos de dificuldades econômicas. Esta preparação demonstra a criatividade da população brasileira diante de escassez alimentar, que assolou o país por tantos séculos. A participante que levou a panqueca de brócolis com carne moída e molho de tomate também relatou este preparo em circunstâncias de insegurança alimentar e nutricional devido à falta de acesso aos alimentos. A participante que levou o bolinho integral relatou preocupação com a qualidade de vida, e a busca de alimentação saudável e alternativa aos alimentos industrializados presentes no mercado, ricos em sódio, conservantes, aromatizantes e realçadores de sabor. Quando se trata de alimentação, as percepções são impregnadas de significados emocionais, sociais e culturais que precisaram ser conhecidos e respeitados. Durante a realização do Concurso, pôde-se perceber claramente estas significações para as participantes e a comunidade envolvida. Assim, percebe-se que o Concurso ofereceu a possibilidade de reflexão e diálogo sobre as práticas alimentares da comunidade, e estimulou a interação entre os envolvidos. A alimentação humana vai além do biológico, é um fenômeno social e cultural, e assim existem diversos sistemas alimentares, constituídos a partir de fatores ecológicos, históricos, culturais, sociais e econômicos. Neste contexto, destaca-se a construção de identidades socioculturais, em que a comida assume-se como um elemento cultural, que pode se transformar em um marcador identitário, utilizado pelo grupo como “símbolos de uma identidade reivindicada” (MACIEL, 2005, p.52). Considerações finais: O Concurso de Culinária caracterizou-se em excelente espaço para diálogo entre os saberes populares e o serviço de saúde. Houve envolvimento, participação e motivação da comunidade, aproximando o saber científico do saber prático, considerando que o início de todo trabalho educativo é conhecer onde o outro está.

Palavras-chave


Educação popular em saúde; Participação social; Educação alimentar e nutricional; Identidade alimentar; Concurso de culinária.

Referências


Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. II Caderno de educação popular em saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. 224 p.

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-2022. Brasília : Ministério da Saúde, 2011. 148 p. : il. – (Série B. Textos Básicos de Saúde)

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Brasília: Ministério da Saúde, 2012a. 84 p. : il. – (Série B. Textos Básicos de Saúde)

Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Marco de referência de educação alimentar e nutricional para as políticas públicas. Brasília, DF: MDS; Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, 2012b.

MACIEL, M. E. 2. Identidade Cultural e Alimentação. In: Canesqui, A. M. ; GARCIA, R. W. D. G. (org.). Antropologia e nutrição: um diálogo possível. Coleção Antropologia e Saúde. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2005. 306p.