Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Formação Médica: contemplando e utilizando os campos do SUS
Carolina Klaesener, Vanderleia Laodete Pulga, Amanda Tamara Souza, Patricia Aline Vivian

Última alteração: 2015-11-02

Resumo


A partir de 2013, no Rio Grande do Sul, após passar em um vestibular concorrido de medicina nos vimos dentro de uma proposta inovadora, que nos incentiva a estudar e trabalhar dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). Já na primeira semana de aula fomos desafiados a conhecer a estrutura e o funcionamento de uma equipe multidisciplinar em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do interior. Após todo um semestre de estudos interligando sala de aula e UBS, fomos instigados a formular projetos intervencionistas que colaborassem com a melhora do serviço de saúde naquela comunidade. Após um semestre de convivência semanal com a equipe da UBS e com a comunidade local, através de conversas, acompanhamento de reuniões, ida até os mais diversos locais de trabalho e troca de ideias, identificamos dois campos com dificuldades em realizar o seu trabalho: as agentes comunitárias de saúde e o Conselho Municipal de Saúde. A partir disso, com a ajuda dos professores da disciplina de Saúde Coletiva iniciamos um longo estudo sobre a função dessas duas áreas de fundamental importância para o bom andar da saúde local. O primeiro trabalho foi desenvolvido com as agentes comunitárias em saúde. Através de vários encontros com elas, percebemos um sentimento amplo de desvalorização, de falta de ânimo para desenvolver o trabalho adequadamente e também falta de capacitações mais frequentes sobre como abordar temas atuais como as doenças sexualmente transmissíveis e a homossexualidade, principalmente por se tratar de uma comunidade localizada no interior do Rio Grande do Sul, onde o preconceito e o receio a certos temas ainda são muito prevalentes. Com isso, preparamos dois encontros basicamente motivacionais e esclarecedores. No primeiro, com uma roda de conversa, fomos abrindo espaço para que elas desabafassem nos contassem seus medos, seus receios, suas dificuldades diárias e com isso ampliamos muito nosso grau de relacionamento. No segundo, baseado em cartilhas do Ministério da Saúde, realizamos uma pequena apresentação informal de como abordar as famílias, como agir em situações delicadas e também pactuamos com a enfermeira responsável pelo trabalho das agentes a realização de um diário de campo onde elas relatam o que as famílias contaram e a sua percepção individual. Esse diário deve ser lido e assinado pela enfermeira responsável para garantir que o trabalho da agente foi realizado e comunicado à equipe. O segundo trabalho foi desenvolvido com o conselho municipal de saúde. Desde o primeiro semestre sempre acompanhamos as reuniões realizadas pelo conselho, e em sala de aula fomos aos poucos aprendendo a sua função e tudo que um conselho bem organizado e participativo pode levar em benefícios para a comunidade. A partir da união conteúdo visto em aula com as reuniões, percebemos que algo estava errado, pois boa parte dos membros do conselho não sabia a sua função e estava presente apenas para representar a sua entidade e não apresentava preocupação alguma com o desenvolvimento da comunidade. Com isso, desenvolvemos dois métodos para abordar o conselho e esclarecer a importância do órgão. Primeiramente procuramos os mais diversos programas de saúde estabelecidos pelo Brasil e pelo Rio Grande do Sul, como política de saúde dos idosos, da criança, da mulher e sintetizamos tudo que poderia ser adequado à realidade de uma população interiorana. Após essa busca, coletamos dados locais com as agentes comunitárias e com a equipe da UBS sobre o número de idosos, crianças e de mulheres, assim como a porcentagem de procura pelo serviço em saúde desses grupos para compará-los com as metas estabelecidas pelo estado. Então, juntamos os dados locais sobre a população com os dados obtidos em buscas no IBGE e DATASUS sobre a população gaúcha em geral e realizamos uma apresentação para o conselho com o objetivo de impactá-los sobre a realidade local e dar ideias sobre a ampla gama de programas que o estado oferece para o desenvolvimento da saúde. Em um segundo momento nos concentramos em estudar a função dos membros do conselho de saúde e esclarecê-la de maneira simples e objetiva. Montamos uma apresentação explicando o porquê de cada entidade estar ali representada, esclarecendo a importância deles na pactuação da saúde local com o estado, também explicamos a importância da vistoria do conselho perante os gastos da UBS, falamos sobre as capacitações disponíveis para conselheiros e abrimos espaço para dúvidas e relatos individuais. Ao final de um ano de trabalhos na UBS foi extremamente gratificante perceber os pequenos, mas significativos resultados obtidos. As agentes de saúde estavam mais confiantes e sentindo-se parte da equipe, pois estavam sendo ouvidas e com o diário de campo estavam sendo amparadas pela enfermeira chefe, a qual nos relatou grande melhora do serviço e uma melhora significativa nos relatos descritos no diário. Após o trabalho motivacional, as próprias agentes nos procuraram interessadas em participar de cursos de atualizações para melhorar o desempenho do trabalho. Com o conselho municipal de saúde não foi diferente, foi notável a maior participação nas reuniões, o impacto provocado pela comparação da realidade local e as metas estabelecidas pelo estado gerou uma preocupação geral nos membros, a apresentação sobre os programas desenvolvidos pelo estado gerou diversas ideias para implantação local e também notou-se a vontade pela busca em capacitação. Conviver durante o primeiro ano da faculdade de medicina com uma equipe multidisciplinar em uma UBS do interior do estado nos abriu a mente e desmitificou o padrão médico estabelecido pela sociedade brasileira. Sem dúvidas, uma formação médica baseada no tripé de sustentação do SUS (equidade, integralidade e universalidade), é uma das saídas para a melhora da saúde da população. A quebra do médico sentado e trancado dentro de um consultório longe de toda a equipe é necessária, pois a medicina vai muito além de prescrever receituário, ela pode com atitudes simples de promoção em saúde mudar completamente toda a realidade e o futuro de uma comunidade. Portanto, com essa experiência os melhores e maiores resultados não foram produzidos na comunidade local e sim em nós estudantes que podemos entender na prática que o ser humano é muito mais que um processo saúde-doença.

Palavras-chave


medicina;comunidade;SUS