Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Assistência à mulher no seguimento do câncer de colo de útero em uma região de saúde
Ana Cristina bortolasse de farias

Última alteração: 2015-10-30

Resumo


APRESENTAÇÃO: Nas últimas décadas, o câncer tornou-se um problema de saúde pública mundial. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que para ano 2030, no mundo, haja 27 milhões de casos incidentes de câncer, 17 milhões de mortes e 75 milhões de pessoas com a doença. Uma eficiente medida para redução da mortalidade é o rastreamento abrangente e constante que pode reduzir óbitos por câncer de colo de útero em mais de 70% em relação às populações não assistidas. A finalidade do rastreamento é detectar alterações celulares em estágios iniciais para que procedimentos de intervenção sejam oportunos, ou seja, assegurar o seguimento destas mulheres. Dados estaduais apontam que mais de 60% das mulheres com alteração celular do colo do útero em Mato Grosso do Sul não estão sendo seguidas pela rede de atenção à saúde, fato que compromete as intervenções precoces. Diante ao exposto, este estudo objetivou analisar o fluxo assistencial estabelecido para as mulheres com resultado do exame citopatológico alterado a partir de entrevistas realizadas para profissionais da rede básica e especializada, com base no protocolo de Diretrizes e fluxos assistenciais estabelecidos pelo Ministério da Saúde. DESENVOLVIMENTO: Estudo transversal na microrregião de Nova Andradina tendo como cenário os municípios que a compõem: Angélica, Anaurilândia, Batayporã, Ivinhema, Nova Andradina, Novo Horizonte do Sul, Taquarussú e Dourados, sendo este último, sede da macrorregião de saúde e referência para a assistência de alta e média complexidade. Foram elaborados quatro diferentes formulários para entrevista, 01 para profissionais da atenção primária (33 entrevistas), 01 para coordenadores municipais de saúde da mulher (07 entrevistas), 01 para os profissionais do sistema de regulação municipal e de referência para região (08 entrevistas), e 01 para profissionais da atenção especializada (04 entrevistas). Cinquenta e dois profissionais foram entrevistados, abrangendo todos os pontos assistenciais relacionados à assistência à mulher. Os quatro instrumentos tinham dois blocos, o primeiro, comum a todos (Sexo, faixa etária, profissão, tempo de trabalho e treinamento/capacitação para atuar na área). No segundo bloco do instrumento destinado aos profissionais da atenção básica foi inquirido sobre os fluxos assistenciais (forma de registro do resultado, conduta da equipe, acompanhamento à mulher, instrumentos utilizados e barreiras enfrentadas para o seguimento nos níveis de maior complexidade). Aos coordenadores municipais da saúde da mulher foi questionado como é realizado o monitoramento do seguimento dos exames com resultados alterados e quais estratégias para assegurar o atendimento dos casos de câncer do colo do útero. O instrumento aos serviços de regulação investigou o processamento dos encaminhamentos, sistema de recebimento e autorização dos mesmos, forma de deslocamento do paciente e o mecanismo de comunicação com a mulher. O instrumento da atenção especializada para média e alta complexidade buscou listar os procedimentos executados, formas instituídas para o monitoramento do tratamento e identificação das dificuldades do setor. As entrevistas foram realizadas entre os meses de dezembro de 2013 e março de 2014. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, CAAE: 29402114.3.0000.0021. RESULTADO: Todos os procedimentos especializados preconizados pelas Diretrizes Brasileiras para o seguimento do câncer do útero estão disponíveis na rede, exames de colposcopia, biopsias; exerese da zona de transformação/cirurgia de alta frequência; conização do colo uterino, radioterapia, quimioterapia e cirurgia de colo uterino. As entrevistas com atenção primária apontam falhas quanto à conformidade entre resultados de exames e intervenções. Grande parte dos exames com resultados como, “células escamosas atípicas indeterminadas provavelmente não neoplásicas” e “lesão intraepitelial de baixo grau”, 16 (48%) e 26 (78,8%) respectivamente, são encaminhados para outros níveis de atenção quando a recomendação é tratar no nível local. Por outro lado, lesões que devem ser encaminhadas, dos 33 profissionais da atenção primária entrevistados, 07 (21,21%) afirmam tratar no nível local. Não há acompanhamento efetivo no encaminhamento das mulheres com resultado de exame alterado, quando 18 (54,54%) unidades de atenção primária, os profissionais orientam as mulheres a procurar o serviço de regulação do próprio município e em 09 (27,27%) a procurar diretamente o serviço de referência. Para os casos em que é necessário encaminhar para a sede da macrorregião, todas as unidades de saúde, 33 (100%), solicitam que a mulher procure o serviço de regulação do município de origem para agendamento. Em 27 (81,8%) das unidades de saúde não há informações de contra referência da assistência e/ou tratamento realizado nas mulheres encaminhadas aos serviços especializados. Na atenção primária, 25 (75,8%) citam dificuldades para seguimento ao tratamento das mulheres com exame alterado. Dentre eles, 14 (42,4%) apontam dificuldade para agendar exames complementares, 11 (33,3%) afirmam falta de vagas para realizar o agendamento para a primeira consulta nos outros níveis de complexidade e 09 (27.3%) dificuldades para consultas subsequentes. Dos sete coordenadores municipais da saúde da mulher 01 informou receber e registrar o resultado do exame. Em seis municípios a coordenação não registra. Referem que o monitoramento da assistência é feito pelo Sistema e Informação do Câncer (SISCAN) ou por meio de reuniões de equipe. Conforme os coordenadores do sistema de regulação dos municípios, a paciente é informada sobre a sua agenda de atendimento na atenção especializada por meio de contato telefônico em 06 (75%) municípios, que também notificam a equipe de ESF, ou seja, há duas ações para comunicar a mulher sobre seu agendamento. Dourados, município de referência para os demais, comunica o serviço de regulação do município de origem, sem contato com a paciente. Todos os municípios que encaminham se responsabilizam pelo transporte das mulheres. Dos 04 profissionais da atenção especializada, 02 afirmam que há demanda reprimida para a assistência à mulher. Motivos relacionados à gestão e estrutura do serviço como a falta de material, equipamentos e de profissionais, além de estrutura inferior à demanda. Uma das preocupações expressas pelos entrevistados foi o atendimento da mulher com diagnóstico tardio, em estágios avançados, o que dificulta o tratamento e o prognóstico de cura. CONSIDERAÇÕES FINAIS: O estudo identificou que embora os fluxos assistenciais estejam previstos nas Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero, os mesmos estão sem coordenação. A falta dessa gestão é um importante componente explicativo para os resultados ruins encontrados na região e que motivaram esta pesquisa: 70% das mulheres com alterações celulares de colo de útero não são seguidas e o estado tem um dos maiores índices de mortalidade por câncer do colo do útero. Evidenciou a necessidade de aprimorar o atendimento às mulheres sob dois aspectos. Um deles trata da qualificação dos trabalhadores, onde, cada nível de atenção à saúde da mulher execute assistência que lhe é definida pelos protocolos clínicos, ampliando a capacidade resolutiva. O segundo aspecto aponta para a necessidade de melhorar os sistemas de acompanhamento entre os pontos de atenção, mantendo a mulher permanentemente no foco e a colocando nos pontos de atenção previstos para a respectiva linha do cuidado. Afinal compete ao sistema de saúde e não ao cliente a garantia do acesso à assistência. Consideramos este estudo de suma importância dado o seu relevante diagnóstico de falhas em uma política pública instituída e deve ser analisado pelos tomadores de decisão para a adoção de novas práticas visando a efetivação da rede de assistência.

Palavras-chave


Teste Papanicolaou; Rede de Atenção à Saúde; Equidade de Acesso, Estratégia de Saúde da Família

Referências


1- Instituto Nacional de Câncer.  Estimativa 2014. Incidência de câncer no Brasil. [Acesso em 26 de fev 2014]. Disponível em: http://www.inca.gov.br/estimativa/2014/sintese-de-resultados-comentarios.asp.

02- Calazan C, Raggio LR, Ferreira I. O diagnóstico do câncer de colo uterino invasor em um centro de referência brasileiro: tendência temporal e potenciais fatores relacionados. 2008. [Acesso em 01 ago 2012]. Disponível em: http://www.inca.gov.br/rbc/n_54/v04/pdf/325_332_O_Diagnostico_do_Cancer_do_Colo_Uterino.pdf.

03- Instituto Nacional de Câncer. Linha de cuidado e integralidade da atenção. Brasília, 2014. P.92-93.

04- Malta CD, Merhy EE. O percurso da linha do cuidado sob a perspectiva das doenças crônicas não transmissíveis. Interface – Comunic., Saúde, Educ. v.14, n.34, p.593, jul/set. 2010.