Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

Tamanho da fonte: 
A CARTOGRAFIA DA PRODUÇÃO DO CUIDADO NA REDE DE ATENÇÃO AO TRANSTORNO MENTAL INFANTO-JUVENIL NO MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO
Isabela Andrade Vidal, Tulio Batista Franco

Última alteração: 2016-01-26

Resumo


APRESENTAÇÃO: Este estudo pretende demonstrar o nível de complexidade das ações da rede de saúde mental através dos fluxos que atravessam uma única unidade de saúde, que atende aos usuários infantojuvenis, com diagnóstico de transtornos mentais graves, o Centro de Atenção Psicossocial da Infância e Adolescência, CAPSI, no Município de São Gonçalo, RJ. Visando utilizar como eixo central a micropolítica na produção de cuidados nas práticas de saúde, buscando como referência a integralidade da atenção à saúde do usuário. O objetivo deste trabalho de pesquisa foi mapear as diferentes modalidades de atenção em saúde mental desenvolvidas no CAPSI, visando, assim, analisar o comprometimento e a articulação das ações desenvolvidas na produção de cuidados às pessoas em sofrimento psíquico, em consonância com as políticas públicas de saúde, tendo como base a Reforma Psiquiátrica. Pretende-se discutir a produção de subjetividades entre “aquele que cuida e aquele que é cuidado”, para revelar a potência que emerge no campo relacional entre os usuários e profissionais de saúde. A partir dessas considerações buscou-se enfatizar a importância da construção da produção de cuidados a ser ativada pelo “Trabalho Vivo em Ato” (MERHY, 2002; FRANCO, 2006), com toda sua intensidade, no plano micropolítico dessa organização de assistência, e na construção de um novo devir para esses serviços.   DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: O estudo em foco utilizou a cartografia como modo de produzir o conhecimento, tomando a realidade em torno de um caso para estudá-lo considerando todo o contexto da sua existência. A cartografia supõe uma imersão na micropolítica do cotidiano, impõe tomar a realidade na sua dinâmica relacional, buscando captar os fluxos de afetos entre os sujeitos, onde as subjetividades se expressam na produção de cuidados.  Em definição “cartografar é mergulhar na geografia dos afetos. ”¹ O cartógrafo utiliza o ato de pesquisar, essencialmente, para deflagrar os movimentos de produção do desejo presentes no campo social. Diante disso, pretendeu-se mapear a travessia de usuários e familiares na rede de saúde mental, através da linha de produção de cuidados, em seus diversos níveis de complexidade. Cabe marcar que esta investigação se situa no espaço existente entre profissional e usuário, construído e expresso através do vetor das práticas em saúde coproduzidas por todos os envolvidos na micropolítica, no processo de trabalho e no engendramento das subjetividades presentes. Propõe-se também dar expressão às subjetividades circulantes, de alguns modos de agir em saúde mental, procurando mapear e discutir enfoques e abordagens possíveis do sofrimento psíquico nesse cenário, apontando para a necessidade de se considerar os atores principais, o usuário e o profissional de saúde, e mais precisamente o encontro entre ambos. Utilizou-se um caso clínico que apresenta transtorno mental grave, como analisador do cuidado em saúde, tomando este conceito da análise institucional que sugere que “o analisador é aquilo que faz uma organização falar, isto é, revela o funcionamento das instituições”(LOURAU,1996) O caso emblemático repercutiu em grande intensidade no município em questão, devido a tenra rede que opera na micropolítica dos  processos de trabalho, sendo neste caso, realizado conexões entre a Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria Municipal de Assistência Social, Vara da Infância ,da Juventude e do Idoso e rede social.  Assim, o caso estudado deflagrou a implicação afetiva que norteou a produção de cuidados diante da saúde mental infantojuvenil, visando consequentemente, verificar os aspectos organizacionais e relacionais diante de suas demandas e necessidades.   RESULTADOS: Pode-se constatar uma clara desarticulação na linha de produção de cuidados, em seus diversos níveis de complexidade, revelando assim, a ausência de um planejamento integrado do trabalho em saúde mental. Isto corrobora, inevitavelmente, para um engessamento das políticas públicas em relação ao sofrimento psíquico. Cabe ao CAPSI acolher o usuário e manter a ‘porta de entrada’ aberta à rede de atenção, porém, não é plausível pensar, que esse dispositivo sozinho assumiria a responsabilidade pelo cuidado à saúde mental.   No entanto, uma ampla interlocução entre os dispositivos de atenção diária e a atenção básica amplificaria a potencialidade da rede, favorecendo assim um modo de cuidar integralizado. Diante disso pode-se constatar algumas dificuldades que emergiram como nós críticos a serem repensados em relação às ações em saúde mental, no contexto da produção de cuidado em saúde. A seguir são levantados alguns pontos que conduzem as questões que surgiram nesse percurso. A primeira delas refere-se à escassez de recursos humanos qualificados para o trabalho em saúde mental. Garantindo assim, a produção de cuidados adequada à população. É importante ressaltar a precariedade de CAPS e CAPSI que integram a rede de um município de grande número populacional. Não há um planejamento de uma política pública de saúde para atender à demanda. Outro aspecto, que emerge no contexto das ações de cuidado em saúde mental, remete às dificuldades na acessibilidade dos usuários às ações e serviços produzidos pelos profissionais. Este problema da organização da “porta de entrada” da unidade mostra uma de suas fragilidades para acolher pessoas em sofrimento psíquico e denuncia um despreparo da atenção primária em, realmente, estar constituindo-se como a entrada do sistema público de saúde. Entretanto é plácido afirmar a dimensão paradoxal presente nesta rede que ora tem dificuldades de acolher os usuários infantojuvenis, ora, ao acolher, o dispositivo CAPSI demonstra uma superlotação, apresentando dificuldade de redirecionamento na rede, isto é, não apresenta “porta de saída”, de modo que a rede não se constrói, pois perde as suas características de descentralização e conectividade. Viso ressaltar a importância do conceito de desinstitucionalização, diante da Reforma Psiquiátrica, que enfatiza a construção de dispositivos que favoreçam a potência das subjetividades circulantes provocando transformações profundas na cultura profissional daqueles que produzem o cuidado. Concomitantemente, vale destacar a necessidade de maior interlocução entre as estratégias de cuidado em saúde mental com as redes intersetoriais e sociais, que possibilitem o diálogo nos diferentes espaços onde o usuário constrói sua vida, de modo a garantir as práticas de cuidado de acordo com as necessidades específicas de saúde de cada usuário. Cabe enfatizar que nenhum serviço, nenhuma estratégia tecnopolítica é capaz, isoladamente, de produzir a inversão do modelo assistencial. Para tanto é necessário que essa produção ocorra enquanto processo social complexo, advinda dos desejos dos atores envolvidos. CONSIDERAÇÕES FINAIS: A questão que se propôs a discutir é o da compreensão da produção do cuidado, que opera através dos encontros de um sujeito com o mundo social no qual está inserido, se os afetos que circulam nesses encontros têm potencializado a rede de cuidados e, consequentemente, o processo de desinstitucionalização. Desinstitucionalizar é um processo social amplo que não se restringe à desconstrução do hospital, enquanto instância de tratamento e à construção de novas instituições que pretensamente funcionariam sob a lógica do novo paradigma da Atenção Psicossocial. É ressignificar as atitudes, as abordagens, é apostar nos processos de subjetivação que vão afetar as mudanças das práticas de saúde.

Palavras-chave


Produção de Cuidados; Saúde Mental; Rede

Referências


FRANCO.T.B;.As Redes na Micropolítica do Processo de Trabalho em Saúde :In: Pinheiro.R:Mattos;R.A.(org).Gestão em Redes: práticas de avaliação , formação e participação na saúde.2006.

LOURAU, R. Análise Institucional e Práticas de Pesquisa. Hucitec. São Paulo, 1993.

MERHY, E.E. Saúde: cartografias do trabalho vivo. Hucitec: S. Paulo, 2002.