Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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Do Quadrilátero ao Prisma: integração ensino-serviço e a configuração de espaços gestores na educação/formação em saúde
Carine Vendruscolo, Marta Lenise do Prado, Maria Elisabeth Kleba

Última alteração: 2015-10-19

Resumo


Apresentação: A participação desperta no homem a possibilidade de construir a história por meio da responsabilidade social, como sujeito comprometido e protagonista dos movimentos que vivencia (FREIRE, 2005). A gestão no âmbito dos processos de educação em saúde precisa estabelecer compromissos com componentes de uma rede operacional. Essa perspectiva organizacional é observada nas estratégias de articulação interministerial, com vistas à reorientação do ensino na saúde, como é o caso do Programa de Reorientação da Formação em Saúde (Pró-Saúde). Nessa perspectiva, são recomendadas estratégias autoavaliativas, para promover o acompanhamento em relação ao cumprimento das metas e objetivos dos projetos (BRASIL, 2007). É proposto o diálogo entre os diversos sujeitos: na universidade, na Secretaria de Saúde e na comunidade. A cogestão desses processos pressupõe comando horizontal, em que todos os sujeitos influenciam a construção do conhecimento. Ceccim e Feuerwerker (2004) defendem o “quadrilátero da formação para a área da saúde” – ensino, gestão, atenção e controle social –, para a gestão da educação no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS). O ideário dessa figura pressupõe que cada face estabeleça fluxos e interlocutores específicos, com motivações diferentes. O objetivo do presente trabalho foi analisar como ocorre a representação dos quatro segmentos que compõem o quadrilátero nos espaços colegiados de integração ensino-serviço do Pró-Saúde da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó). Desenvolvimento: Trata-se de um estudo de caso, realizado com representantes dos quatro segmentos que fazem parte do Comitê Gestor Local (CGL) e da Comissão Coordenadora Geral (CCG) do Pró-Saúde – proposta integrada da Unochapecó, Secretaria da Saúde de Chapecó e Gerência Regional de Saúde. Para a produção e registro das informações foram realizadas entrevistas com 11 sujeitos, cinco membros do CGL, três da CCG e três que faziam parte de ambas as estruturas, os quais representam os diferentes segmentos do quadrilátero. Realizaram-se seis momentos de observação de reuniões, registradas em Diário de Campo, instrumento com notas de observação descritivas (aspectos relevantes de organização, planejamento e dinâmica das reuniões); e reflexivas (processos de diálogo, participação, conflitos) e outras observações do entrevistador. Os dados foram analisados a partir da proposta operativa para “análise de dados qualitativos” de Minayo (2010). Foi obtido parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sob o número 242.966/2012, atendendo aos critérios da Resolução do Conselho Nacional de Saúde no 466/12. Os participantes foram identificados por codinomes e letra correspondente ao segmento representado (gestão - G, atenção - A, controle social - CS e ensino - E). No que se refere à implicação da Instituição de Ensino Superior (IES), como parte integrante do quadrilátero, em estruturas como as instâncias colegiadas de gestão do Pró-Saúde, observam-se atitudes contrastantes entre os sujeitos que a representam. Existem situações conflituosas que envolvem, sobretudo, os segmentos ensino e serviço, por conta da defesa de interesses de um e de outro. Nessa relação de alteridade entre diferentes saberes (teoria e prática) nem sempre flui, naturalmente, o livre movimento dos sujeitos, na direção da práxis (FREIRE, 2011). Os interesses individuais, por vezes, se sobrepõem à prerrogativa constitucional que atribui ao SUS a ordenação da formação de recursos humanos na área da saúde. De outro lado, a participação dos usuários em instâncias de decisão na área da saúde é um direito garantido por lei no Brasil, mediante ação denominada de controle social, exercida em especial nos conselhos gestores. O usuário é o cidadão que faz uso do serviço, mas que, em tese, não deveria pertencer a um dos outros lados do quadrilátero (gestão, atenção ou ensino). Pode-se refletir que qualquer representante de qualquer um dos vértices do quadrilátero poderia ser duplo representante, o que, contudo, para garantir e respeitar o princípio doutrinário da lei, não deveria ocorrer. O que se percebe, portanto, nas instâncias de gestão do Pró-Saúde, é que a participação do controle social é pouco frequente e que, quando ocorre, nem sempre o representante é o usuário (no sentido esperado) do serviço, mas outro membro do Conselho Municipal da Saúde (CMS). Vale lembrar que o CMS, por conta da paridade, é composto por usuários, prestadores de serviço, trabalhadores ou gestores. Nessa perspectiva, a participação do controle social no quadrilátero apresenta uma distorção – poder-se-ia chamar de “desvio de prisma” – o que acaba por comprometer a paridade que se deseja nesse processo. Os gestores (Secretários Municipais de Saúde) são representados, via de regra, por coordenadores de serviços no âmbito da Secretaria de Saúde. Representar pressupõe que indivíduos, nomeados para agir no interesse de grupos, tenham tempo para se apropriar do processo, além de habilidades de comunicação para se relacionar com os demais e para negociar (ABERS; KECK, 2008). A representação dos segmentos nas instâncias de gestão colegiada do Pró-Saúde ocorre de maneira heterogênea. A gestão da saúde e controle social são os segmentos que menos se envolvem, já os segmentos ensino e serviço, entre acordos e divergências, têm construído um caminhar coletivo, representados, da seguinte maneira: no ensino estão representados gestores da IES, docentes e estudantes; no serviço, se fazem presentes gestores, profissionais/trabalhadores. O segmento gestão – no caso, ligada ao serviço de saúde – embora menos presente, quando representado, se faz por meio de coordenadores de departamentos (atenção básica, vigilância epidemiológica, entre outros), por indicação do Secretário Municipal de Saúde, e nunca na sua presença, em pessoa. Já o controle social tem no usuário/cidadão, um sujeito poucas vezes representado, de fato. Considerações Finais: Considera-se que a interação efetiva entre os segmentos que fazem parte do quadrilátero produz nos sujeitos um compromisso com a efetiva gestão do Pro-Saúde, por meio de relações de vínculo e responsabilização entre estudantes, usuários, professores, profissionais, gestores e outros parceiros na produção dos processos de educação e de cuidado em saúde. Assim, o complexo sólido que representa essa alteridade entre os segmentos, estaria mais relacionado com um “prisma” do que com uma figura de apenas quatro lados. O prisma pode ser utilizado para refletir raios luminosos e, utilizando-se dessa metáfora, podemos supor ainda, que há muitas arestas a serem ajustadas em relação a esses espaços de aprendizado da democracia. Contudo, se já existem reflexos provocados pela ação do quadrilátero, certamente as rodas de cogestão em processos educativos na área da saúde têm gerado oportunidades significativas para a conformação de, por que não dizer, “prismas da formação e da educação na saúde”, que traduzem a complexidade, a riqueza e a potência de tais processos.

Palavras-chave


Integração Ensino-Servico; Ensino

Referências


ABERS, R. N.; KECK, M. E. Representando a Diversidade: estado, sociedade e “relac?o?es fecundas” nos conselhos gestores. Caderno CRH, v. 21, n. 52, p. 99-112, 2008.

 

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CECCIM, R. B.; FEUERWERKER, L. M. C. O Quadrila?tero da Formac?a?o para a A?rea da Sau?de: Ensino, Gesta?o, Atenc?a?o e Controle Social. Physis: revista de sau?de coletiva, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 41-65, 2004.

 

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MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em sau?de. 13. ed. Sa?o Paulo: Hucitec, 2013.