Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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DISCURSOS SOBRE A SAÚDE EM DOURADOS (MS): GESTÃO E TECNOLOGIAS
Conrado Neves Sathler, Catia Paranhos Martins, Elenita Sureke Abilio

Última alteração: 2015-10-30

Resumo


Apresentação: Este breve relato se refere a uma parcela de observações discursivas realizadas no percurso da pesquisa docente intitulada “Hospital Universitário: análise institucional de micropolíticas, produção de sentidos, saberes e práticas”, pesquisa em andamento na Universidade Federal da Grande Dourados. O objetivo desta pesquisa é o de analisar como são construídas as práticas hospitalares, quais discursos as sustentam e como estes discursos produzem relações de/ e sobre saúde. Este recorte apresenta um panorama do município de Dourados (MS) e observa nele quais os valores e princípios circulantes sobre saúde na mídia impressa e na internet. Desenvolvimento do trabalho: Compreendemos que as instituições de saúde, todas elas, sejam de intervenções diretas ou atitudinais, de assistência ou gestão, estão inseridas nesta rede discursiva e que ela mesma está dispersa nos demais discursos sobre a saúde em circulação pela aldeia global que caracteriza o nosso mundo. Vamos nos ater a alguns enunciados retirados das páginas online das instituições, de uma revista temática que se vê nos consultórios particulares e de um jornal aberto: esta é a composição de nosso corpus. Escolhemos, para análise, os temas de maior regularidade ou as marcas observadas na materialidade linguística de cada instituição. Como método de análise, fizemos as questões: quem fala? De onde fala? Para quem fala? O que o texto omite? Onde mais é dito o que emerge no texto? Que possíveis efeitos de sentido são gerados pelo texto? Consideramos significativos para nossa análise os enunciados que observamos com maior regularidade discursiva, assim, o sentido do discurso assumiu maior importância para analisarmos os discursos relacionados à saúde e ao SUS. As instituições de saúde são denominadas A1, A2 e A3, por considerarmos que o discurso não está colado a uma instituição com exclusividade, ao contrário, os discursos circulam e sustentam instituições dentro de seus interesses de formação e manutenção de clientelas. Os enunciados institucionais estão destacados em itálico. Resultados da pesquisa: A voz dos gestores municipais é muito frequente nos meios de comunicação. E a preocupação geral ainda parece estar relacionada, de forma excessiva, com as estruturas físicas dos equipamentos de saúde. [...] por exemplo, passou por obras de revitalização, reparos e ampliação. A ativação da UPA modificou os serviços de urgência e emergência do município e levou mais qualidade ao atendimento desafogando as estruturas (A1). Este recorte fala de ...revitalização, reparos e ampliação... do prédio onde funciona o serviço de saúde, aqui em especial sobre a unidade de pronto atendimento (UPA), que ainda é uma prioridade para os gestores. Um argumento comumente apresentado afirma que a visibilidade dos prédios se associa a seu idealizador e isso garantiria votos ao político que o constrói. Os discursos circulantes, exemplificados na fala de um gestor, estão focados nos modelos hospitalocêntricos e centrados no conhecimento biomédico, que privilegia as condutas clínicas laboratoriais e medicamentosas, com ênfase nas tecnologias duras em detrimento às tecnologias leves. As tecnologias em saúde   (...) podem ser classificadas como leve, leve-dura e dura. Todas tratam a tecnologia de forma abrangente, mediante análise de todo o processo produtivo, até o produto final. As tecnologias leves são as das relações; as leve-duras são as dos saberes estruturados, tais como as teorias, e as duras são as dos recursos materiais (MERHY, 2005).   Isso ilustra o funcionamento discursivo que implica não somente na visão capitalista de que o poder sobre a saúde tem relação direta com o poder sobre a construção de mais serviços e com a capacidade de pagamento dos procedimentos realizados. O problema que se desenvolve no entorno deste discurso é que há nele uma tensão territorial que se instala nas relações. O valor do trabalho clínico está centrado no diagnóstico e na terapêutica e pouco voltado à prevenção e à promoção da vida. A ênfase nas tecnologias duras acaba sendo maior do que o valor dado às tecnologias leves. Como consequência, o valor dado à Atenção Básica, inclusive na remuneração dos serviços é menor do que aos procedimentos especializados. Por fim, a gestão se volta à doença e pouco se faz pela saúde. Neste contexto, os demais pontos que constituem o campo da saúde são comprometidos: a assistência passa a ser medicamentosa e o controle social se volta ao controle contábil das ações de saúde, diminuindo a importância do acompanhamento das políticas públicas como concepções de relações sociais, econômicas e ambientais ligados à saúde. Além de cuidar dos prédios, o prefeito também pensa na qualidade do atendimento à população. Problemas que existiam quando iniciou sua administração como a constante falta de médicos e remédios, hoje já não existe mais ... (A2).   O excerto acima vem apontar para a ligação que a gestão faz entre a qualidade da assistência e as tecnologias duras. Assim, a ligação direta de qualidade do atendimento com a presença de médicos e remédios vai parecer óbvia. Efetivamente, podemos ponderar o que não há essa relação, pois, a presença de remédios, médicos e prédios não garante a saúde da população, por motivos de ordem do acesso e do conceito de saúde empregado, uma vez que a abordagem dos gestores se liga ao conceito de saúde como ausência de doença. Detalhe das instalações: foi planejado de modo a oferecer a máxima comodidade. O objetivo foi tornar o ambiente hospitalar tão agradável e acolhedor quanto possível (A3). E a confusão se manifestou igualmente neste recorte, pois o acolhimento requerido pelo SUS e firmado pela Política Nacional de Humanização afirma que acolher é, sobretudo, estar junto (BRASIL, 2010, p. 06), e se caracteriza pela tecnologia leve. Considerações finais: Percebemos que as mudanças de conceitos, métodos e práticas de Saúde são inócuas se não ocorrem alterações nos modelos de saúde. Como os discursos estão interligados e há forças econômicas mais hegemônicas no território, é preciso intervenções de outros níveis, como na formação e no controle social para provocar alterações no cenário. Apontamos essa forma de intervenção pela naturalização que observamos de valores interligados na assistência e na gestão e o apagamento discursivo das instâncias de Ensino e de Controle Social.

Palavras-chave


Análise Institucional do Discurso, Produção de Sentidos, Gestão em Saúde, Saúde.

Referências


BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Acolhimento nas práticas de produção de saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. – 2. ed. 5. reimp. – Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2010.

MERHY, E. E. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. 2ª ed. São Paulo: Hucitec; 2005.