Rede Unida, 12º Congresso Internacional da Rede Unida

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CONSELHOS DE SAÚDE E APONTAMENTOS PARA AÇÕES EFETIVAS
BRUNA CERUTI QUINTANILHA, Sara Gonçalves Luiz, Maristela Dalbello-Araujo

Última alteração: 2015-11-02

Resumo


A criação do Sistema Único de Saúde (SUS), assim como a instituição da Participação Social neste país, possui mais de duas décadas. O processo de construção da participação ainda se depara com muitos desafios, sobretudo no âmbito dos Conselhos de Saúde. São obstáculos que colocam em evidência a legitimidade do funcionamento desses espaços e sinalizam para a necessidade de discussão e análise do cotidiano das práticas dos atores. A política de saúde brasileira vem passando por um peculiar dilema: tem avanços admiráveis em algumas áreas e apresenta limitações importantes em outras. Uma das facetas desse dilema pode ser percebida nos mecanismos instituídos de participação social, que ora se mostram efetivos e ora se apresentam ineficazes. Pudemos perceber, a partir de revisão da literatura, que a maior parte das pesquisas dão enfoque às dificuldades e problemas na gestão e funcionamento dos conselhos de saúde. Neste sentido, destacam-se os boicotes das formas autoritárias e tradicionais de gestão; os desafios do modelo de gerencial da saúde; as dificuldades do desenho institucional e organizacional desses colegiados; a falta de legitimidade da representação; a insipiência da transparência e publicização das ações empreendidas nesses locais; a desinformação dos atores sociais envolvidos no processo e, por fim, a assimetria das relações de força e poder. Percebemos esses revezes como obstáculos que sinalizam para questões macro e micropolíticas, sociais, econômicas e culturais, que atravessam a participação continuamente no âmbito da política de saúde brasileira. Entraves típicos do processo sócio-histórico-econômico brasileiro. Contudo, notamos também, que existem ações de cunho propositivo advindas dos conselhos de saúde. Desse modo, apesar de todas as dificuldades elencadas em diversos estudos, notamos que, ainda assim, os conselheiros conseguem atuar dentro da proposta da participação social. Nesse aspecto, vale ressaltar que há pouco material científico sobre os avanços e conquistas obtidas pelos conselhos, por isso, julgamos essencial citar o Prêmio Sergio Arouca de Gestão Participativa em Saúde, instituído em 2005, pela Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa (SGEP) do Ministério da Saúde em parceria com o Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (CONSASEMS). Pois a revisão dos resultados desse prêmio pode contribuir nessa discussão. Visto que a iniciativa, conseguiu evidenciar, premiar e estimular diversas experiências exitosas de gestão participativa em todo Brasil. Dentre as iniciativas premiadas, que exemplificam trabalhos efetivados em conselhos de saúde, citamos o avanço no campo educação permanente, que representa uma possibilidade de ampliação da vocalização dos conselheiros em relação às necessidades e desejos da população em relação à política de saúde, avançando rumo a deliberações mais conscientes por parte desses atores. Nota-se, também, um significativo aumento da fiscalização sobre as decisões tomadas nas plenárias, na tentativa de avaliar se essas deliberações estão sendo ou não encaminhadas pelo Executivo e pelas Conferências de Saúde. Outro aspecto ressaltado é a crescente diversidade de movimentos sociais organizados ligados a usuários, profissionais de saúde e prestadores de serviços; que vem se fazendo representar nos conselhos e contribuindo para que as deliberações dessas instâncias reflitam cada vez mais as necessidades de saúde dos distintos atores e grupos sociais organizados. Destacamos, por fim, a multiplicação dos Conselhos Locais de Saúde (CLS) e sua importância. Visto que são instâncias responsáveis por exercer a participação com maior proximidade da comunidade. Vale ressaltar que o processo de mobilização popular também vem se desenvolvendo por meio de outros caminhos de comunicação entre o cidadão e o governo, tais como: educação popular, capacitação de lideranças, conselheiros, entidades de classe e movimentos populares articulados, entre outros. Todos esses convergem em espaços de diálogo, capazes de ampliar a participação e a interlocução entre trabalhadores, gestores e movimentos populares. Nesse sentido, muitos conselhos têm operado positivamente, como espaço de conflitos, de resistência e de tensões. Desta maneira, esses espaços coletivos podem transformar-se em instrumentos privilegiados na busca da efetivação dos direitos e no rompimento das tradicionais formas de gestão, possibilitando ampliação dos espaços de decisões, além de impulsionar a legitimidade de esferas públicas democráticas. Ademais, os conselhos podem tornar-se capacitadores dos sujeitos sociais, qualificando os processos participativos de interlocução ético-política com o Estado. A partir dessa ideia, reafirma-se a importância de desempenhar a função de conselheiro de saúde, compreendendo que as potências empreendidas por estes sujeitos podem direcionar de modo positivo os rumos do SUS. Ao nos depararmos com as dificuldades enfrentadas pelos conselhos, mas também como as possibilidades de ações destes, passamos a nos questionar: Como está a atuação propositiva dos conselheiros frente aos desafios da participação social nos conselhos de saúde? Que mecanismos, dispositivos ou potencialidades estão sendo produzidos nesses espaços? A partir disso, nos propusemos analisar a atuação propositiva dos conselheiros de saúde frente aos desafios da participação social no âmbito dos conselhos municipal e locais de saúde do município de Vitória – ES. A pesquisa se fundamenta na abordagem qualitativa. Para alcançar o objetivo proposto, observamos de modo sistemático a atuação dos conselheiros de saúde no cotidiano de suas práticas, para tanto, participamos como ‘ouvintes’ das plenárias dos conselhos selecionados para o estudo. Temos, então, como cenário deste estudo o Conselho Municipal de Saúde (CMS) e os Conselhos Locais de Saúde (CLS) do município de Vitória/ES. Este município é dividido em seis Regiões de saúde, assim, elegemos, via sorteio, um CLS de cada região para realizar a observação. Realizamos também análise das atas dos conselhos, com intuito de saber como cada ponto da ata tem sido encaminhado. As observações foram registradas em diário de campo. Destacamos, aqui, a atuação dos conselheiros nos CLS do município estudado. Notamos que nestes espaços há maior protagonismo por parte dos representantes dos usuários, garantindo, assim, maior legitimidade deste segmento. Estes atores têm levado para as reuniões dos CLS as demandas da comunidade, fiscalizado e opinando em relação às melhorias necessárias na organização dos serviços.  Alguns se autorreferem como ‘multiplicadores’, ‘informantes-chave’ das ações, decisões e desafios vivenciados pela Unidade de Saúde para a comunidade e vice-versa. Podemos afirmar que no município de Vitória-ES, os Conselhos Locais têm representado grande potência no que concerne à efetivação da participação social. Isto porque, os cidadãos tomaram estes locais como espaços para a construção do SUS. Contudo, ainda é necessário avançar na organização e operacionalização destes, visto que a assiduidade dos conselheiros eleitos nessas instâncias ainda é incipiente. Isto ocorre em virtude do horário das reuniões desses colegiados, que muitas vezes coincidirem com o horário de trabalho dos conselheiros. Outro ponto que merece destaque é a falta de ações de educação permanente, que foram apontadas pelos conselheiros como um aspecto importante para a ocorrência de maior interlocução entre as ações dos CLS e do CMS, bem como, para que as deliberações das plenárias sejam homologadas pelos gestores.

Referências


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