Qualificação do Agente Comunitário de Saúde: a experiência da Escola de Saúde Pública do Estado de Minas Gerais
Resumo
Apresentação: Trata-se de um relato de experiência sobre o Curso de Qualificação do Agente Comunitário de Saúde, desenvolvido e realizado pela Escola de Saúde Pública do Estado de Minas Gerais (ESP-MG), nos anos 2012 e 2013, para profissionais de 90 municípios mineiros. Desenvolvimento: O Agente Comunitário de Saúde (ACS), profissional integrante da Estratégia Saúde da Família (ESF) ocupa um espaço importante no contexto atual da saúde pública. A ESF corresponde a um modelo de atenção que prioriza e privilegia uma abordagem voltada às ações de prevenção e promoção da saúde, considerando a importância e a influência dos determinantes sociais no processo saúde-doença, enfraquecendo, assim, o foco na enfermidade e na concepção de saúde que se reduz a um simples estado de ausência de doenças. O ACS encontra-se inserido nesse modelo ampliado de saúde. Integrante de uma equipe multiprofissional, o ACS detém a função indispensável de elo, representação e troca entre a equipe de saúde e a comunidade, a partir de um olhar e de uma abordagem mais cuidadosa, solidária e compartilhada com a população. Mesmo desempenhando um vasto rol de funções, como cadastramento e acompanhamento das famílias, visita domiciliar, ações individuais e coletivas de prevenção e promoção da saúde, entre outras, o ACS, diferentemente dos demais profissionais de saúde, não possui uma formação prévia para ingresso na profissão. De modo geral, a formação acontece durante o trabalho e de maneira informal. A partir da Lei nº 11.350/2006, o Ministério da Saúde (MS) ressaltou e determinou a necessidade de formação do ACS, exigindo a realização de um curso de qualificação básica no momento de inserção desses profissionais no sistema público de saúde. Por meio do Programa de Formação de Profissionais de Nível Médio para a Saúde (PROFAPS, 2009) e da Política Nacional de Educação Permanente (PNEPS, 2010)7, o MS destinou recursos à ESP-MG para qualificar os ACS inseridos nas equipes de saúde da família dos municípios mineiros. Como o quantitativo de ACS no estado era muito superior ao número de vagas ofertadas, foram definidos critérios para seleção de municípios, sendo eles: 1) municípios com 60% ou mais de cobertura de Estratégia Saúde da Família; 2) municípios que fizeram processo seletivo ou concurso público para a contratação de ACS; 3) municípios com fator de alocação 3 e 4, estratificação elaborada para repasse de recursos financeiros à saúde, que classifica os municípios mineiros em quatro grupos, onde a maior nota atribuída, corresponde a municípios de menor porte econômico e de grande demanda na assistência à saúde; 4) municípios com interesse formalizado por ações educacionais de capacitação para ACS. Fundamentado nesses critérios, o Curso de Qualificação do Agente Comunitário de Saúde, desenvolvido e realizado pela ESP-MG, foi ofertado a 90 municípios em 2012 e 2013. Estrutura do Curso: O Curso de Qualificação do Agente Comunitário de Saúde correspondeu a uma ação educacional descentralizada, o que permitiu que alunos e docentes, durante todo o processo educativo, refletissem e discutissem sobre a importância do contexto municipal e regional, e sua influência no processo saúde-doença da população e, ainda, na análise das características do microterritório de trabalho do ACS. A proposta educacional foi de qualificar o ACS na busca e desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias ao desempenho de suas funções. Para tanto, a carga horária de 400 horas foi distribuída em quatro unidades: Unidade 1) O Agente Comunitário de Saúde e o SUS; Unidade 2). Compreendendo o processo saúde-doença; Unidade 3) A ação do Agente Comunitário de Saúde no diagnóstico e planejamento das ações em saúde; Unidade 4) A ação do Agente Comunitário de Saúde na educação em saúde, na promoção, na prevenção e no monitoramento de agravos. Fundamentando-se no modelo de currículo integrado, o curso foi desenvolvido em serviço e para o serviço, utilizando a estratégia de alternância de momentos de Concentração e Dispersão. A Concentração referiu-se ao momento do curso destinado à construção teórica, por meio da aquisição e desenvolvimento de conhecimentos, buscando instrumentalizar e explicitar a prática profissional do ACS. Sob a orientação direta do docente, os alunos desenvolviam atividades que abordavam questões referentes a sua prática profissional cotidiana. A Dispersão foi o momento destinado à aquisição e ao desenvolvimento de habilidades práticas, por meio de orientação e acompanhamento do desempenho do ACS. Esse momento acontecia após cada período de Concentração. A proposta metodológica adotada no curso alicerçou-se nas concepções epistemológicas que permeiam as ações educacionais da ESP-MG: Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS), a Androgogia, Pedagogia da Problematização, Aprendizagem Significativa, Currículo Integrado e Avaliação por Competência. Estas abordagens priorizam a interlocução entre os aportes teóricos e a prática desenvolvida nos serviços, num movimento de ação-reflexão-ação, que favorece o desenvolvimento dos profissionais e a melhoria dos serviços de saúde. Nessa perspectiva, os docentes do curso participaram de uma capacitação pedagógica, com desenvolvimento de atividades que permitiam o diálogo, a troca de experiências, a reflexão sobre o processo de trabalho do ACS, a compreensão do processo de ensino-aprendizagem e a reflexão da prática docente. O objetivo era de prepará-los para o exercício da docência, fornecendo aporte para que esses, durante todo o curso, pudessem atuar como mediadores entre os saberes prévios e os novos conhecimentos dos alunos, valorizando suas experiências profissionais, promovendo recuperação diante das dificuldades apresentadas, propiciando o desenvolvimento das habilidades e competências previstas no plano do curso. A avaliação do processo de aprendizagem foi orientada pelo modelo de avaliação por competência, que permite correlacionar teoria e prática e acompanhar diretamente o desenvolvimento do aluno durante todo o processo de ensino-aprendizagem. Neste sentido, o grande objetivo a ser alcançado era desafiar o aluno a aprender a aprender. Assim, ao avaliar o aluno/trabalhador em processo de formação, pretendeu-se verificar as competências e habilidades adquiridas durante o processo de aprendizagem, evidenciando a capacidade do sujeito em mobilizar e articular os conhecimentos com autonomia, estabelecendo relações significativas entre os conteúdos, com postura crítica e reflexiva. Resultados: O Curso de Qualificação do Agente Comunitário de Saúde envolveu 302 docentes, qualificando cerca de 2.000 ACS. O retorno dos docentes, ao longo da ação educacional, apontou para melhorias no processo de trabalho e qualificação do ACS e, ainda, dos próprios docentes, a partir da revisão e discussão dos conceitos e práticas basilares da ESF, fortalecendo o trabalho em equipe, bem como a qualidade do cuidado em saúde. Considerações Finais: Ao se afirmar que a ESF possui a função de eixo norteador da atenção primária à saúde, investir na formação e qualificação do ACS contribui, sobremaneira, nas ações prestadas por esse nível de atenção, com atendimento integral, centrado na família – percebida a partir de seu ambiente físico e social – voltado para as suas reais necessidades, garantindo acesso às ações de promoção, prevenção, cura e reabilitação. Assim, a qualificação do ACS ofereceu subsídios para desenvolvimento de um profissional reflexivo e crítico de suas ações, compreendendo a importância de uma postura ética em seu trabalho, com habilidades inerentes à sua prática e competência para o exercício de suas atividades.